Resumo
Após o forte começo da economia em 2023, chegamos ao final do ano com um cenário de desaceleração, que deve se estender no começo de 2024, contribuindo para consolidar o processo de desinflação e permitir a redução da taxa Selic para 9% até o final do ciclo.
A balança comercial deve continuar positiva, principalmente pela exportação de petróleo, e os cortes de juros ao longo de 2024 devem impulsionar a retomada do crédito e uma aceleração do crescimento a partir da segunda metade do ano, e esperamos crescimento do PIB de 1,8%.
A economia internacional, em particular a americana, também surpreendeu em 2023 e também deve desacelerar em 2024, permeando um cenário mais benigno com menores taxas de juros.
2023: não tão ruim quanto se esperava
Terminamos 2023 com desempenho da economia brasileira melhor que o esperado, mas o cenário para 2024 ainda é desafiador. Devido ao aperto monetário, no Brasil e global, se esperava que, em 2023, a economia fosse andar de lado. De fato, chegamos no segundo semestre com sinais de desaceleração, mas o PIB deve encerrar o ano com crescimento próximo a 3%, refletindo o forte desempenho da agricultura e do setor externo, que surpreenderam positivamente, especialmente no primeiro semestre. A desaceleração da atividade no 2o semestre contribuiu para a dinâmica inflacionária mais benigna, criando as condições para os cortes na taxa de juros e com isso, melhores perspectivas para 2024.
A política fiscal, como antecipado, foi o ponto fraco da economia em 2023. O governo passou o novo arcabouço, que tem como objetivo chegar ao equilíbrio fiscal com crescimento de despesas menor que o das receitas. Entretanto, o que vimos ao longo do ano foi o inverso, arrecadação em queda e despesas que devem ter a maior expansão real desde 2015, subindo mais de 6% acima da inflação. O déficit primário deve encerrar o ano próximo a 1,4% do PIB e a meta de déficit zero em 2024 fica cada vez mais difícil e ainda incerta. Por outro lado, a aprovação da reforma tributária é um ponto positivo, que trará ganhos significativos para a economia brasileira no longo prazo.
Cautela nas perspectivas para 2024
Para o início de 2024, antecipamos um cenário de continuidade da desaceleração observada. A atividade deve continuar desacelerando antes de voltar a crescer. O aperto monetário ainda é elevado, com a Selic encerrando 2023 em 11,75%, o que implica em juro real bastante restritivo, impactando o crédito e mantendo a demanda enfraquecida ao longo do primeiro semestre. Nossa expectativa é de que a Selic encerre 2024 em 9%, assim, esperamos uma retomada do crescimento na segunda metade de 2024. Paralelamente, antecipamos que a dinâmica inflacionária continuará sua tendência de queda no curto prazo e o IPCA deve encerrar 2024 com alta de 3,7%, contra 4,6% em 2024. No entanto, as expectativas mais longas para a inflação devem permanecer desancoradas devido ao risco fiscal e manter alguma restrição monetária por parte do BC.
Mais uma vez a política fiscal será fonte de incerteza em 2024. O ajuste proposto pelo governo é amplamente baseado no aumento da arrecadação, o que tem encontrado resistência no Congresso e limitações da própria economia, considerando a já elevada carga tributária no Brasil. Além disso, declarações do governo questionando a necessidade de zerar o déficit pode resultar em uma revisão da meta para evitar o contingenciamento de despesas. Mesmo a tentativa de reduzir o déficit do atual patamar de 1,4% em 2023 (projetamos 1% em 2024) exigirá um esforço fiscal maior via contenção de gastos, o que não parece ser prioridade do atual governo. Portanto, o fiscal deverá ser, novamente, um dos riscos em 2024, impedindo uma queda maior das taxas de juros.
PIB
A atividade econômica foi uma grata surpresa em 2023, mas esperamos que o PIB cresça 1,8% em 2024. A expectativa no início do ano era de que a economia fosse crescer apenas 1%, mas a surpresa de um crescimento que deve chegar a 3% veio por conta do desempenho do agronegócio e do setor externo, com balança comercial superavitária recorde. No âmbito setorial, observamos a resiliência dos setores de serviços, que desde a reabertura pós-pandemia apresenta forte crescimento. Outro destaque positivo, foi a robustez do mercado de trabalho. A taxa de desocupação iniciou o ano em 8,8% e manteve tendência de queda contínua durante todo o ano, devendo encerrar 2023 em 7,6%.
Para 2024, antecipamos atividade econômica menos robusta. Os dados do segundo semestre já apontam nessa tendência, com desaceleração principalmente em serviços, enquanto comércio e indústria seguem estagnados. O agronegócio, que foi um grande determinante do crescimento em 2023, pode iniciar 2024 sendo uma força negativa, devido aos episódios climáticos que se observa no Brasil nas últimas semanas.
Por outro lado, o setor externo deve continuar positivo, principalmente pela exportação de petróleo, com o Brasil a caminho de ser o 6o maior produtor até 2028, o que tem causado uma mudança estrutural na nossa balança comercial, que esperamos que encerre 2023 com saldo superavitário de US$95 bilhões, 50% superior a 2022. Para 2024, esperamos uma redução do superávit para US$75 bilhões, mas ainda em patamar acima do observado nos últimos anos.
Crédito
A concessão de crédito manteve em 2023 a desaceleração iniciada em abril de 2022. Naturalmente, a política monetária restritiva contribuiu para essa queda, mas o ritmo foi intensificado após o episódio das Lojas Americanas em janeiro de 2023. A desaceleração na concessão de crédito foi mais acentuada na pessoa jurídica, que teve queda de 2% no acumulado do ano.
Mesmo com o início do ciclo de cortes na taxa de juros, esperamos que as concessões continuem em fraco ritmo de expansão. Depois de crescer apenas 3% em 2023, as concessões devem ter alguma retomada em 2024, mas ainda ficar aquém do crescimento médio de 15% dos últimos anos. Já vemos alguns sinais de que o pior possa estar ficando para trás. A inadimplência, por exemplo, já aparenta ter atingido o pico, com a taxa recuando por três meses consecutivos. Ainda assim, esperamos que o crédito comece a reverter a atual expectativa somente a partir do 2o semestre de 2024, quando o estoque de cortes da política monetária estará em patamar mais significativo.
Inflação
Inflação foi outro tema que surpreendeu positivamente em 2023. Após um início de ano turbulento, com a inflação de serviços tendo alcançado valor recorde para a série histórica em fevereiro, a inflação entrou em dinâmica bastante benigna. A atual tendência de desinflação é resultado tanto de fatores cíclicos como do aperto monetário em curso desde 2021. Tivemos desinflação causada por preços de combustíveis e alimentos. Observamos também uma desinflação consistente das medidas de núcleo, que exclui esses itens mais voláteis, indicando que a política monetária foi capaz de induzir a desinflação necessária.
Para 2024, esperamos a continuidade do atual cenário, com a atividade enfraquecida na margem contribuindo para a manutenção da inflação dentro da meta. Ao mesmo tempo, vemos pressões inflacionárias vindo dos alimentos, mas que podem ser contrabalanceadas por nova queda observada nos preços do petróleo. Por outro lado, a questão fiscal é uma incógnita, podendo contribuir para uma convergência mais acelerada da inflação à meta, ou sendo um fator inflacionário devido à desancoragem das expectativas.
Políticas Fiscal e Monetária
Em 2023, as grandes incertezas sobre a política monetária foram quando o ciclo de cortes se iniciaria e sua intensidade. Essas incertezas foram resolvidas em agosto quando o banco central deu início ao ciclo de cortes e pautou a intensidade do ritmo para o futuro próximo. Portanto, o cenário para a política monetária em 2024 é um tanto claro. Os cortes de 50 pontos base prosseguirão pelo menos até o fim o começo do segundo trimestre. A partir daí, esperamos que o Copom reduza a intensidade dos cortes até que a Selic alcance o patamar de 9% ao fim de 2024. Com a atividade fraca e inflação controlada, caso a piora fiscal não se concretize, não descartamos Selic abaixo de 9% ainda em 2024.
A política fiscal deve continuar sendo fator de risco. Apesar da forte expansão de gastos, mais de 6% acima da inflação em 2023, ter sido antecipada pela Pec no final do ano passado, a deterioração das contas públicas ao longo de 2023 ficou acima do esperado e esperamos que o governo encerre 2023 com um déficit de 1,4% do PIB e a dívida bruta equivalente a 75% do PIB. Um ponto positivo da política fiscal em 2023 foi a aprovação do novo arcabouço fiscal. Para 2024, a meta é zerar o déficit. Entretanto, o governo pretende alcançar esse resultado principalmente via aumento de arrecadação, o que julgamos insuficiente. Dada a reticência do governo em promover contenção de gastos, esperamos para 2024 um déficit primário equivalente a 1% do PIB, com a dívida bruta alcançando 78% do PIB.
Câmbio
A taxa de câmbio teve valorização em 2023.
Apesar do risco fiscal, prevaleceu o fundamento dos juros mais elevados e forte fluxo comercial. A redução da incerteza política, com o investidor estrangeiro avaliando o governo de maneira mais positiva e um fluxo favorável, principalmente devido aos valores recordes da balança comercial, foram fatores que favoreceram o Real. Portanto, esperamos que a taxa de câmbio encerre 2023 próxima de R$5,00, equivalente a uma apreciação de 4,3% do real em 2023.
Para 2024, vemos riscos desbalanceados para o câmbio. Por um lado, o fiscal pode voltar a trazer mau humor entre os investidores, particularmente se o governo se mostrar incapaz de controlar o crescimento dos gastos. Por outro, o fim do ciclo de alta da política monetária nos EUA ajuda a limitar a pressão via diferencial de juros. Além disso, esperamos que a balança comercial continue em patamar robusto em 2024, mantendo o fluxo positivo. Dado esse cenário, esperamos que a taxa de câmbio encerre 2024 cotada próximo a R$5,00 com um viés de baixa.
Internacional
A economia internacional, em particular a americana, foi outra grande surpresa em 2023. Desde o momento em que o banco central americano iniciou o ciclo de alta na taxa de juros, uma recessão é esperada na economia americana. O que se viu foi o oposto, com a atividade crescendo a uma taxa robusta e o mercado de trabalho se mantendo em nível bastante aquecido com taxa de desemprego abaixo de 4%. Alguns fatores explicam essa surpresa, desde distorções causadas pela pandemia até à defasagem da política monetária, mas um grande agente foi a política fiscal altamente expansionista implementada pelo governo americano.
Entretanto, a tendência de desaceleração já é visível. Com a taxa de juros em 5,5% e o banco central americano prometendo mantê-la nesse patamar por tempo suficiente até que a inflação volte à meta, esperamos que a economia americana mantenha tendência de desaceleração até entrar em recessão ao fim do primeiro semestre de 2024. A nossa expectativa é que seja uma recessão leve, de correção de ciclo, mas um grande fator de risco, na nossa visão, será o comportamento dos ativos de Commercial Real Estate (CRE), que podem ser o gatilho para o aprofundamento de uma eventual recessão. Dado esse cenário, esperamos que o Fed dê início a um ciclo de cortes na taxa de juros a partir do final do 1o semestre de 2024, levando a taxa básica para abaixo de 3% até o fim de 2025.