O Banco mais shorteado do mundo
O ano de 2023 não começou bem para a indústria financeira global. Após o caso do Sillicon Valley Bank, que expôs a fragilidade em alguns bancos regionais nos Estados Unidos, o mercado ampliou a aversão ao risco no setor. Apesar do volume de transferência de recursos de regionais em direção a grandes bancos, o temor de uma crise sistêmica logo foi contido pelo Fed, que tem atuado na liquidação de bancos que já sentiram os maiores efeitos como SVB, Signature e First Republic Bank. Para além do problema de liquidez de alguns destes bancos regionais e de casos de perdas em resultado não-realizado devido à alta dos juros, o mercado bancário global passa por um período de cautela com a maior inflação, expectativas de recessão e inadimplência avançando, o que deve pressionar o ROA das instituições financeiras. Na Europa, investimentos duvidosos, casos de escândalos e uma reestruturação que não trazia resultados no Credit Suisse levou a sua incorporação pelo UBS. Sobrou até mesmo para o Deutsche Bank, que viu a precificação do seu CDS saltar pouco tempo depois da incorporação do Credit pelo UBS, em um movimento que mais soou como especulativo e contaminado pelos eventos recentes, que afetou a precificação dos credit default swaps do banco alemão, não havendo por lá maiores problemas de risco e liquidez.
Com todo noticiário é de se esperar que os investidores globais possam estar um pouco pessimistas com bancos, principalmente nos EUA, Canadá e Europa. Realizamos um exercício para captar o sentimento de mercado sobre os papéis dos bancos pelo mundo e observamos as posições shorteadas (vendidas) no setor e por incrível que pareça, não estamos falando de nenhum banco regional americano e muito menos de um grande banco suíço europeu. A maior posição vendida no mundo é a do canadense Toronto-Dominion Bank (TD Bank), que apenas em volume financeiro possui cerca de US$ 3,3 bilhões (dados em 10/04/2023) em posições vendidas, representando 3,1% do seu market cap. O volume supera com larga vantagem os maiores players bancários do mundo como o JPMorgan e Bank of America que possuem US$ 2,6 bilhões em posições vendidas cada um, sendo 0,7% e 1,2% de seus respectivos marketcaps.
O que é o TD Bank? O TD Bank é o sexto maior banco da américa do norte em termos de ativos. O banco comercial canadense foi fundado em 1855 e oferece serviços bancários em todo o Canadá e nos Estados Unidos. Nos últimos anos, o banco tem se concentrado em expandir sua presença nos Estados Unidos por meio de aquisições estratégicas. Em 2020, o TD Bank adquiriu uma parcela societária de 13,4% da Charles Schwab, como parte de uma parceria estratégica para oferecer serviços de corretagem para clientes em todo o mundo. Posteriormente essa parcela foi reduzida para 12% e o capital votante na investida segue sendo 9,9%. Em 2022, o TD Bank anunciou a aquisição do First Horizon Corporation (First Horizon), um banco regional dos EUA pelo valor de US$ 13,4 bilhões em dinheiro, correspondendo a US$ 25 dólares por ação da companhia, o prazo final da operação é em 2023.
O que houve com o TD? Os principais pontos de atenção para o banco envolvem dois grandes temas: i) investimento no mercado americano através da corretora Charles Schwab e do banco regional First Horizon e ii) exposição do banco à desaceleração do mercado imobiliário no Canadá. Parte do movimento pessimista com o banco vem da aversão a bancos regionais americanos, que revelou fragilidades no sistema relacionadas à perdas não-realizadas com títulos, que acabou resvalando na Charles Schwab e também trouxe à tona o prêmio que o TD Bank deve pagar em 2023 pela compra anunciada em 2022 do First Horizon, no qual o banco está sendo pressionado a renegociar os termos da compra após a crise bancária nos Estados Unidos, com as ações do First Horizon negociando a cerca de US$18 dólares, desconto de 28% frente ao acordado na aquisição. Por outro lado, observando os resultados e indicadores de risco e liquidez do TD Bank, não observamos maiores fragilidades, o banco possui um ROE de 18% e tem evoluído em suas receitas, lucro e apresenta um CET1 confortável de 16,2% e um Liquidity Coverage Ratio em 128%, sendo o mínimo de 100% no Canadá.
Outra parcela do pessimismo vem da exposição do TD Bank ao mercado imobiliário canadense, que passou por um forte crescimento e aumento de preços após a pandemia e desde 2022 vem enfrentando uma desaceleração. Mas apesar do cenário, a inadimplência no crédito imobiliário por lá ainda não tem apresentado avanços, porém as demais linhas de crédito tem mostrado forte tendência de deterioração.
Ainda vale shortear o TD? Desde que as posições vendidas atingiram a máxima em 31 de janeiro de 2023 com 58 milhões de ações, os vendidos ganharam cerca de 25% de retorno até o fundo em 23 de março de 2023, sendo até hoje um ganho de 12%. Contudo, as ações têm se recuperado desde o fundo, após a os temores com a crise nos regionais arrefecerem. Pode ser que atuar em um short agora no TD não faça tanto sentido assim, mas ainda há uma desaceleração no mercado imobiliário canadense que vale acompanhar. Indicadores por lá continuam mostrando uma inadimplência controlada nas hipotecas. Resta saber o que o banco vai fazer com o compromisso de compra do First Horizon. Se pagará uma multa de US$ 25 milhões caso o negócio não seja fechado e procurará outra opção mais barata, evitando pagar US$ 13,4 bilhões por um banco que hoje vale US$ 9,5 bilhões. Dentre todos esses motivos, a indústria bancária no exterior ainda sofre com efeitos de perdas não-realizadas em TVMs devido à alta dos juros, os principais players ainda precisam lidar com as incertezas nos juros e com custo de captação elevado, além de uma inadimplência no crédito pessoal em alta, por isso o ambiente ainda requer cautela.