Os desafios demográficos no Brasil e a reforma tributária
Duas surpresas marcaram o noticiário econômico nas últimas semanas: o crescimento populacional menor, divulgado pelo Censo de 2022, e o avanço da reforma tributária no Congresso. Mas o que esses dois eventos têm em comum?
O IBGE divulgou os dados preliminares do Censo de 2022 e a principal surpresa foi uma população menor que a previamente estimada. Somos 203 milhões e não 215 milhões, como estimado anteriormente, uma diferença de 12 milhões de pessoas, resultado de um crescimento populacional bem abaixo da estimativa usada desde o último censo em 2010. A taxa de crescimento da população hoje está em 0,5% ao ano, a menor desde o início do censo no Brasil. Nas últimas 3 décadas a taxa caiu de maneira acelerada de 1,93% para 0,52% ao ano.
O menor crescimento populacional tem importantes implicações para o desempenho da nossa economia. O baixo crescimento do PIB no Brasil na última década ressaltou a estagnação da produtividade, mas em face dos novos números demográficos, podemos inferir que o menor crescimento populacional também contribuiu de maneira negativa para a baixa expansão econômica. Curiosamente o PIB per capita no Brasil deve ser revisado para cima com a recente divulgação da queda da população.
Olhando para frente, temos uma perspectiva de baixo PIB potencial, considerando a atual taxa de crescimento da população e, para alcançarmos taxas sustentáveis de crescimento da economia acima de 2%, a produtividade precisa voltar a subir. No curto prazo, a melhor oportunidade hoje para aumentar a produtividade da economia é a reforma tributária, que está sendo analisada no Congresso e pode ter o início de sua votação ainda no mês de julho. O Brasil tem um sistema tributário extremamente complexo, o que gera inúmeras distorções que afetam desde a alocação de capital até o tempo e recursos gastos com a apuração dos impostos e disputas jurídicas, com impacto também no planejamento fiscal do governo e na dinâmica da dívida pública.
A proposta de reforma tributária visa criar o IVA dual e unificar 5 impostos, são eles IPI, PIS e Cofins (federais), ICMS, (estadual) e ISS (municipal). Um dos principais avanços é a unificação da legislação e a redução do número de alíquotas que hoje pode ser diferente dependendo até mesmo da embalagem do produto, como no clássico exemplo do sonho de valsa. A complexidade de cálculo atual, 27 diferentes legislações com inúmeras alíquotas e regimes especiais só para o ICMS, geral enorme contencioso tributário, que pode ter significativa redução, como ocorrido com a reforma trabalhista. Outro importante avanço é a maior transparência dos custos tributários. É praticamente impossível saber hoje quanto pagamos de impostos nos produtos e serviços que consumimos. A cumulatividade significa que vários impostos pagos na aquisição de insumos ao longo da cadeia não são compensados, e a tributação final sobre o consumo não é só a aplicada diretamente. Por fim, a guerra fiscal com a negociação de benefícios entre estados é um grave problema para o desenvolvimento da economia. Decisões de alocação de capital são feitas com base em benefícios tributários, e não na busca de maior eficiência produtiva.
O IVA é um imposto único sobre o consumo final e, com a não cumulatividade, vai passar a ser mais transparente para os produtores e consumidores. A carga tributária atualmente no Brasil é bastante elevada, próxima de 34% do PIB segundo o último dado do tesouro, mas impossível distinguir no nível do consumo, o que naturalmente explica o receio do aumento da tributação com a reforma. Uma alíquota direta de 25% sobre um produto pode ser inferior a uma alíquota de 15% hoje, que não compensa impostos pagos ao longo da cadeia entre as diferentes entidades federativas.
Para o PIB voltar a crescer a uma taxa sustentável de 2% ao ano, sem estímulos que vão além da capacidade produtiva e geram inflação, a produtividade precisa aumentar além da taxa de crescimento da população. E uma das maneiras de melhorar a produtividade no Brasil é reduzindo as barreiras e a complexidade nas relações comerciais e produtivas. Segundo estudo do IPEA, a reforma tributária pode significar crescimento de 2,4% até 2032. A exemplo de outras reformas, os ganhos de crescimento setoriais podem se acumular e permitir maior avanço da economia brasileira.