E voltamos à inflação
Ao longo da semana dados de inflação voltaram ao radar, assombrando os mercados diante de números acima do esperado, reforçando os receios quanto a uma desaceleração global mais acentuada e levantando questionamentos sobre a posição dos Bancos Centrais globais quanto ao ritmo de seus apertos monetários. Na Europa e nos Estados Unidos, os Bancos Centrais transpiram para manter os ânimos controlados (não só dos mercados, mas os próprios ânimos também), porém, na China, as falas de estímulos parecem ir contra a maré, em tentativa do governo de impulsionar uma economia ainda sofrendo com os efeitos pós-Covid.
Com idas e vindas, o resultado são as altas e baixas dos índices que, em meio à volatilidade, encerraram a semana passada em alta, refletindo o bom humor momentâneo trazido pelo arrefecimento dos lockdowns na China e pela Ata do Fed, que trouxe um tom de menor incerteza ao mercado. O Nasdaq foi o grande destaque positivo, avançando 6,8% na semana, seguido pelo S&P500, com 6,6%. O MSCI Global avançou 3,3%, enquanto o MSCI Emerging recuou 1,2%, em reflexo a menor busca por ativos de maior risco. No acumulado do ano, entretanto, os índices continuam em campo negativo e o urso segue rondando, bramando aqui e ali, exigindo cautela ante movimentos muito bruscos.
Américas
Na semana passada, as atenções giraram em torno da Ata do FED. O documento mostrou unanimidade entre os dirigentes da instituição, contribuindo para reduzir as incertezas quanto aos próximos passos do Banco, ao menos no curto prazo, reafirmando que o ritmo de aumento de 50 bps nos juros deve ser suficiente para conter o avanço de preços no país. Contudo, ressalta-se a preocupação dos membros quanto a uma possível desaceleração do PIB para 2023 e 2024. Aliás, este é o desafio posto à mesa para o banco central norte-americano por parte do mercado: como conter a inflação sem que a maior economia do mundo seja levada à recessão. Se no início do ano falar de possível recessão parecia algo distante, de um mês para cá, o tema tem estado cada vez mais constante nas pautas de executivos de diversos setores da economia. Dado de vendas de casas novas nos Estados Unidos retraíram 16,6%, surpreendendo negativamente a projeção do mercado. Esse número reflete a aceleração recente das taxas de juros de longo prazo de hipotecas (que já alcançam o patamar de 2010) e aponta para a existência de alguns riscos para a atividade no setor imobiliário e para os preços de imóveis nos próximos anos. Os números mistos trazidos pelo varejo mostram um pouco das incertezas atuais. Na semana retrasada, os resultados de Walmart e Target levantaram questionamentos sobre os impactos do aumento dos custos no bolso do consumidor, que já começou a utilizar parte de sua poupança para manter seu ritmo de gastos. No entanto, uma análise mais aprofundada mostra que a população não tem diminuído o ritmo de consumo, mas vem mudando seu comportamento no momento da compra. Varejistas de vestuário viram suas vendas avançarem, conforme a população volta para eventos e vida social. Macy’s, grande representante do setor, revisou para cima sua projeção de lucro para este ano. O mercado de trabalho no país segue aquecido e esperamos mais um número forte no payroll que sai esta semana, contribuindo para salários mais altos, taxa de desemprego ainda em nível muito baixo, apontando para continuidade da pressão sobre a inflação nos próximos meses.
Europa
A inflação acima do esperado na Zona do Euro, batendo um novo recorde em maio e chegando a 8,1% (versus 7,7% do consenso), elevou as discussões sobre a possibilidade de um aumento de 50 bps nos juros na reunião do BCE em julho. Com os preços ao consumidor na Alemanha também acima do projetado, subindo 8,7% no mês, a inércia dos Bancos Centrais na região começa a ser questionada, mas preocupação quanto aos impactos da guerra na Ucrânia e abastecimento na região colocam ainda mais desafios para os determinantes da política monetária local, uma vez que os números de atividades já mostram forte arrefecimento desde o início do conflito. Somam-se a isso, os problemas com abastecimento de energia no continente, fortemente dependente do fornecimento russo. O setor de óleo e gás segue como destaque no mercado acionário, enquanto empresas de Utilities são penalizadas pelas recentes ameaças de novas tributações diante de uma forte distribuição de lucros em virtude dos resultados recentes, enquanto são cobradas por expansão de capacidades e de oferta. Ressaltamos o movimento altista que dominou o setor de varejo de luxo com a reabertura dos mercados chineses, importante destino das vendas destas empresas, enquanto o setor varejista como um todo amarga perda de mais de um terço de seu valor de mercado desde o início do ano. Assim como no Brasil, as mineradoras destacam-se na semana, refletindo o otimismo com a volta do mercado chinês ao jogo.
Ásia
Apesar da nossa visão mais pessimista para o médio e o longo prazo quanto ao ritmo de crescimento econômico na China, no curto prazo, o afrouxamento dos lockdowns no país e reabertura de Xangai, bem como novos estímulos anunciados pelas autoridades chinesas trouxeram novo fôlego para as bolsas mundiais. Dentre as medidas anunciadas, destacamos o pacote de auxílio às pequenas empresas, visando incentivar o empreendedorismo no país, bem como estímulos aos consumidores e potenciais compradores de imóveis, além do direcionamento mais incisivo aos bancos para elevarem seu ritmo de concessão de crédito. A fala do premier chinês, Li Keqiang, sobre novos estímulos para garantir o crescimento econômico do PIB do país no 2T e a taxa de desemprego em patamar adequado também ajudaram a elevar o otimismo dos últimos dias. Contribuíram também as conversas entre Biden e Jinping para remoção de tarifas sobre produtos chineses inseridas durante o governo Trump. Contudo, o ceticismo quanto aos efeitos no longo prazo diante dos recentes anúncios pode ser justificado pelos atuais números, por exemplo, dos dados de vendas de veículos em queda, mesmo comparado com os já fracos números de 2021, bem como números abaixo do esperado de lucros da indústria. Um dos principais motores da economia chinesa, e ainda fortemente enfraquecido pelas medidas contracionistas ao longo de 2021, o setor de Real Estate sofre para retomar o ritmo de crescimento, mesmo com os esforços do governo chinês para estimular a demanda via redução de juros e subsídios. Algumas casas já projetam um avanço do PIB chinês de 3% para este ano, bem abaixo dos 5,5% colocados como meta pelas autoridades do país.
Flashing Forward
Esta semana, além dos dados de inflação na Europa, os mercados acompanham números do setor imobiliário nos Estados Unidos, em busca de novas tendências e impactos em um dos segmentos mais representativos da economia local. Adicionalmente, serão divulgados dados de mercado de trabalho norte-americano que, de acordo com as expectativas, devem trazer novamente números robustos tanto de criação de vagas como de taxa de desemprego e renda, dificultando o papel do FED na contenção dos avanços da inflação em uma economia ainda bastante aquecida. Em virtude dos bons ventos que sopram na China, ao menos no curtíssimo prazo, poderemos ainda observar recuperação de setores como mineração e siderurgia, bem como ações de tecnologia. No entanto, dados de PMI podem seguir mostrando arrefecimento e a desaceleração global ainda deve ser pauta nas decisões de investimentos.