O que o conflito de Israel, o preço da gasolina e a inflação tem a ver com a renda fixa brasileira?
Não, essa não é uma daquelas analogias do tipo “efeito borboleta” onde é difícil identificar a causalidade entre as variáveis, ou em outras palavras, é complicado entender o que tem a ver uma coisa com a outra. Na verdade, existe uma linha bem simples em que as une.
Como sabemos, Israel passa por um conflito com o Hamas e os receios de que a situação por lá piore aumentaram nas últimas semanas. Israel não possui uma produção de petróleo relevante em escala mundial, mas entre de 1/4 e 1/3 de todo petróleo produzido no mundo fica relativamente próximo a Israel, portanto, qualquer congestionamento do fornecimento na região, poderia provocar forte volatilidade no preço do petróleo.
Embora o Brasil seja autossuficiente em produção de óleo bruto, importamos derivados, tanto gasolina quanto diesel.
E a inflação e a renda fixa? A gente explica ao longo desta News...
O conflito entre Israel e o Hamas.
Infelizmente, Israel e Hamas passam por um conflito já longínquo. Como dito, embora não sejam grandes produtores de petróleo, estão localizados em uma região relativamente próxima ao Golfo Pérsico, área bastante relevante na cadeia petroleira global, com vários países que compõem a OPEC. Segundo as nossas estimativas, entre um terço e um quinto de todo o óleo produzido no mundo advêm desta região.
Para se ter uma noção comparativa do quão grave a situação poderia se tornar, a Rússia produz cerca de 10-12% de todo o óleo do mundo, e ao passo em que o conflito com a Ucrânia escalonou, o Brent bateu uma cotação superior a US$ 120 o barril. Não acreditamos que haverá um escalonamento com vários destes países se envolvendo, mas reforço que a logística de distribuição pode ser muito afetada, atrasando a entrega da commodity.
Outro ponto que merece destaque é a recente participação mais direta do Irã, com ataques a Israel. Existem muitos temores e incertezas, visto que o Irã possui projetos de armas nucleares, bem como é país relevante em produção do petróleo. Mesmo com Israel tendo se pronunciado, alegando retaliação somente a áreas militares, é um ponto a ser destacado e monitorado.
O preço do petróleo e possíveis desdobramentos...
Agora com todo este cenário em mente, o preço do petróleo tem apresentado bastante volatilidade, atualmente entre US$ 70-80 barril. Acreditamos que sem tais conflitos, Israel e Hamas, Rússia e Ucrânia, deveríamos observar as cotações abaixo dos US$ 70.
O que tem amenizado a cotação alta é a demanda de derivados um tanto quanto mais fraca. A economia norte-americana tem desacelerado, bem como o volume importado de óleo pela China tem caído consideravelmente, dado o momento econômico atual do país. Eu colocaria os gráficos aqui, mas acredito que você pode ficar cansado de tantas imagens (talvez em uma próxima edição).
E o Brasil nesta história?
Apesar da autossuficiência do Brasil em termos de produção de óleo bruto, não somos em termos de derivados, uma vez que as refinarias nacionais não têm capacidade de processar toda a demanda. Em números, menos de 10% da gasolina é importada e cerca de 25% do diesel também.
Assim, os preços internacionais importam para a dinâmica nacional. Antes, nós tínhamos como referência o Preço Paridade de Importação (PPI), mas a atual gestão da Petrobras mudou sua política de preços recentemente, implementando também outros fatores. O PPI demonstra qual deveria ser o preço de gasolina e de diesel praticado pelas refinarias da Petro. São vários fatores considerados, como a cotação internacional do petróleo, dólar, frete e outras variáveis.
Entretanto, usando como referência os números divulgados pela consultoria do S&P para o PPI, os nossos cálculos apontam que a Petrobras poderia abaixar cerca de 5,3% a gasolina nas refinarias e 6,1% o diesel. Como o cenário é bem incerto ainda, não sabemos qual será a decisão da empresa.
Mas qual o impacto disto para a dinâmica de preços, ou seja, para a inflação?
O preço da gasolina, a inflação e a renda fixa
Colocando em reais o parágrafo anterior, existe espaço para cortes de R$ 0,15 para a gasolina e R$ 0,20 para o diesel por litro. Nossas estimativas apontam que a gasolina é vendida por pouco mais de R$ 6,00/litro. Com isto em mente, nós estimamos que uma variação de 1% no preço da gasolina tem impacto de 0,05% no IPCA, chegando então a todo o ponto desta News.
Existe espaço para corte? Segundo nossos cálculos, sim. Mas o cenário é demasiadamente incerto, a ponto de não sabermos qual será a decisão da Petrobras, como o petróleo se comportará e qual será a resolução do conflito no Oriente Médio.
Como os impactos nos preços brasileiros podem ser significativos, isso certamente influência nas expectativas, tanto de IPCA, quanto dos juros futuros, bem como é levado em consideração pelo Banco Central em suas tomadas de decisão. Por fim, todos os pontos são interligados, em uma linha bem clara, diferentemente do cenário, que permanece bem incerto.
Dica cultural
Aproveitando o lançamento do documentário da HBO sobre os bastidores da trama, a dica cultural de hoje vai para a série The Sopranos. Em minha humilde opinião de mero entusiasta, é a melhor série de todos os tempos. Não só pela qualidade do roteiro, uma história muito bem amarrada e com um um final épico, é um das primeiras séries na qual o telespectador passa a torcer pelo vilão, entendendo a sua origem, suas motivações, a sua vida em si e o que leva Tony Soprano a tomar suas decisões.