Macroeconomia


Congresso do Aço - Brasil 2022

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Gabriela Joubert

Publicado 26/ago7 min de leitura

A Indústria do Aço e a Agenda ESG

Esta semana, o Instituto Aço Brasil sediou o Congresso Aço Brasil 2022, evento que contou com a presença de participantes da indústria nacional, representantes políticos e especialistas em diversos segmentos ligados à agenda ESG, para discussão do futuro da indústria siderúrgica no Brasil. Entre os principais temas estão os desafios de um mundo potencialmente menos globalizado, custos de insumos mais elevados e a sustentabilidade que ganha cada vez mais importância no exterior e aqui, e como o Brasil poderia se beneficiar destes movimentos.

Diferentemente da última edição em 2019, a impressão que tivemos foi de uma indústria mais otimista com a situação do país, apesar dos desafios correntes. O processo de “desglobalização” que se tem observado em razão dos atuais gargalos logísticos e impactos em toda a cadeia de suprimento poderá permitir, na visão dos palestrantes, uma expansão natural da indústria nacional com o tão esperado aumento do consumo per capita de aço no país (estagnado há cinco décadas). Além disso, o movimento mais contundente da agenda ESG deverá propiciar uma maior demanda pelo aço verde e, neste sentido, as siderúrgicas brasileiras poderiam sair na frente, considerando o processo já em andamento de descabonização, seja via consumo de energia limpa ou via produtos diferenciados, fruto de investimentos tecnológicos. O principal desafio continua sendo o baixo crescimento da economia nacional, que limita a expansão não só da indústria de base, mas também de todo o ecossistema econômico do país. Além disso, foram discutidos, assim como nas edições anteriores, o peso do Custo Brasil no aço nacional, com impostos, custos logísticos e de infraestrutura. Colocar o Brasil na rota do crescimento, incorporando a narrativa da sustentabilidade, auxiliado pelo desenvolvimento tecnológico e reformas estruturais, como a administrativa e tributária, foi a conclusão chegada pelo evento findado os dois dias de discussão.

Painel 1: A Nova Ordem Econômica Mundial: Impactos nas cadeias globais

A crise observada na cadeia de suprimentos globais, potencializada pelos efeitos da pandemia, os quais levaram a restrições logísticas no mundo todo, colocaram sob escrutínio a política offshoring adotada por governos e empresas desde a década de 90, quando avançava o comércio internacional e buscava-se mão-de-obra barata e menores custos de produção. O que se vê hoje é uma preferência por estabilidade no fornecimento, “nearshoring”, mesmo que a custo mais elevado, e foco na reindustrialização dos países. Recentemente, tanto Estados Unidos como Brasil anunciaram planos de expandir sua capacidade de produção de micro condutores e diminuir a dependência das importações, um exemplo de nacionalização de indústria. De acordo com Stephen Dover, estrategista-chefe na Franklin Templeton, o futuro global pós-pandemia passa por cinco principais ondas: (i) demográfica, com envelhecimento da população e impacto na mão-de-obra, (ii) tecnológica, inovação e modelos disruptivos, (iii) dívida, seja governamental ou corporativa (iv) tributária, por meio de reformas e (v) mudanças climáticas, potencializada pela agenda ESG. E na opinião de Edwin Basson, diretor da World Steel Association, na indústria do aço, ganhará quem estiver alinhado a uma política sustentável, mas também ciente de que os custos estarão mais elevados com maior proximidade da cadeia de suprimentos e efeitos dos custos de energéticos. Investimentos em tecnologia também serão primordiais para resiliência e longevidade dos negócios no setor. A mudança estrutural que ocorre hoje na indústria deve ainda ser potencializada com o momento mais delicado da economia chinesa e sua indústria siderúrgica que lida com elevados custos de produção e pressões de margens, além de uma crise que acomete um de seus principais mercados consumidores, o setor imobiliário.

Painel 2: As Mudanças Climáticas e a Indústria do Aço

Dando maior enfoque à agenda ESG, o evento discursou sobre os efeitos das mudanças climáticas sobre a indústria siderúrgica. As discussões centraram sobre a descarbonização da cadeia produtiva e a utilização de fontes de energia alternativa, bem como o avanço na utilização de hidrogênio verde, biomassa, CCUS (Carbon Capture, Utilization and Storage) e outros. Os recentes progressos no país no desenvolvimento de parques eólicos e solares, assim como as discussões sobre o mercado de carbono podem colocar a indústria siderúrgica brasileira à frente das de demais economias mundiais, especialmente na transição Net Zero da indústria, que na opinião dos especialistas deve ocorrer em 2070. Entretanto, existe um custo para este protagonismo: maiores investimentos em tecnologia e dispêndios com matérias-primas, que devem seguir em patamares elevados.

Painel 3: Papel Estratégico da Indústria do Aço no Desenvolvimento Econômico

Ressaltando a importância de uma indústria de base forte, o terceiro painel focou nos entraves existentes para que o consumo de aço per capita, estagnado há décadas em 100 kg/ hab/ano, cresça. Por ainda se tratar de uma economia de baixo crescimento, a indústria brasileira lida com desafios inerentes ao panorama macroeconômico, o que, juntamente com desafios externos de preços e tarifações, dificulta a expansão do consumo no país. Dentre as possibilidades de alavancagem deste crescimento, discutiu-se a importância do desenvolvimento do setor imobiliário no país, que ainda conta com baixa penetração de moradia própria para a população. A presidente da Caixa, Daniella Marques, ressaltou o compromisso da CEF em reduzir esse gap nos próximos anos, além de focar sua gestão em projetos de PPP (Parceria Público-Privada) nos segmentos de infraestrutura, Saneamento, Iluminação pública e outros. A discussão sobre tributação e a simplificação dos tributos no país foi, mais uma vez, pauta.

Painel 4: ESG - Impacto no Valor de Mercado das Empresas

Se a agenda ESG ganha cada vez mais notoriedade, incorporar a narrativa da sustentabilidade no Brasil não será apenas necessário, mas primordial para garantir a perpetuidade dos negócios em nível global. As companhias brasileiras podem e devem liderar o movimento “Aço Verde” aproveitando de uma conjuntura favorável de energia limpa e produtos já acessíveis que ajudem na descarbonização da cadeia. Contudo, os desafios para a implementação e manutenção desta agenda passam não apenas pelo processo, mas também pela mudança de imagem que o setor tem historicamente. A transformação digital é solução, mas também traz provocações, uma vez que as siderúrgicas, historicamente conhecidas por seu trabalho pesado, competem com as empresas de tecnologia pelo mesmo tipo de mão-de- obra, foco da carreira STEM (Science, Technology, Engineering and Math). Além disso, o envelhecimento da população também coloca mais uma variável na equação.

Painel 5: Futuro da Indústria Brasileira do Aço: Visão dos CEOs

O último painel contou com a presença dos CEOs das principais companhias siderúrgicas do país discutindo os próximos passos do setor, expectativas e desafios. No geral, apesar do cenário adverso, a visão das companhias trouxe um tom positivo para o futuro, contemplando o objetivo mútuo de dobrar o consumo de aço per capita no país dos atuais 100 kg/hab/ano, estagnado há cinco décadas, o que, na opinião dos CEOs, aconteceria por meio da expansão do crescimento econômico do Brasil. Uma vez mais e como nos últimos anos, foi evidenciado os impactos nocivos do custo Brasil, agora quantificado, e que passam pela carga tributária nas companhias, problemas logísticos e de infraestrutura, custo de energia elétrica e combustíveis, mostrando que o aço sai competitivo dos portões das siderúrgicas, mas os custos adicionais até que o produto chegue nas mãos do consumidor limitam a competitividade nas exportações. Reforçaram também a necessidade da continuidade da agenda de reformas no país, como a tributária e a administrativa. Outro ponto de discussão, já ressaltado ao longo do evento e relembrado na fala dos dirigentes foi a importância da indústria siderúrgica para as demais indústrias do país. O processo de reshoring, ou seja, a volta da produção de uma empresa para seu país de origem, pode trazer oportunidades à indústria brasileira como um todo, com menor presença de produtos importados, especialmente da China. Por fim, a agenda ESG também traz oportunidades juntamente com desafios de se avançar em tecnologia, em qualificação de mão- de-obra e no processo de descarbonização de toda a cadeia do aço, tornando-o mais verde e adequado às exigências atuais, podendo colocar o Brasil na vanguarda do setor.

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