Mercado de trabalho: boa notícia ou fonte de preocupação?
O mercado de trabalho brasileiro vem apresentando forte desempenho desde a recuperação pós pandemia a partir de 2021. A taxa de desemprego que chegou ao pico de 14,9% em setembro de 2020 está hoje em 7,8% e projetamos que deve ter nova queda ao longo de 2024 para 7,2%. O robusto desempenho é disseminado em todos os setores, com destaque para as atividades de serviços, que tiveram crescimento mais expressivo desde o fim da pandemia. A recuperação foi bem mais acelerada do que a expectativa, principalmente acompanhada de uma melhora na qualidade, com o aumento dos empregos formais.
Entre os impactos da melhora no mercado de trabalho, destacamos o crescimento da massa salarial que, em 12 meses, acumula alta de 6,7% acima da inflação, segundo a última divulgação da Pnad de fevereiro de 2024. Esse crescimento é resultado da melhora na renda média e também do recorde no número de pessoas ocupadas no Brasil, que está hoje em 100,3 milhões de pessoas. Um dos efeitos positivos dessa melhora é o crescimento do consumo das famílias, que segue em alta mesmo em meio ao aperto monetário promovido pelo Banco Central. Em 2022, o consumo das famílias cresceu 4,1% e em 2023 desacelerou para 3,1%, mas em ambos superou a taxa de crescimento do PIB.
O comprometimento de renda das famílias chegou a bater recorde em junho de 2023 em 28,4% e hoje já está em 25,8%. Com a queda da taxa de juros e a manutenção do mercado de trabalho no atual patamar, o consumo deve continuar crescendo próximo de 2% ao ano, e o comprometimento de renda pode ter nova queda nos próximos meses, beneficiando também o setor bancário com a esperada queda da inadimplência.
Um dos pontos de atenção do aquecimento do mercado de trabalho é o impacto inflacionário da alta dos salários. Em seu último relatório trimestral de inflação, o BC destaca essa preocupação com o atual nível de emprego no país e a potencial pressão inflacionário nos salários. O rendimento médio efetivo teve alta de 4,5% acima da inflação nos últimos 12 meses, segundo dados da Pnad, mas quando se observa a série mais longa, a taxa de crescimento anual ainda está próxima de 0,8%, o que tende a ser compatível com o ganho de produtividade no período. A principal preocupação no atual cenário é sobre o comportamento daqui em diante. Com reajustes médios próximos de 5%, segundo levantamento da FIPE, o ganho real dos salários deve seguir positivo em 2024, o que pode pressionar a inflação de serviços, considerando a baixa capacidade ociosa da economia.
A melhora no mercado de trabalho é uma boa notícia para a economia, mas o risco de persistência inflacionária dos salários, caso se materialize, pode restringir o afrouxamento monetário em curso pelo Banco Central. Apesar da taxa de juros ainda elevada, o crescimento econômico no 1o trimestre de 2024 aponta para uma taxa mais elevada que o esperado, e a geração de vagas continua forte tanto pelo Caged como pelos dados da Pnad. Caso esse desempenho tenha impacto na inflação mais alta que o esperado, o BC pode reduzir o ritmo de cortes da Selic, em parte já refletido nas taxas de mercado, que projetam Selic em 9,75% no final do ano versus a expectativa do Focus em 9%.