Transações correntes foram deficitárias em US$9,0 bilhões em dezembro
Transações correntes foram deficitárias em US$9,0 bilhões em dezembro, ante expectativa de um déficit de US$12,8 bilhões. No acumulado dos últimos doze meses, o déficit foi de US$56,0 bilhões, ou 2,5% do PIB. O resultado em dezembro foi fruto do recuo de US$4,3 bilhões no saldo comercial, e do aumento em US$1 bilhão no déficit de serviços, que foram compensados com melhora conjunta de US$1,5 bilhão no saldo de renda primária e de US$360 milhões no saldo de renda secundária.

Investimento Direto no País (IDP) teve ingresso líquido de US$ 2,8 bilhões
O IDP em dezembro foi de US$2,8 bilhões, ante expectativa de saídas líquidas de US$2,0 bilhões. Nesse mês, houve ingresso líquido de US$4,8 bilhões em participação no capital e saídas de US$2 bilhões em operações intercompanhia. No acumulado de 12 meses, o IDP totalizou US$71,1 bilhões, o que corresponde a 3,2% do PIB. A despeito da aversão ao risco manifestada nos ativos financeiros, o investimento direto segue robusto e suficientemente grande para cobrir o déficit nas transações correntes e na conta capital.

Balança comercial
Em dezembro, a balança comercial registrou superávit de US$4,8 bilhões, contrastando com os US$9,3 bilhões atingidos no mesmo mês do ano anterior e acumulando saldo de US$74,6 bilhões nos últimos 12 meses conforme dados da Secex. A internalização de divisas por motivo comercial atingiu US$2,3 bilhões em dezembro e US$69,0 bilhões no acumulado de 12 meses, mantendo o ritmo de reduções na margem que tem ocorrido nos últimos meses em seguimento à deterioração da balança comercial.


As exportações variaram -13,5% frente a dezembro de 2023, com reduções difusas nos volumes exportados entre todas as categorias de bens, ressaltando-se a queda nos valores exportados de petróleo, café, açúcar e milho como decorrência da quebra de safra e no impacto defasado do arrefecimento no preço dos combustíveis internacionalmente.

As importações variaram 3,3% frente a dezembro de 2023, continuando o ritmo de enfraquecimento observado nos dois meses anteriores, com a leitura qualitativa indicando que a queda está motivada por menores volumes importados de insumos para a construção e indústria, e ressurgimento de demanda para automóveis, combustíveis e fertilizantes.

Em termos gerais, a conjuntura indica um saldo comercial que é continua menos robusto do que anteriormente por conta de um ritmo de importações mais robusto dada a economia aquecida, pressionando por consequência o saldo de transações correntes e a internalização de dólares no sistema financeiro do país, impulsionando enfraquecimento na taxa efetiva real do câmbio brasileiro.
Porém, enfatizamos que a tendência é de reequilíbrio: a conjunção dos efeitos de câmbio depreciado, recuperação das quebras de safra e impactos contracionistas da política monetária deve ampliar o saldo de exportações líquidas ao longo dos próximos vários trimestres. Adicionamos ainda que o impacto da balança menos robusta não é diretamente proporcional na internalização de dólares daqui para a frente, pois notamos um volume considerável de divisas que foram retidas no exterior ao longo dos últimos anos e que podem ser repatriadas num ritmo ainda robusto, com a mitigação da incerteza fiscal auxiliando este processo.
Cripto e serviços
A conta capital, substancialmente composta por transações de criptomoedas, atingiu um déficit de US$1,3 bilhão em dezembro, frente a US$1,3 bilhão em dezembro de 2023 e acumulando US$16,3 bilhões nos últimos doze meses, ou 0,74% do PIB. Notamos estabilização no fluxo de saídas, apesar da recente onda de popularização das criptomoedas em meio ao bom momento de mercado.
Como anteriormente notado, isso ocorre pois boa parte do fluxo de saídas de criptomoedas está atrelado a moedas com vínculo transacional (stablecoins) e não especulativo. Porém, o fluxo especulativo segue sendo importante, podendo aparecer nas próximas divulgações via ampliação de déficit na conta de capital, e nos atentamos à possibilidade da nova popularização de criptomoedas incentivar maior conhecimento sobre as stablecoins como método de enviar dólares ao exterior.

No saldo de serviços, que foi deficitário em US$4,6 bilhões neste dezembro contra US$3,6 bilhões do mesmo mês no ano anterior, notamos nova deterioração no déficit de serviços associados com a demanda das firmas, em meio à forte atividade econômica centrada em ramos como informação e comunicação que demandam gastos com propriedade intelectual estrangeira, além da construção e indústria de transformação que dependem do aluguel de equipamentos.
Em contrapartida, os serviços associados com a demanda das famílias se situam estáveis, frente à menor demanda por viagens no exterior com o câmbio depreciado e ao maior controle com os gastos em bets após campanhas de desincentivo promovidas pelo governo federal.


Por que as contas externas pioraram em 2024?
Apesar do balanço de pagamentos do Brasil ainda se situar num patamar equilibrado, o ano passado foi marcado por uma deterioração moderada no déficit em transações correntes e conta capital, que auxiliaram parcialmente no maior volume de saída de dólares percebidos ao longo do ano e acabou contribuindo para uma desvalorização acentuada do câmbio.
O ano de 2024 foi marcado por um fluxo intensificado de itens não-tradicionais, como bets, pequenas importações e criptomoedas, sendo a última reclassificada das transações correntes para a conta capital em meados do ano passado por aperfeiçoamento dos critérios contábeis. Porém, o saldo comercial continua sendo o principal determinante das contas externas, que tem retraído após um pico de cerca de US$100 bilhões.

Apesar da queda das commodities ter gerado quebra de tendência no aumento das exportações, houve uma redução ainda maior nos preços de bens importados, de tal forma que os termos de troca apresentaram evolução ligeiramente positiva em 2024 e num ritmo melhor que o de 2023. O verdadeiro “culpado” pela redução do saldo é a maior quantidade de bens importados, que cresceu cerca de 22% desde o final de 2023 após relativa estabilidade no pós-pandemia, em conjunto com ligeira queda no volume exportado como decorrência das dificuldades climáticas e uma economia chinesa com menor apetite para matérias primas.


O aumento das importações, por sua vez, está diretamente relacionado ao maior vigor da economia brasileira em 2024, cujo PIB deve crescer 3,4% num resultado parcialmente gerado pelo impulso fiscal promovido pelo governo federal, que gerou fortes resultados no consumo das famílias e, como efeito de segunda ordem, maior demanda por construção residencial e automóveis, setores que importam desproporcionalmente mais bens de capital estrangeiro do que os demais. Por fim, isso alimenta preocupações associadas à discussão dos déficits gêmeos, onde uma grande necessidade de financiamento público promove uma maior necessidade de financiamento externo, numa conjuntura que ameaça a estabilidade do balanço de pagamentos futuramente – e, por consequente, o câmbio e a inflação – caso medidas de aperto fiscal não sejam tomadas no âmbito de um hiato do produto positivo e historicamente alto.
