Resumo
- Demanda do mercado imobiliário brasileiro segue em alta e preços continuam pressionados. Minha Casa Minha Vidaé o grande propulsor do setor e já atingiu metade da meta estabelecida para o final de 2026, pressionando cada vez mais os recursos do FGTS
- Os custos com mão de obra voltam a acelerar e a escassez de trabalhadores segue como um dos principais desafios para o setor da construção. As discussões sobre a reforma tributária continuam em divergência entre governo e entidades do setor e não apresentaram evolução
- Primeira queda da taxa de juros americana em 4 anos já começa a agitar o mercado imobiliário por lá. Os custos com habitação reduziram e a demanda começa a dar sinais de aquecimento, podendo influenciar uma recuperação das vendas nos próximos meses. As construções apresentaram melhora e impulsionam a recuperação da competitividade do setor, com potencial de reduzir o preço de aluguéis.
Preços imobiliários seguem altos no Brasil
Preços de venda residencial reduzem ritmo de crescimento em agosto. O IGMI-R avançou 0,83% em agosto, uma desaceleração frente a alta de 1,06% registrada em julho, refletindo em uma aceleração menos acentuada nos últimos 12 meses de 12,1% para 12,3%. O índice FipeZap para vendas residenciais cresceu 0,76% em agosto, mesma variação do mês anterior e seguindo tendência de crescimento. Já os imóveis comerciais tiveram queda de 0,12%, com crescimento nulo em 12 meses.
Os índices de aluguéis têm comportamento divergente. O IVAR apresentou alta de 1,93%, após queda de 0,18% em julho. Com isso, o índice volta a acelerar nos últimos 12 meses para 10%. Já o FipeZap para aluguel residencial teve nova desaceleração, variando 0,88% em agosto, e mostra tendência de queda em 12 meses, ainda com um elevado crescimento de 14,1%.
Custos com construção seguem acelerando
Em setembro, o INCC teve alta 0,61%, um pouco abaixo da expectativa de 0,65%, mas segue em tendência de aceleração em 12 meses, passando de 4,84% para 5,23%. No ano, o índice acumula alta de 4,64%. Para níveis de comparação, a inflação de setembro medida pelo IPCA-15 tem um crescimento de 3,15% no ano.
Custos com mão de obra voltam a acelerar. A variação do índice de mão de obra foi de 0,64% em setembro, ante alta anterior de 0,57%. O grupo de materiais e equipamentos desacelerou de 0,76% para 0,60%, enquanto os serviços tiveram uma alta significativa, passando de 0,05% para 0,50%, impactados principalmente pelo aumento de 3,1% na conta de energia.
O Sinapi mostrou aceleração em agosto, passando de 0,40% para 0,63%, a maior taxa observada no últimos 2 anos, e a variação nos últimos 12 meses foi de 3,12%, também em tendência altista. O índice sofre pressão tanto por materiais, com alta de 0,50%, quanto por mão de obra, que após dois dissídios coletivos cresceram 0,81% em agosto.
A elevação da taxa de juros teve um impacto negativo nas perspectivas dos empresários para os próximos meses, mas não o suficiente para gerar um pessimismo para o setor, que vem crescendo bastante com as contratações do Minha Casa Minha Vida. A principal limitação de crescimento segue sendo a escassez de mão de obra qualificada, um desequilíbrio de oferta e demanda de trabalho cada vez mais discrepante enquanto empresas aumentam a demanda por trabalhadores. Por um lado, isso tende a gerar pressões ainda maiores nos custos e, por outro lado, pode incentivar uma busca por aumento de produtividade via investimento em tecnologia e inovação para a indústria no país. Ainda assim, a modernização do setor também requer mão de obra especializada e encontra certas barreiras como elevados impostos para produtos industrializados, outro grande desafio para o setor. As discussões sobre a reforma tributária continuam em divergência, com entidades do setor defendendo nova redução da alíquota para 60%, enquanto o governo estabeleceu redução de 40%.
Minha Casa Minha Vida deve ultrapassar meta estabelecida pelo governo
De acordo com o indicador ABRAINC-FIPE, as vendas de imóveis novos cresceram 44,5% no acumulado em 12 meses até junho, com mais de 187 mil unidades comercializadas, sendo 74% destas do programa Minha Casa Minha Vida. Só das unidades do MCMV, o crescimento no acumulado em 12 meses até junho foi de 61,8%, enquanto os de imóveis de médio e alto padrão foi de 7,9%, uma desaceleração em relação à alta registrada em maio (13,5%).
Em relação aos lançamentos, a representação do MCMV foi ainda maior, crescendo para 80,4% dos empreendimentos lançados nos últimos 12 meses, alta de 26,7%. No total foram mais de 42 mil unidades lançadas no 2º trimestre do ano, 36 mil sendo do MCMV com alta de 42,5% comparado ao 2º trimestre de 2023. Já os lançamentos de imóveis de médio e alto padrão ficaram relativamente estáveis nos últimos 12 meses (-0,2%). Com a desaceleração do ritmo de vendas e redução de lançamentos, a oferta de imóveis de médio e alto padrão recuou 26,7% em 12 meses, levando a oferta total a reduzir 3%, enquanto o MCMV teve alta de 11,9% nas unidades ofertadas. Em termos monetários, os lançamentos tiveram alta real de 16,9%, enquanto o valor de vendas cresceu 47,7% acima da inflação nos últimos 12 meses.
A meta durante todo o governo Lula para o MCMV é de um total de 2 milhões de contratações, número esse que deve ser ultrapassado de acordo com o ministro das Cidades. Em setembro de 2024 o governo já atingiu 1 milhão de contratações. Foram 450 mil em 2023 e a expectativa para esse ano é encerrar com 600 a 650 mil novas unidades contratadas.
Com previsões de maior demanda do MCMV, surgem as preocupações quanto à capacidade de financiamento. Recentemente, o presidente Lula autorizou o envio de um projeto de lei ao Congresso Nacional que deve tramitar ainda esse semestre sobre o fim do saque-aniversário, medida que está sendo apoiada pelos ministros das Cidades e do Trabalho e Emprego, e por entidades do setor imobiliário, como Abrainc e CBIC. O argumento é que a modalidade reduz os recursos disponíveis para o financiamento de habitação. Por outro lado, a Proteste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor – e a Febraban defendem a modalidade por ser uma fonte de crédito barato ao consumidor, importante principalmente para consumidores de baixa renda e negativados, e por não ter tido contribuição significativa em redução dos recursos do fundo.
Evolução do Financiamento Imobiliário
A recente melhora observada no saldo da poupança não se materializou. O saldo até o dia 20 de setembro estava em R$760,72 bilhões, uma queda real de 0,75% ao último valor de agosto. As captações líquidas no mês estão negativas em R$ 8,95 bilhões e o rendimento soma R$3,2 bilhões até o dia 20. Por outro lado, os financiamentos com recursos do SBPE estão mostrando alguma recuperação nos últimos 12 meses. Em agosto, o total financiado foi de R$18,4 bilhões, um aumento real de 1,9% no mês, mas com queda 2,1% no número de unidades financiadas devido à priorização pelas unidades em construção.
Mercado de crédito imobiliário avança. As concessões de crédito imobiliário atingiram R$21,6 bilhões em agosto, com crescimento de 20,2% no acumulado em 12 meses comparado ao acumulado em 12 meses até agosto de 2023. Há discussões sobre a elevação da Selic ser prejudicial a essa evolução, contudo, com as curvas de juros de longo prazo esticadas essa alta já encontra-se precificada. Além disso, com os dados de inflação não indicando pressões inflacionárias vindas do mercado de trabalho e o governo trabalhando para cumprir a meta fiscal, o ambiente de incertezas tende a se desestressar contribuindo para uma retomada da queda dos juros no próximo ano.
O mercado de capitais e o mercado bancário também têm tido grande participação na recomposição do financiamento imobiliário. As emissões de FIIs chegaram a R$34,7 bilhões de janeiro a agosto desse ano, ultrapassando o valor acumulado em todo o ano de 2023. As emissões de CRI foram de R$39 bilhões no ano, quase 70% superior ao valor acumulado no mesmo período do ano anterior. Já os LCI receberam R$126 bilhões em depósitos de janeiro a setembro, um volume expressivo, porém 35,2% inferior ao observado no mesmo período no ano passado.
Algumas soluções alternativas têm sido discutidas para ampliar os recursos de financiamento. Uma delas é reforçar o mercado secundário de crédito imobiliário através da Emgea, que atuaria como uma securitizadora de dívidas pendentes de famílias que adquiriram financiamento imobiliário, tornando as carteiras de crédito dos bancos em produtos de certificado de recebíveis. Outra medida é nova redução do prazo de vencimento das LCI, que foi alterado para 9 meses em agosto mas antes das mudanças implementadas em fevereiro era de 90 dias.
IFIX
O índice de fundos imobiliários sofreu queda de 2,6% em setembro. Nos últimos 12 meses o crescimento teve forte desaceleração para 2,7%, ante 7,6% em setembro de 2023 e 18,2% em janeiro de 2024, e o índice anda de lado no ano com variação acumulada de -0,2%. A retomada do ciclo de alta da Selic prejudica os ativos imobiliários com a elevação dos custos de capital e encarecimento do crédito. Por outro lado, os FIIs de papéis tendem a se beneficiar pelos títulos de renda fixa mais rentáveis.
Possível momento de inflexão nos EUA
Primeira queda da taxa de juros americana em 4 anos já começa a agitar o mercado imobiliário. A taxa de hipoteca caiu 1,14 p.p. desde o pico do ano ocorrido em maio e está em 6,08%, mínima dos últimos 2 anos, reduzindo o valor de pagamento mediano com habitação. De acordo com dados da Optimal Blue, os pedidos de hipotecas tiveram alta de 67,6% frente a agosto, 5 dias após o corte dos juros. O índice de demanda de compra de casas medido pela Redfin subiu para o maior nível desde maio durante a semana em que o Fed cortou os juros, subindo 1% anualmente, primeira alta em quase 1 ano.
As vendas ainda não se recuperaram. As vendas de casas existentes recuaram 2,5% em agosto, pior que a antecipação de -1% pelo mercado, enquanto as vendas de casas novas caíram 4,7%, queda abaixo da esperada pelo mercado de 6,9%. Mesmo com indícios de recuperação na demanda, ainda não vimos uma melhora de fato nas vendas. Isso se deve a fatores como o preço ainda elevado das casas, com alta de 4% no ano, além das incertezas referentes à magnitude da queda das taxas de juros, com alguns potenciais compradores esperando que as taxas hipotecárias caiam ainda mais, e incerteza devido ao período pré-eleição. Contudo, é provável que não haja uma queda mais acentuada das taxas de hipotecas uma vez que o mercado já havia antecipado um corte intenso antes da decisão do Fed. À medida que o mercado for tendo maior clareza quanto ao movimento das taxas de juros e depois que passarem as eleições podemos observar uma movimentação mais intensa na demanda. Além disso, com a redução dos custos com habitação e o aumento dos pedidos e refinanciamentos hipotecários, podemos observar uma melhora nas vendas nas próximas semanas.
As construções, por outro lado, apresentaram melhora. As construção de novas unidades cresceram 9,6% em agosto, recuperando a queda do mês anterior, e houve um aumento de 4,6% na concessão de novas licenças. A redução das taxas de juros incentivam também uma melhora na oferta, que se encontra estagnada, com casas demorando cada vez mais para serem vendidas e sem recuperação da quantidade de novas listagens no mercado. Com uma melhora na qualidade e variedade de casas ofertadas as vendas podem ser estimuladas, trazendo maior competitividade ao mercado. As construções finalizadas aumentaram 30% com relação a agosto do ano passado, principalmente para os apartamentos multifamily, que cresceram quase 80% no ano, com 740 mil unidades finalizadas, maior valor dos últimos 50 anos. De acordo com análise da Redfin, o valor pedido do aluguel para novos apartamentos caiu 6,2% no segundo trimestre frente ao ano anterior, estando no menor valor desde 2022.