Desenrola Brasil, primeiras impressões e impactos nos bancos
Foi divulgada no dia 6 de junho a MP 1.176 que institui o Programa Desenrola Brasil. De modo geral, o objetivo do Programa Desenrola Brasil é incentivar a renegociação de dívidas de pessoas físicas inadimplentes, que estão registradas em cadastros de inadimplentes nos birôs de crédito do país, visando reduzir o endividamento e facilitar o acesso dessas pessoas ao mercado de crédito. Neste relatório realizamos um breve teste de impactos para o setor bancário, no qual concluímos que o programa terá impactos positivos, porém limitados para o setor, considerando seu potencial e efeitos sobre receitas com recuperação de crédito.
Dividido em faixas, os bancos contarão com garantia do FGO na Faixa 1, mas na Faixa 2 não haverá garantia e sim o uso de benefício fiscal. O programa tem diferentes faixas, sendo a Faixa 1 voltada para dívidas de pessoas com renda mensal igual ou inferior a dois salários-mínimos ou que estejam inscritas no Cadastro Único. O valor total em dívida que poderá ser repactuado será de até R$ 5.000 somando todas as operações por devedor. Vale ressaltar que nesta faixa não serão enquadrados crédito rural e imobiliário. Já a Faixa 2 abrange a renegociação de dívidas de pessoas físicas em geral, mas não terá garantia do FGO, sendo que os bancos poderão utilizar do saldo bruto dos créditos concedidos nesta faixa como crédito presumido para abater impostos.
Como vai funcionar? Os participantes do programa são basicamente três: i) devedores (pessoas físicas inscritas em cadastros de inadimplentes); ii) credores (pessoas jurídicas responsáveis pela inscrição de devedores em cadastros de inadimplentes) e iii) agentes financeiros (instituições financeiras autorizadas a operar com crédito). Os devedores interessados em participar do programa devem aderir na plataforma que será digital e quitar suas dívidas à vista ou contratando um empréstimo com um agente financeiro habilitado no programa. Os credores interessados em participar devem solicitar habilitação na plataforma e oferecer descontos nos créditos elegíveis para o programa, além de excluir os créditos renegociados dos cadastros de inadimplentes. Os agentes financeiros habilitados financiarão as dívidas incluídas no Desenrola Brasil com seus próprios recursos. Eles podem cobrar tarifas pelos serviços prestados aos credores, desde que observem os limites definidos que são de taxa de 1,99% ao mês com parcelas de até 60 vezes. O ambiente das renegociações ainda será definido e o FGO será responsável pela operação e despesas de contratação da plataforma, que tem se encaminhado para ser a B3 e o Banco Central ficará responsável pela supervisão do programa.
Tamanho da garantia da Faixa I ainda deve ser definida. O governo estima que o impacto do programa será de cerca de R$ 50 bilhões em dívidas renegociadas e que atingirá cerca de 40 milhões de brasileiros na Faixa I e 30 milhões na Faixa II, sendo a maior parte da dívida constando na Faixa I. A garantia do programa, que poderá dar o suporte necessário para a concessão de crédito pelos bancos virá de uma parcela do FGO Pronampe. Contudo, ainda não se sabe o valor destinado ao programa e a última declaração sobre o assunto indica que devem ser destinados R$ 10 bilhões, mas que devem ser utilizados do próprio fundo.
Quais os impactos nos bancos? Considerando que o governo estima renegociar cerca de R$ 50 bi em dívidas na Faixa I e sendo que, segundo levantamento mensal de abril do Serasa, cerca de 31,61% da dívida dos inadimplentes são com bancos/cartão de crédito, o universo de cerca R$ 15 bi de dívidas bancárias é esperado para entrar nas renegociações na Faixa I, o que evidentemente deve incorrer em haircuts quando na renegociação, que esperamos que sejam entre 70% e 90% da dívida. Consequentemente, em termos de recuperação dos write-offs, os bancos veriam pouco impacto no resultado, uma vez que se considerarmos o que será recuperado da dívida bancária após haircut, que resultaria entre R$ 2 a R$ 5 bilhões, o impacto para o lucro líquido do sistema financeiro como um todo seria pequeno, de cerca de 0,6% - 1,7% do lucro total da indústria, tendo em vista os lucros contábeis da indústria reportados em 2022 que foram de R$ 257 bilhões.