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Global Markets - Quem paga a conta de uma guerra comercial?

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Gabriela Joubert

Publicado 04/fev4 min de leitura

Uma América mais protecionista

O assunto da semana é, sem sombra de dúvidas, o anúncio feito pelo governo americano de impor tarifas a parceiros de longa data, como Canadá e México. No sábado, a administração de Trump anunciou a taxação de 25% sobre produtos importados destes dois países, mas limitando produtos energéticos, como petróleo, a uma tarifa de 10%.

Seguindo sua promessa de campanha, Trump vem anunciando medidas protecionistas para garantir a “proteção” da indústria nacional. Apesar de claramente colocado, os objetivos reais ainda são incertos. Ao visar garantir a dominância dos Estados Unidos no comércio global, claramente o posicionamento vem com grandes riscos, incluindo o início de uma guerra comercial que poderia levar a uma deterioração das relações com parceiros e aumento da presença da China no Ocidente, aparecendo como uma possível alternativa em alguns casos, apesar de limitados. Se o fortalecimento da economia americana foi outrora puxado pelo posicionamento pós-guerra pautado pela cooperação e integração internacional, agora parece que veremos uma país mais agressivo em suas relações, focado na dominância e não mais na cooperação. Neste jogo, ganham poucos, mas podem perder muitos. E Trump parece estar ciente disto ao postar em sua conta no X: “Haverá dor? Sim, talvez (ou talvez não!) Mas, faremos a América excelente novamente e tudo terá valido a pena”.

E sim, poderá haver dor. O Canadá anunciou tarifas de 25% em resposta, enquanto México ainda avalia os próximos passos. Mas não apenas isso. Em uma guerra comercial, os impactos podem ser sentidos ao longo de toda a cadeia produtiva e em diferentes esferas da economia. Neste sentido, fazemos a pergunta que, para muitos, tem fácil resposta: quem paga esta conta?

Quem paga esta conta?

Antes de mais nada, é preciso entender os impactos de tarifas na economia global. Quando um país implementa uma tarifa a um produto importado, a depender da representatividade deste produto na cadeia produtiva daquele país, o impacto pode ser maior ou menor. O ponto é que as empresas locais que dependem daquele insumo agora taxado terão duas opções: absorver o custo adicional da tarifa ou repassá-lo ao longo da cadeia e a capacidade de repassar este custo vai depender do tipo de produto ofertado. Se for um produto com poucos substitutos, qualquer aumento de preço pode levar à diminuição nas vendas e impactar os negócios, então a empresa opta por incorporar parte destes custos maiores, tentando recuperar no volume de vendas. Agora, caso o produto seja algo com poucos substitutos, um remédio ou gasolina, por exemplo, fica mais fácil da empresa repassar todo o seu custo adicional ao consumidor final, que independente do preço, vai seguir comprando, pois não tem muitas outras alternativas.

No fim das contas, não tem muita escapatória: ou este custo é absorvido pela empresa, prejudicando suas margens e rentabilidade, o que poderia levar a uma menor eficiência, afetando as decisões futuras de negócios, como expansão ou demissão, por exemplo, para compensar via outros cortes de despesas. Ou então este custo é absorvido inteiramente pela população, que precisará lidar com preços mais elevados.

Mas aqui também depende. De acordo com estudo feito pelo FMI, os efeitos das tarifas impostas acabam sendo, de certa forma, compensados por acordos bilaterais com outros países, tendo, então, impacto reduzido na balança comercial. Isto é o que poderíamos ver acontecendo com os países impactados pelas tarifas americanas: ou seja, uma busca por novas parcerias com outras economias. No entanto, vale ressaltar que estas parceiras são limitadas e dependem também do tipo de produto que está em questão, afinal os países se especializam na produção de determinado insumo a depender de sua vantagem competitiva (vide Brasil, por exemplo, e sua forte exportação de commodities).

De qualquer maneira, o efeito é de consequência: no curto prazo, poderemos ver os custos de produção sendo repassados pela cadeia e uma inflação mais alta demandando juros mais altos que, por sua vez, em um segundo momento, limitam o crescimento da economia, diminuindo consumo e levando a elevação das taxas de desemprego, exigindo cortes nos juros.

Quais os impactos para frente?

Podemos, sim, esperar por um período de grandes negociações e retaliação entre as principais economias envolvidas. E isto significa um período de bastante volatilidade nos mercados. No que tange o mundo dos investimentos, custos mais elevados poderão afetar as margens das companhias, conforme mencionamos, o que poderia trazer pressão nos resultados e, consequentemente, refletir nos preços de suas ações negociadas em bolsa. Além disso, custo mais alto significa inflação mais alta e, também como falado, o novo patamar de preços poderia limitar a atuação do Fed sobre o ciclo de cortes, elevando os questionamentos se o banco seria capaz de entregar ainda este ano os dois cortes projetados.

De acordo com projeções da Bloomberg, as tarifas poderiam apagar cerca de 1,2% do crescimento econômico americano, além de adicionar 0,7% nos índices de inflação. Com isso, poderíamos ter um cenário mais positivo para o mercado de bonds, enquanto no mercado acionário, em razão dos múltiplos esticados para o S&P 500, poderíamos ver se consolidar um período de correção para os ativos, com algumas casas considerando uma possível queda entre 5% e 10% para o índice este ano.

Mas conforme falamos, o cenário ainda é de incertezas e até mesmo os motivos de Trump para o anúncio destas tarifas não são plenamente conhecidos. De qualquer maneira, há grandes chances de que o governo esteja usando estas ferramentas como forma de barganhar melhores condições em seus acordos internacionais e que estas tarifas sejam temporárias e revistas conforme as conversas vão acontecendo.

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