Uma trégua bem-vinda
O grande acontecimento em maio foi a trégua entre China e Estados Unidos, que anunciaram no último dia 12 a redução nas tarifas cobradas um sobre o outro. Pelos próximos 90 dias, os EUA reduziram as tarifas de 145% para 30%, enquanto a China para 10%, com promessas de trabalharem conjuntamente para um melhor equilíbrio do comércio internacional entre os dois países.
Esse recuo foi suficiente para gerar um grande alívio no mercado. Desde o o dia 9 de maio a bolsa americana subiu mais de 5%, na expectativa que o recuo reduza a probabilidade de uma recessão na economia americana, e permita, inclusive uma retomada da trajetória de crescimento.

Essa visão contribuiu também para uma pressão sobre os yields americanos, que desde então avançaram mais de 10 bps. Mas há outros fatores influenciando além de uma visão de retomada do crescimento. O fiscal americano começa a fazer preço nos yields, especialmente em meio a discussão de uma nova reforma tarifária que irá contribuir para o aumento do déficit, cortando impostos sem cortes significativos de gastos.

O fiscal ficou em maior evidência com o anúncio de downgrade da dívida americana pela Moody’s, mas a resposta do mercado foi bem fraca. De fato, o downgrade tende a ser uma não notícia. A trajetória fiscal frágil já é de conhecimento do mercado e está bem precificada nos yields. Além disso, o downgrade não afeta o papel das treasuries americanas como colateral dos bancos, ainda dentro do exigido pelas regras de Basileia, então é pouco provável que se veja um sell off generalizado das treasuries americanas.

Entretanto, o recuo na guerra tarifária não significa resolução total da incerteza gestada ao longo do mês de abril. Ainda vemos o nível de incerteza em patamar excessivamente alto, e o fato da trégua ter prazo de validade, contribui para uma volatilidade elevada. Além disso, mesmo com o recuo nas tarifas, a tarifa efetiva da economia americana é uma das maiores dos últimos anos e considerando apenas o fluxo comercial com a China, devemos ter um custo em torno de 1,5 p.p do PIB americano, um custo considerável que pode ter impactos significativos, tanto sobre a inflação quanto sobre a atividade.

Com isso, ainda se vê expectativas de inflação desancorando, e as firmas mais pessimistas. Mas, por enquanto, esse repasse ainda não apareceu nos dados. A inflação americana nos primeiros 4 meses do ano foi bem amena, e em abril tivemos nova surpresa de baixa, com uma alta de 0,2%, levando o CPI a 2,3% nos últimos 12 meses.

Foi a primeira leitura de inflação pós-tarifas, mas ainda sem sofrer grandes impactos, devido à defasagem do repasse e da rigidez de preços. Ainda assim, mostra que o cenário da inflação, pré-tarifas, era um cenário de acomodação, com a inflação nos últimos 3 meses recuando.


Ao mesmo tempo, o mercado de trabalho americano continua saudável, com taxa de desemprego estacionada em 4,2%. Apesar de ser um dado de abril, já com potencial impacto de tarifas, não havia muita expectativa de que o caos tarifário fosse se manifestar nesse relatório. Se houver algum impacto, esperamos que ele seja notável a partir do mês de maio, portanto, a próxima leitura pode nos dar maiores informações sobre a dinâmica futura do mercado de trabalho.


O que se vê nos dados é uma fotografia da economia americana pré-tarifas robusta e resiliente. O único dado negativo que tivemos foi o PIB do primeiro trimestre, que registrou variação negativa de 0,3%. E aqui sim tivemos impacto das tarifas, pois houve um movimento de antecipação que aprofundou o déficit na balança comercial. Mas se desconsiderarmos os itens mais voláteis do PIB, o que se viu foi uma economia crescendo a uma taxa de 3% anualizada, portanto, em boas condições e em linha com os outros dados.
Nesse contexto, o cenário para o Fed é essencialmente o mesmo. Se não fosse o caos tarifário muito provavelmente o Fed estaria pronto para retomar o ciclo de cortes, com inflação convergindo à meta e o mercado de trabalho em melhor equilíbrio. Mas mesmo com o recuo das tarifas, a incerteza ainda é considerável. Não se pode descartar um impacto significativo tanto sobre o crescimento quanto sobre a inflação, e ainda não temos uma perspectiva muito clara sobre qual efeito prevalecerá. Desse modo, é bastante imprudente para o Fed tomar alguma medida proativa, especialmente em meio à desancoragem das expectativas de inflação. Como a política monetária está bem próxima do equilíbrio, a melhor resposta para o Fed é aguardar. Com a inflação se aproximando da meta, nos atuais 2,3%, o foco vai estará sobre o desempenho do mercado de trabalho.
Mantemos a visão de que o Fed deverá retomar o ciclo de cortes apenas quando tiver maior confiança de que o impacto inflacionário das tarifas não será relevante ou quando o mercado de trabalho desacelerar de maneira significativa. Esperamos que essa confiança só se materialize no segundo semestre, com os cortes retomando a partir da reunião de setembro. Portanto, esperamos que a economia americana desacelere ao longo do ano, permitindo 3 cortes de juros esse ano, a partir de setembro.