Macroeconomia


Análise | Setor Externo | Fev22

Daniel_Arruda

Daniel Arruda

Publicado 29/abr5 min de leitura

Transações correntes têm déficit de US$ 2,4 bilhões em fevereiro

Resultado surpreendeu a projeção do mercado de déficit de apenas US$ 1,4 bilhão. Apesar disso, o número mostrou uma forte variação em relação aos últimos três meses, quando o déficit médio foi de US$ 6,8 bilhões. Em 12 meses, as transações correntes acumulam resultado negativo de 1,6% do PIB.

Balança comercial teve impacto importante para a redução do déficit em conta corrente

Em fevereiro, o superávit comercial atingiu US$ 3,5 bilhões. Esse número é o maior para o mês desde 2017, e mostrou também uma evolução positiva na comparação aos meses imediatamente anteriores.

As exportações totalizaram US$ 23,7 bilhões, crescendo 43,6% na comparação interanual. De acordo com o Ministério da Economia, essa variável ainda deve evoluir positivamente em março, atingindo leitura próxima a US$ 29,1 bilhões. Essa elevada taxa de crescimento decorre, primeiramente, de um volume exportado maior na agropecuária e na extração de petróleo, compensado parcialmente por uma queda da comercialização de minerais metálicos, e também de um preço internacional de commodities em patamar elevado.

As importações, por outro lado, somaram US$ 20,2 bilhões. Apesar do crescimento nominal ainda expressivo ante o mesmo mês de 2021, o indicador vem mostrando sucessivas retrações na margem. Em particular, o volume importado teve queda pelo terceiro mês consecutivo, e mostra retração interanual de 2,9%. Prospectivamente, a evolução das importações deve seguir em queda, especialmente dado a expectativa de retração da indústria de transformação nesse ano.

Balança de serviços segue aquém do nível de normalidade, mas remessas de renda aumentam

O déficit na balança de serviços atingiu US$ 1,8 bilhão em fevereiro. Esse número se compara a um nível de normalidade próximo de US$ 2,5 bilhões para o mês. As despesas com viagens ainda defasam o patamar pré-pandemia em cerca de US$ 500 milhões, de forma que o déficit em serviços deve sofrer alguma pressão nos próximos meses conforme a mobilidade avança.

A remessa de renda primária, por sua vez, totalizou US$ 4,4 bilhões no mês. Essa leitura decorre principalmente do fluxo associado ao investimento direto, que também teve forte impacto na conta financeira em fevereiro.

Investimento Direto no País (IDP) registra US$ 11,8 bilhões

IDP atingiu o maior valor desde janeiro de 2017, e superou a expectativa de US$ 10 bilhões. O recorte por componentes reforça a possibilidade de um cenário favorável para o investimento de longo prazo no país. Em particular, o ingresso em participação de capital totalizou US$ 8,9 bilhões, concentrado em operações de valor elevado, ao passo que o reinvestimento de dividendos acelerou para US$ 3,9 bilhões. Ambos os resultados representam o maior valor para toda a série histórica em meses de fevereiro.

Investimento em carteira teve entrada de US$ 2,2 bilhões em fevereiro. No mercado doméstico de ações, observou-se otimismo do investidor estrangeiro, que trouxe US$ 5,0 bilhões ao longo do mês. Esse movimento provavelmente se manteve em março, mas deve ter alguma reversão em abril, de acordo com dados da B3, com impacto para os preços dos ativos. Os títulos da dívida, por outro lado, observaram saída de US$ 2,7 bilhões em fevereiro, mas esse fluxo deve se reverter nos próximos meses, dado o diferencial de juros ainda bastante elevado.

Transações correntes podem ter superávit no ano pela primeira vez desde 2007

Projeções do Banco Central apontam para transações correntes de US$ 5,0 bilhões em 2022. Número representa melhora significativa em relação à projeção anterior, de déficit de US$ 21 bilhões.

Essa melhora pode ser atribuída à projeção de superávit na balança comercial de US$ 83,0 bilhões no ano, ante US$ 52,0 bilhões no último relatório. As exportações devem ser beneficiadas pelo novo patamar de preço das commodities, em especial de petróleo e grãos, o que justifica o saldo elevado na balança comercial. No entanto, os volumes exportados devem desacelerar na margem, tendo em vista as expectativas marginalmente piores para a soja e para a indústria extrativa. Já as importações devem ter avanço mais moderado, refletindo os preços mais altos de combustíveis e fertilizantes, mas compensadas pela redução dos volumes atrelada à retração esperada para a indústria de transformação doméstica.

Na balança de serviços, o Banco Central mantém projeção de déficit de US$ 26,0 bilhões. Número supera uma média de US$ 19 bilhões nos dois últimos anos, mas segue aquém da leitura de US$ 35,5 bilhões em 2019, em função do turismo internacional deprimido. A projeção de remessa de renda também se elevou para US$ 56 bilhões. Essa alta, por sua vez, é explicada pelo maior pagamento de lucros e dividendos para não residentes, principalmente pelas empresas beneficiada pelo preço mais elevado das commodities.

Na conta financeira, as expectativas para investimento direto no país (IDP) e em carteira (IC) foram mantidas em relação ao último relatório. Espera-se US$ 55,0 bilhões para o IDP, acima da média de US$ 42,1 bilhões nos dois últimos anos. Nesse ponto, vale citar os dados parciais melhores divulgados até agora: o primeiro bimestre trouxe IDP acumulado de US$ 16,5 bilhões. Extrapolando o crescimento observado, chega-se a um IDP de US$ 62,5 bilhões no ano, reforçando o cenário de melhora do investimento projetado pelo Banco Central.

Já no IC, a autoridade projeta entrada de US$ 11,0 bilhões, pouco acima da média de US$ 9,5 bilhões de 2020 e 2021. Por um lado, os dados parciais tem surpreendido positivamente, o que pode estar relacionado à busca por alternativas de investimento, com a guerra na Ucrânia, e aos elevados juros domésticos. No entanto, há bastante incerteza sobre o impacto da contração monetária nos países desenvolvidos e da desaceleração do PIB chinês nos fluxos para países emergentes, o que provavelmente justifica as projeções mais parcimoniosas do Banco Central.

O que esperar para a taxa de câmbio no médio prazo?

Em abril, o câmbio teve desvalorização de 4%, revertendo parte da apreciação do primeiro trimestre. Esse movimento, ao contrário do que vinha sendo observado anteriormente, possui determinantes globais. Em especial, a perda de valor da moeda doméstica foi observada também em outros emergentes, como Chile, Turquia e Colômbia.

Qual o determinante por trás dessa queda das moedas emergentes? Diversos fatores de risco global se intensificaram nas últimas semanas, fortalecendo o dólar. Em especial, espera-se que o Banco Central americano acelere o ritmo de alta da taxa de juros, enquanto a economia chinesa mostra sinais de fraqueza. Com isso, ganha materialidade um cenário de queda do preço das commodities nos próximos meses, o que tende a prejudicar países emergentes.

A moeda brasileira pode ter desempenho relativamente mais positivo, na comparação aos demais emergentes. Isso ocorre, em primeiro lugar, em função do câmbio real efetivo doméstico ainda estar em patamar mais elevado, devido ao impacto da pandemia nas finanças do governo. Não obstante, com a melhora recente do quadro fiscal, esse fator pode ter seu impacto reduzido no risco país. Dessa forma, ganha relevância o cenário otimista para o balanço de pagamentos, com transações correntes possivelmente superavitárias e elevadas reservas internacionais, além da perspectiva marginalmente melhor para o crescimento econômico, juntamente com taxas de juros mais elevadas, possibilitando nova apreciação da moeda doméstica no médio prazo.

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