Macroeconomia


Inter Research: Global Markets - China

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Gabriela Joubert

Publicado 23/jan

O ano do coelho começa no calendário lunar e qual a previsão para China em 2023?

Começou agora em 21 de janeiro, o Ano Novo Lunar, dando início ao ano do Coelho que, de acordo com a crença oriental, deverá trazer tempos de prosperidade, tranquilidade e longevidade, contrapondo o ano do Tigre em 2022, o qual foi caracterizado por uma maior intensidade e agressividade. Acreditando ou não nas previsões astrológicas, 2023 deverá ser um ano de recuperação para a economia chinesa (coincidência ou não).

Após dois anos de política zero covid, entrando e saindo de lockdowns, mobilidade reduzida e forte impacto no crescimento econômico, o gigante asiático reabre sua economia e suas fronteiras e as apostas são grandes para que a China retome o caminho do crescimento para este ano. Em 2022, o PIB chinês teve crescimento de 3% a/a, abaixo da meta instituída pelo governo, de 5,5%, e abaixo do informado por Xi Jinping, que havia antecipado um avanço de 4%. A desaceleração é reflexo dos fechamentos observados ao longo do ano, seguindo a política restritiva anti-covid no país adotada desde 2020, mas também resultado de um cenário mais incerto quanto à demanda global, o que vem afetando as dinâmicas de comércio exterior na China.

Falando em dados de comércio exterior, vimos as exportações chinesas recuarem fortemente em novembro e dezembro, impactada pela menor demanda global, ainda espelhando a desaceleração econômica nas principais economias do mundo, em especial Europa e Estados Unidos, em razão das políticas monetárias restritivas adotadas pelos Bancos Centrais para conter os avanços das pressões inflacionárias.

Contudo, as importações também surpreenderam negativamente no período, mostrando que a demanda interna chinesa também continua arrefecida, o que pode limitar as expectativas de recuperação para o próximo ano. Em dezembro, especificamente, houve efeito do processo desorganizado de reabertura da economia, que levou ao forte aumento de novos casos de covid diário, gerando ausências no trabalho e limitando a recuperação esperada no curto prazo. Para os próximos meses, contudo, é preciso atentar ao verdadeiro apetite local e global e seus efeitos na balança comercial chinesa, uma vez que o comércio mundial responde por boa parte do PIB do país.

Outro dado relevante para acompanhamento, o índice de atividade dos gerentes de compras, ou PMI, que mede a atividade econômica e antecede as dinâmicas de diferentes setores de um país. Os PMIs chineses seguem abaixo de 50 pontos, nível considerado contracionista, e o Manufatura registrou 47 pontos em dezembro, menor nível desde 2017. No curto prazo, conforme observado em outras economias pós- reabertura, devemos ver uma rápida recuperação do setor de Serviços, ancorada nas expectativas de demanda retraída pelo longo período de lockdown. Contudo, o sentimento ainda é de incerteza quanto às perspectivas para o ano, principalmente para indústria, que ainda sofre com problemas logísticos, altos preços de combustíveis e escassez energética

A produção industrial também veio oscilando ao longo de 2022, refletindo os períodos de fechamento e volta dos lockdowns. Em dezembro, vimos avanço de apenas 1,3% do indicador no país, após um crescimento também abaixo do esperado em novembro, quando houve alta de 2,2%. O patamar atual de ritmo de crescimento está abaixo da média dos últimos 15 anos, o que pode indicar um novo nível para a indústria no país.

De mesma maneira, a produção siderúrgica, que bateu recorde em 2020 ao totalizar 1.054 Mt, mostra sinais de arrefecimento. A produção média mensal em 2020 ficou em 87,9 Mt, e em 2021 bateu pico de 97,9 Mt em abril, maior nível da série histórica. Já em 2022, a média mensal de produção de aço ficou em 84,7 Mt, 4% menor que 2020, momento do auge da pandemia, e o ano deve fechar com uma produção total de aço de 1.015 Mt, de acordo com nossas expectativas. As exportações de aço que na última década deram vazão ao excesso de produção chinesa podem não surtir mesmo efeito a partir de agora, com demanda menor nas indústrias globais e medidas protecionistas ainda em vigor, como a Section 232 nos Estados Unidos.

Ao longo dos últimos anos vimos a produção siderúrgica chinesa ganhar ímpeto conforme a demanda de aço era impulsionada pelo processo de urbanização do país e pelo boom no setor imobiliário. Contudo, após anos de investimentos e desenvolvimento, os fundamentos estão desgastados e a recente política das Three Red Lines, que visa a diminuir a especulação no segmento de Real Estate, juntamente com a menor demanda no setor têm trazido desafios adicionais ao consumo de aço no país.

Com tantas incertezas, a confiança do setor também teve forte deterioração ao longo de 2021 e 2022, chegando próximo ao patamar mínimo de 2015, quando o país reportou avanço do PIB em 6,9%, menor patamar em 25 anos, colocando em xeque a política de crescimento via grandes investimentos, que por sinal, também recuavam, juntamente com a produção industrial no país.

Com este cenário traçado, vemos diferentes efeitos para a demanda por commodities no país e, consequentemente, seus impactos nas grandes exportadoras brasileiras. Se por um lado a demanda por commodities metálicas poderá ser limitada pelos desafios internos do setor imobiliário, por outro ainda vemos um cenário positivo para commodities energéticas e agrícolas, especialmente neste curto prazo, com a volta à mobilidade dando espaço para uma demanda ainda reprimida por dois anos de reclusão.

E com ficam as exportadoras neste cenário?

Vale, as siderúrgicas e os desafios do setor imobiliário: conforme mencionamos, algumas outras variáveis interferem na total retomada do setor siderúrgico chinês. No curto prazo, esperamos recuperação na demanda por aço advinda da normalização das operações industriais no país, bem como um nível não-estressado pelos efeitos limitantes dos lockdowns. A normalização da cadeia de suprimentos também deve dar impulso à demanda global em alguns setores importantes, como o automotivo. Contudo, no médio e longo prazo, ainda vemos os efeitos do mercado imobiliário chinês limitando a recuperação mais contundente do consumo de minério de ferro no país. A alta de preços da commodity no curto prazo, em nossa opinião, é resultado de dois principais fatores: o primeiro, o movimento de reabertura da economia e a demanda nacional reprimida, que impulsionou os preços de todas as commodities em nível global; o segundo, o período que antecede o ano novo lunar e que, sazonalmente, interfere nos preços dos insumos em razão do processo de reestocagem antes do feriado. Com uma expectativa de produção siderúrgica em menor patamar, no qual projetamos uma produção anual de cerca de 950 Mt, os preços de minério de ferro poderiam facilmente voltar a casa dos US$ 90/t – US$ 100/t, considerando a oferta mais comedida por parte das principais mineradoras globais, que recentemente revisaram para baixo seus guidances de produção. Nas siderúrgicas, a recente recuperação nos preços de minério de ferro abre espaço para anúncios de aumentos de preços no mercado local para alguns produtos, mas no médio prazo, vemos preços mais estáveis para os produtos siderúrgicos. O ponto positivo fica por conta da demanda, que pode ter impacto positivo pela recuperação da produção automotiva global, e efeito de pressões de custos menores, com inflação mais controlada.

Petrobrás e setor de Óleo & Gás. O preço do barril de petróleo sofreu bastante pressão nos dois últimos, após quase atingir US$ 150 em 2022, com a invasão russa à Ucrânia, o Brent devolveu boa parte dos avanços, conforme o cenário de recessão nas principais economias do mundo ganha força, seguindo o aperto monetário pelos bancos centrais globais. Porém, o contexto das commodities energéticas ainda é de pressão altista. O conflito entre Rússia e Ucrânia limita a oferta de Óleo e Gás (O&G) na Europa, um dos grandes mercados globais, enquanto a Opep, grande organização produtora de petróleo, já anunciou manutenção dos atuais níveis de produção, em razão do cenário global de menor demanda, limitando queda maior dos preços das commodities energéticas. Outro driver importante é o processo de reabertura na China, que deve retomar parte da capacidade produtiva do país, impulsionando, por consequência, o crescimento do consumo em cerca de 2-3 milhões de barris/dia.

Assim, para 2023, estamos considerando o preço do barril em cerca de US$ 80 - 90, patamar ainda elevado versus ao pré-pandêmico, mas arrefecendo nos anos posteriores, com um preço de US$ 65 no longo prazo, uma vez que o aumento do interesse por fontes alternativas, conforme a agenda ESG ganha espaço, tem limitado os investimentos em combustíveis fósseis, o que poderá comprometer as dinâmicas de oferta e demanda no longo prazo.

Já para o gás natural, com o choque causado pela restrição de oferta russa em razão das sanções estabelecidas pelos países contrários à Guerra, a Europa entra agora em momento delicado de abastecimento, e discussões sobre um teto de preços à commodity estão em pauta, visando maior controle dos custos e impactos nos índices inflacionários. A solução não é simples e no curto prazo ainda devemos ver preços oscilando em patamares mais elevados, seguindo a mesma tendência de 2022. Nesse sentido, vemos a dinâmica de oferta e demanda atual ainda beneficiando as companhias do setor que vêm operando com resultados operacionais fortes, impulsionados por preços elevados das commodities.

Papeleiras Chinesas e as grandes produtoras de celulose. No segmento de celulose, antecipamos uma queda de preços para este ano para as fibras, em razão das ofertas entrantes no mercado, as quais devem compensar as restrições que temos visto ao longo de todo 2022 e que contribuíram para os atuais patamares de preços. Mesmo assim, ainda vemos resultados sólidos das companhias que devem seguir beneficiadas pela demanda adicional que surge em outros mercados outrora assistidos pelos produtores europeus, que ainda lidam com choques na produção por conta do cenário de guerra na Ucrânia, restrições logísticas e condições climáticas adversas. Com o processo de reabertura da economia chinesa, devemos ver, assim como vimos em outras economias, uma rápida recuperação da produção de papel de imprimir e escrever, uma fez que a população volta aos escritórios e escolas. As papeleiras ainda operam com margens apertadas, mas devem conseguir repassar preços, conforme as dinâmicas de mercado melhoram, o que abriria espaço para manutenção dos preços em patamar ainda lucrativo para as produtoras de celulose. O mercado de papéis para fins sanitários continua saudável, o que contribui para uma demanda resiliente de fibra curta, beneficiando empresas como a Suzano, líder mundial na produção de fibras de eucalipto.

Consumo de commodities agrícolas e o setor de Frigoríficos. Para commodities agrícolas, a reabertura da China também se torna um sinal favorável, principalmente no 2S23, visto a melhora no acesso ao país, com redução das dificuldades logísticas enfrentadas pelas exportadoras, assim como um consumo mais aquecido pela população, por meio de uma recuperação da mobilidade, com volta das viagens, além de eventos institucionais e idas à restaurantes. A China foi responsável por cerca de 22,5% da importação de insumos agrícolas do mundo em 2021, sendo a maior consumidora de carnes do Brasil.

O último relatório da USDA sobre a oferta e demanda mundiais por proteínas, lançado em janeiro de 2023, ajustou positivamente as suas estimativas para carne bovina e suína, em razão da suavização das restrições contra o COVID-19. Para o consumo doméstico do país, a Organização estimou um crescimento de 2,84% a/a, ante a 0,83% a/a da última projeção, no qual, somado com a redução da estimativa de produção chinesa, proporcionou um crescimento de 2,2% a/a para importação, frente a uma queda de 9% a/a da expectativa anterior. Nesse cenário, foi projetado um crescimento de 3,5% das exportações brasileiras para China. Por outro lado, para carne de frango, é esperado um leve recuo na demanda e importação chinesa, mas buscas por novos mercados pelas exportadoras e gargalos na oferta aliviam os efeitos do cenário de desaceleração global. Além disso, riscos à demanda se mantém no radar, com efeitos ainda trêmulos da desaceleração global e patamares do consumo doméstico ainda incertos, além de produção e estoques de carne da China, que podem mexer com as cotações e resultado das companhias. De modo geral o setor de frigoríficos pode ser beneficiado por esse cenário, no entanto, o highlight se mantém para Minerva (BEEF3), levando em conta o seu perfil mais voltado para exportações, ótima gestão operacional, bem como atuação na América do Sul, com bom aproveitamento de suas vantagens competitivas.


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