Macroeconomia


Carta ao Mercado - Mar22

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Mário Corrêa

Publicado 15/mar10 min de leitura

Resumo

A alta da inflação tem sido tema recorrente no debate econômico devido ao novo pico de preços das commodities no mercado global. As commodities subiram 25% desde o começo do ano e já vemos impactos diretos na inflação no Brasil e em outros países. Com os recentes reajustes de alimentos e da gasolina, o IPCA pode chegar a 6,7% no ano, novamente acima da meta. Mas também vamos ver melhora na balança comercial e na arrecadação do governo, resultado da melhora nos setores produtores e exportadores, incluindo óleo e gás. O cenário é de muita incerteza e é importante ter cautela nesse momento. A inflação pode ser alta por mais tempo, caso as commodities permaneçam em patamar elevado, ou podemos ver uma reversão, incluindo um cambio mais favorável ou até mesmo com a demanda em queda mais significativa.

Um novo ciclo de alta das commodities

A recente alta das commodities gera como primeira preocupação mais inflação. A nova alta da inflação tem sido tema recorrente no debate econômico nas últimas semanas. E com razão, os preços das commodities no mercado global subiram 10% desde o dia 25/02, quando começou a invasão da Ucrânia pela Rússia, e já acumula alta de 25% desde o começo do ano. O destaque tem sido o petróleo, que chegou a bater $127/barril, a maior alta desde 2012, e apesar de ter recuado, permanece com elevada cotação próxima de $110. Outras commodities como trigo, milho, soja e metais, como níquel, alumínio e minério de ferro, também subiram nas últimas semanas. Rússia e a Ucrânia são importantes produtores mundiais, e os embargos e dificuldades de logística com o conflito, devem resultar em redução de oferta global. A maior aversão a risco e o próprio receio da mais inflação também alimentam novas compras e aumento de estoques, o que causa ainda mais pressão nos preços no curto prazo. Reajustes de energia e alimentos já começam a dar sinais de alta e, com a inflação dos últimos 12 meses em níveis elevados em diversos países, por exemplo, quase 8% nos EUA, podemos ver uma persistência maior e contaminação para outros setores, como serviços e salários.

Qual será o impacto dessa alta no IPCA? Ainda é difícil prever todo o impacto, mas as elevações recentes dos alimentos e da gasolina já apontam para um IPCA próximo de 6,7% em 2022, bem acima das projeções no início do ano que eram de 4,7%. Os alimentos, podem subir cerca de 9% no ano, e os preços monitorados, cerca de 5%. O cenário pode ter alívio caso haja uma reversão mais rápida dos preços das commodities, ou pela resolução do conflito, ou pela queda na demanda global. O real segue em tendência de valorização e já acumula ganho de 10% desde o fim de dezembro de 2021, o que também pode amenizar parte da alta das commodities. E pelo lado da demanda doméstica, o aperto monetário em curso ainda não surtiu efeito, e podemos ver uma contenção da inércia inflacionária com o elevado patamar de juros na nossa economia. O cenário ainda é de muita incerteza, mas o que indica hoje é que teremos sim uma inflação mais alta que a expectativa do início de ano, mas ainda assim, desacelerando em relação ao patamar atual que é de 10%.

Mas e os benefícios da alta de commodities para a nossa economia? O Brasil é um importante produtor e exportador de commodities e, em ciclos passados, observamos alguns benefícios. A balança comercial, que teve um superávit de cerca de UUS$56 bilhões em 2021, pode superar US$65 bilhões em 2022, com exportações chegando próximas de US$300 bilhões, cerca de 16% do PIB . Não só temos a previsão de um aumento do volume exportado, da mineração e da produção agrícola, mas também pela melhora nos termos de troca, ou seja, o maior preço dos produtos que exportamos em relação ao que importamos. O Brasil passou a ser exportador líquido de petróleo em 2018, diferentemente do último ciclo de alta do petróleo até 2014. O resultado fiscal também já mostrou benefícios desse ciclo de commodities, com o crescimento inesperado da arrecadação no ano passado, com o aumento do faturamento e lucro das empresas ligadas aos setores produtores. Por fim, a taxa de investimento da economia chegou a 19% do PIB em 2021, beneficiada pela maior demanda por máquinas, equipamentos e infraestrutura relacionadas aos setores.

O cenário ainda é de muita incerteza com eventos de impactos significativos que podem ser duradouros e resultar em uma maior persistência da inflação, mas também trazendo algum crescimento para a economia. É importante ter cautela nesse momento ao fazer projeções, pois movimentos de forte elevação de preços podem se reverter no curto prazo e, no longo prazo, mudar tendências da economia global, incluindo uma eventual recessão. Não descartamos riscos de uma redução da globalização, gerando uma inflação mais alta por mais tempo, ou por outro lado, uma queda na atividade global, reduzindo a demanda e levando a preços de equilíbrio em menor patamar. Entre os países emergentes, o Brasil sai beneficiado por ser importante fornecedor de insumos, e a política de aperto monetário já deve contribuir para conter a onda inflacionária.


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