Macroeconomia


União Monetária Brasil-Argentina

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André Valério

Publicado 23/jan

Ministro da Economia da Argentina sugere criação de moeda única entre Brasil e Argentina

A ideia seria ter uma moeda nos moldes do Euro entre os dois países. Posteriormente, atrairiam outros países para o bloco. O anúncio foi feito na esteira da visita do presidente Lula à Argentina e causou ruído no mercado.

Uniões monetárias não são novidades. A mais famosa de todas é a zona do Euro, que conta com 20 dos 27 países da União Europeia. Além disso, tanto o Brasil quanto os Estados Unidos são, tecnicamente, uma união monetária, pois são países federalistas, cujos estados têm poder de criar leis específicas e orçamentos independentes dentro de um contexto federal. E a moeda única é um dos elementos da federação. Por conta disso, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, existem unidades regionais dos bancos centrais que ajudam a coordenar a implementação da política monetária. Da mesma forma, na Europa existe o Banco Central Europeu e os antigos bancos centrais dos países-membro da zona do Euro atuam de forma equivalente aos bancos centrais regionais de Brasil e Estados Unidos.

Alguns critérios precisam ser atendidos para que uma união monetária seja bem-sucedida. É necessário observar i) plena mobilidade de mão-de-obra e capital entre os membros; ii) mecanismo de transferências fiscais; e iii) e uma coordenação dos ciclos econômicos entre as regiões. Note que o Brasil, e os outros exemplos de união monetária, atendem a todos esses critérios.

União monetária com a Argentina é uma má ideia. A economia brasileira e argentina possui diferenças irreconciliáveis entre suas políticas monetária e fiscal. Enquanto a inflação brasileira foi de 5,79% em 2022, a Argentina foi de 95%. Isso se reflete na taxa de juros praticada nesses dois países, cuja diferença, atualmente, é de 61,25 pontos percentuais. Temos indicadores parecidos de endividamento, a dívida bruta brasileira representa 74% do PIB, enquanto na argentina é 80%, entretanto, mais da metade da dívida argentina é denominada em dólar, o que torna o Peso Argentino extremamente suscetível a ataques especulativos. Outra diferença é o volume de reservas, enquanto o Brasil possui reservas internacionais no montante de US$332 bilhões, na Argentina o número é bem menor, US$42 bilhões, o que dificulta a obtenção de linhas de crédito.

Membros de uniões monetárias podem dar calote. Isso aconteceria caso a autoridade monetária responsável por coordenar a união, ficasse sob ataque especulativo. Esse risco não é desprezível, pois tanto Brasil quanto Argentina não conseguem se financiar de maneira barata em moeda internacional. Nesse caso, as economias sofreriam com uma parada abrupta no fluxo de capital estrangeiro, criando uma severa crise de liquidez.

Proposta não passa de ruído político. Dada a situação delicada da economia argentina, ela possui enormes dificuldades em se financiar em dólar, portanto, é de seu interesse encontrar uma alternativa para realizar operações comerciais com o setor externo. Isso vai em linha com o conteúdo do memorando assinado pelos dois países, que deixa claro que a moeda comum a ser criada é para facilitar as trocas comerciais e não implicará no fim do real ou do peso. Ainda assim, é uma proposta sem sentido econômico, tendo em vista que o dólar já cumpre essa função. Por fim, convém lembrar que 2023 é ano eleitoral na Argentina, logo, essa medida parece ser voltada para resolver problemas políticos, ao invés de problemas econômicos.

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