Realização ou mudança de rota?
A semana inicia com correção generalizada nos mercados globais, com investidores reposicionando seus portfólios, preparando para um call de recessão nos Estados Unidos que, ironicamente, havia sido descartado em meados de junho. Os ativos de riscos sentiram o peso e corrigem, com S&P 500 e Nasdaq cedendo cerca de 2,5%, enquanto na Ásia o Nikkei despencou mais de 12% e na Europa o STOXX cai mais de 2%, limitado pelas empresas de setores mais defensivos. As Mag7 despencam, assim como os criptoativos. Na Renda Fixa, os bonds entram em rali. O CBOE Volatility Index, ou VIX, também conhecido como o índice do medo em Wall Street, chegou a bater 40 pontos, bem acima do patamar já estressado de 15 pontos das últimas semanas.
Estados Unidos: haverá recessão?
Após um primeiro semestre que contrariou as expectativas, mercados retomam as apostas de que a economia norte-americana caminhe para uma recessão, especialmente após os dados da semana passada mostrarem que há sinais de desaceleração no mercado de trabalho. O payroll de julho mostrou a criação de 114 mil novas vagas, contra expectativa de 180 mil, ao mesmo tempo que a taxa de desemprego chegou a 4,3%, colocando em vigor a regra de Sahm (falamos sobre isso neste relatório) que antecipou, sem falhas, as últimas recessões nos Estados Unidos. O FED manteve os juros no atual patamar e não deu sinais de início de cortes em setembro, porém ressaltou que o mercado de trabalho passa a ser uma preocupação, além de sinalizar que a inflação caminha conforme o esperado.
Entretanto, com os dados recentes, o mercado passou a precificar cortes mais agressivos de juros pelo FED e outros bancos centrais, levando a um rali nos bonds globais, com investidores chegando a precificar, em certo momento, 60% de chance de um corte emergencial pelo FED já na próxima semana, ou seja, antes da próxima reunião oficial, marcada para setembro. A leitura do mercado passa a questionar se o FED tardou para iniciar os cortes de juros, isto vindo de um mercado que até junho tinha descartado um cenário recessivo na maior economia do mundo, vale ressaltar.
Com isso, índices globais com grande representatividade de empresas de tecnologia recuaram na sexta e seguem devolvendo parte dos ganhos acumulados no ano, mas não o suficiente para zerar. Exceto pelo Nikkei. Nos últimos dias, o índice devolveu todo o ganho acumulado do ano e oficialmente entrou em bear market neste início da semana, com queda acumulada agora de quase 6% desde janeiro de 2024, sendo 20% de correção só agora em agosto.
Japão: Nikkei oficialmente em bear market
No Japão, o Nikkei recuou mais de 12% nesta madrugada, em seu pior dia desde 1987, enquanto os juros futuros por lá também voltaram a cair, mesmo com o BoJ (Banco central japonês) tendo recentemente iniciado seu ciclo de alta por lá. O movimento de alta dos juros divergindo do cenário de queda na curva norte-americana elevou o diferencial entre as duas economias, abrindo oportunidade no mercado de bonds japonês. Além disso, o iene que havia perdido valor recentemente voltou a apreciar ante o dólar, reforçando ainda mais a oportunidade para investidores locais. O problema é que o Japão é um grande exportador de poupança, o que torna qualquer movimento de fluxo migratório de recursos de volta às terras nipônicas um agravante na liquidez dos demais ativos globais. A alta dos juros japoneses também tem impactado o mercado interbancário, onde tem ficado cada vez mais caro se proteger das oscilações cambiais, em especial relacionadas ao iene, considerando a recente preferência dos investidores, bancos e governos pela moeda japonesa em seus negócios.
O efeito do tal carry trade
Nas últimas semanas, temos visto também os investidores correndo para fechar suas posições de carry trade, conforme a situação do mercado passou a deteriorar. Nos últimos anos, tem aumentado as operações carry trade com o iene japonês. Esta estratégia consiste em tomar emprestado moeda de uma economia sólida e com taxas de juros baixíssimas (iene, por exemplo) e investir em moedas de países com taxas de juros mais elevadas (como por exemplo, o real brasileiro). No entanto, o sucesso dessa estratégia depende da manutenção da moeda nos níveis mais depreciados e na volatilidade controlada. Com a forte apreciação do iene e a disparada do VIX (justificada ou não) vimos fundos de hedge e alguns outros investidores tendo que correr para fechar suas posições. De acordo com dados da CFTC data, mostrado pelo Wall Street Journal, havia mais de 180 mil contratos em aberto, apostando na desvalorização do iene no início de julho, e que juntos somavam cerca de US$ 14 bi. Este valor caiu para US$ 6 bi na semana passada. Com isso, a demanda por iene aumentou, ajudando na valorização da moeda.
Os impactos na alocação estratégica
Em nosso último relatório de alocação estratégica, reforçamos nosso receio quanto ao elevado patamar das expectativas quanto aos resultados das empresas, em especial ao setor de tecnologia. Além disso, também reforçamos nossa preferência pela Renda Fixa, buscando posições mais de médio prazo, visando reduzir o risco de reinvestimento em eventual reprecificação dos mercados quanto a curva de juros norte-americana que já vem acontecendo. Os juros das Treasuries de 10 anos já recuaram dos patamares estressados de 4,6% para abaixo de 4% agora, conforme o call de recessão vai ganhando força. Mantemos nossa preferência inalterada, mesmo após os movimentos recentes, uma vez que estes acabam consolidando nossa visão de desaceleração da economia norte-americana e justificam uma visão mais prudente à frente. Ressaltamos a importância da diversificação nos portfólios, especialmente tendo em vista movimentos abruptos como o de hoje. Confira nosso relatório de estratégia de mercado completo aqui.