Na semana passada, a Vale sediou seu XXII Analyst and Investor Tour, desta vez em suas operações de Metais Básicos, em Sudbury – Canadá, no qual tivemos a oportunidade de conversar com seu C-Level, discutir sobre os próximos passos da unidade e o futuro das operações. Ainda, visitamos as minas subterrâneas de cobre e níquel, além das fundições e refinarias da empresa.
Vimos o evento como excelente oportunidade da companhia em direcionar a atenção do mercado ao segmento de Metais Básicos, movimento que já vimos falando desde o início do ano, especialmente porque vemos esta operação com grande potencial de destrave de valor, além de proporcionar à companhia maior diversificação, seja ela por produtos (Níquel, Cobre e subprodutos), seja por geografia (América do Norte e Europa), diminuindo exposição a Minerais Ferrosos e Ásia. Ficou claro que a empresa caminha para um processo de reavaliação de seus ativos visando um provável spin-off no futuro, especialmente considerando os atuais múltiplos da operação vis-a-vis pares internacionais.
No entanto, apesar do enorme potencial existente no consumo de metais básicos, em especial com a ascensão dos veículos elétricos, processo de descarbonização da cadeia, agenda ESG e regionalização da cadeia de suprimentos, movimento este que está acontecendo, vemos ainda dois grandes desafios para a empresa. O primeiro, sob total responsabilidade da companhia, está relacionado à estabilidade e confiabilidade de suas operações, especialmente após os grandes problemas e pequenos números reportados nas unidades nos últimos trimestres. O segundo, e talvez mais complexo, é fazer com que este futuro realmente chegue da maneira como se espera, uma vez que muito da tese de investimentos hoje em metais básicos parte do pressuposto de que a demanda acima citada deverá impingir preços mais elevados a produtos premium, como o Níquel Class I da Vale, tornando as operações mais rentáveis. O atual cenário pós-covid, além da guerra na Europa e choques de oferta em toda a cadeia de suprimentos global gerou um desbalanceamento na estrutura mundial de oferta e demanda, em especial para commodities – e principalmente as energéticas. Choques como estes atrasam a evolução esperada para o cenário promissor apresentado, mas, como respondido por Deshnee Naidoo, VP Executiva de Metais Básicos, durante um bate-papo que tivemos no jantar, “este atraso dá tempo à Vale para se organizar internamente e estar ainda mais preparada para quando o momento chegar”.
Mantemos os preços-alvos para o fim deste ano de VALE3 e VALE US inalterados, em R$ 83/ação e US$ 17/ADR, respectivamente, assim como a recomendação Neutra. Os desafios correntes para a operação de Minerais Ferrosos – que representa 85% dos negócios da companhia hoje – continuam como principal limitador para a tese de investimentos, até que tenhamos mais claridade sobre a situação na China. Quanto à operação de metais básicos, acreditamos no potencial do negócio, mas, como falamos, a Vale ainda precisa comprovar a estabilidade e credibilidade de suas operações a fim de destravar todo o valor potencial de um futuro que pode tardar, mas chegará.
Metais Básicos: é chegada a hora?
Desde o ano passado, os preços de níquel e cobre tiveram altas significativas nos mercados internacionais, seguindo o bom momento para as commodities em geral, em razão da forte demanda alavancada pelos estímulos econômicos e choques na cadeia com a pandemia de covid. Os preços mais elevados beneficiaram as operações de metais básicos, contribuindo para recuperação de margens mesmo em cenário mais desafiador de custos e pressões inflacionárias.
Em tempo, a demanda por metais básicos tem sido impulsionada por importantes drivers que ascenderam com a evolução da agenda ESG, como a transição energética para combustíveis não-fósseis – o que tem elevado a demanda por veículos elétricos (EVs) – bem como pelo processo de descarbonização da cadeia. Vemos a busca por estes produtos aumentando no médio e longo prazo, conforme as vendas de EVs avançam, especialmente considerando os movimentos de importantes players automotivos, como GM, que objetivam cessar suas produções de veículos à combustão em 2030, em média. Além disso, empecilhos já conhecidos para o avanço desta categoria, como altos custos de produção e baixa performance das baterias, têm evoluído, melhorando a paridade com os veículos à combustão. De acordo com dados fornecidos pela Vale no evento, as vendas de EVs devem aumentar em cerca de 4x até 2030, para 38 milhões de unidades, com uma penetração global de 36% ante 8% em 2021, quando foram vendidos sete milhões de unidades.
Contudo, com as mudanças que temos visto na cadeia de suprimentos global, a oferta poderá não acompanhar o crescimento esperado na demanda, gerando desbalanceamento na indústria e beneficiando a precificação dos produtos, em especial produtos premium. Nesse sentido, devemos observar também uma indústria mais regionalizada, com empresas e governos buscando estreitar relacionamento com empresas e regiões mais próximas, a fim de garantir suprimento para suas operações, evitando estresses de choques de oferta e transporte transoceânico como visto recentemente. Um outro aspecto importante para a indústria, a agenda ESG tem fortalecido as preocupações com uma mineração mais sustentável, além da descarbonização da cadeia. Com isso, mineradoras e produtos de baixo carbono terão papel fundamental para o sucesso desta nova agenda e até mesmo da ascensão dos veículos elétricos, uma vez que a maior parte das emissões de CO2 destes veículos é gerada pela rota de produção das baterias.
Mineração sustentável: a aplicação dos princípios da sustentabilidade na mineração é um grande desafio, considerando que minerar é o ato de extrair e consumir recursos limtados da natureza. Contudo, o conceito de sustentabilidade aqui aplicado diz respeito a atender às necessidades atuais sem comprometer as necessidades das gerações futuras. Assim, a mineração sustentável visa à atividade de extração reduzindo os impactos ambientais das operações por meio da mensuração, monitoramento e trabalho que melhore o desempenho operacional via eficiência no consumo de recursos, minimizando os impactos locais na paisagem, incluindo flora, fauna e população, além da redução da poluição e encerramento correto das minas e áreas exauridas.
De mesma forma, quando olhamos para o Cobre, os drivers de crescimento da demanda passam pelo aumento da produção e vendas de EVs e fontes alternativas de energia e, consequentemente, a busca por produtos para bateria. Com cada vez mais restrições e cobranças tanto no aspecto ambiental como social, a oferta de cobre lida com desafios ainda maiores, além da taxa de exaustão das minas atualmente utilizadas, que deve acelerar nos próximos anos, levando, assim como no níquel, o desbalanceamento da oferta.
E como a Vale se vê diante deste cenário?
A companhia acredita estar preparada e mais bem posicionada que seus pares considerando quatro principais aspectos:
1) Agenda ESG: diante dos recentes acontecimentos em Brumadinho, a companhia tem aumentado seus esforços para adesão à agenda ESG, a fim de tornar-se a mineradora mais sustentável do mundo, conforme afirmado por seu CEO, Eduardo Bartolomeu. A Vale conta com mais de 90% de suas operações abastecidas por fontes limpas, com destaque para Indonésia (100%) e Brasil (99%). Além disso, a companhia traçou objetivos agressivos de redução de emissão de carbono em 33% para Escopos 1 e 2 até 2030, virando net zero em 2050, e reduzir em 15% Escopo 3 até 2035. Além disso, a companhia vem atuando em projetos de reflorestamento em áreas críticas de suas operações, como em Sudbury, além dos avanços sociais, referente à população indígena em Voisey’s Bay, por exemplo. Com isso, a empresa espera produzir, fornecer e liderar o segmento de produtos de baixo carbono em Metais Básicos.
2) Base de Ativos: acompanhando a regionalização que temos observado recentemente, destaca-se a base de ativos da companhia, com operações no Canadá, que visariam atender ao mercado das Américas e Europa, Indonésia e Austrália, com foco no mercado asiático, e Brasil, direcionado também à Américas e Europa. Além disso, a companhia conta com sua expertise em diferentes processos de metais e mineração, que trazem ainda mais valor agregado ao seu portfólio.
3) Recursos: além da ampla base de ativos, a Vale conta com reservas importantes em diferentes regiões que podem potencializar a produção de metais básicos para os próximos anos.
4) Novos Projetos: ao longo do evento, a companhia apresentou opcionalidades de projetos que poderiam levar a uma capacidade de produção anual de mais de 300 kton de níquel e 900kton de cobre no longo prazo.
Foco na geração de valor
Após os desafios enfrentados durante e após o ápice da pandemia, a Vale ainda vem trabalhando para estabilizar suas operações de metais básicos, que seguiram decepcionando conforme reportado nos resultados do 2T22 (veja aqui nosso comentário).
Dentre as ações tomadas, destacam-se as melhorias nas condições de mineração em Salobo e o foco na confiabilidade da planta, bem como a conclusão da manutenção do moinho em Sossego, visando maior produção e eficiência. De acordo com a empresa, as iniciativas já levaram a produção de níquel e cobre em agostos deste ano para níveis anualizados de 215kton e 340kton, respectivamente.
Os investimentos em produtividade e eficiência poderão reduzir os custos de produção de níquel dos atuais US$ 12.300/t para US$ 10.000/t e de cobre de US$ 4.000/t para US$ 2.300/t, via maximização do portfólio, melhor produtividade das minas, iniciativas junto aos fornecedores e melhoria na participação de subprodutos. Com isso, a empresa espera alcançar um EBITDA de cerca de US$ 4,5 bi em suas operações, contra US$ 3,2 bi em 2021.
Por fim, a companhia relembrou seus objetivos estratégicos quanto ao (i) de-risking da empresa, fortalecido pelos acordos referentes a Brumadinho, às seguranças de suas barragens, à Mariana e ao foco na retomada de sua capacidade de produção; (ii) reshaping, com a simplificação do portfólio via venda de nove negócios em cinco países diferentes desde 2019, eliminando cerca de US$ 2 bi de redutores de caixa ao ano, além do foco em manutenção dos custos fixos 2021 e 2022 e redução do Custo Caixa C1, conforme produção retoma; (iii) re-rating e a adesão a metas de redução de emissão de CO2 Escopo 1 e 2, foco em produtos verdes (como o briquete verde) e (iv) alocação de capital, via sua política de dividendos e programas de recompra de ações, os quais devem seguir permeando a política de remuneração de acionistas da companhia nos próximos anos.