IPCA surpreende em dezembro e encerra 2022 com alta de 5,79%
O IPCA de dezembro registrou alta de 0,62%, acima da nossa expectativa de 0,45%. O resultado mostrou uma aceleração frente a novembro, quando a inflação foi de 0,41%. As principais contribuições no mês vieram dos grupos de Saúde e cuidados pessoais e Alimentação e bebidas, que juntos responderam por 56% da inflação observada. O resultado do mês surpreendeu negativamente, destoando da tendência de queda dos últimos meses, mostrando que o trabalho de controle da inflação não está pronto. Assim, a política fiscal será um fator importante para a dinâmica inflacionária de 2023. Com esse resultado, a inflação de 2022 foi de 5,79%. É o segundo ano consecutivo em que a inflação estoura o teto da meta do banco central, e devemos ter um terceiro ano, até que a inflação volte à meta, somente em 2024.
Média dos núcleos tem forte aceleração em dezembro
As medidas de núcleos tiveram variação média de 0,66% em dezembro, apresentando forte aceleração em relação a novembro, quando a variação foi de 0,31%. Assim, nota-se uma pausa na tendência de queda observada nos últimos meses, com a média móvel dos últimos três meses voltando a acelerar. Após o resultado mais ameno de novembro, impactado pela atividade mais fraca da Black Friday, em dezembro voltamos a ver recuperação de preços mais generalizada entre bens e serviços.
A inflação de serviços voltou a subir em dezembro
Após apresentar alta de 0,13% em novembro, serviços teve alta de 0,44% em dezembro. Mais uma vez, passagens aéreas foram bastante influentes. Após recuar 9,80% em novembro, as passagens aumentaram 0,89%. Entretanto, mesmo quando retiramos as passagens do cálculo, observa-se aceleração da inflação do setor, de 0,35% para 0,43%. Apesar disso, observamos que a dinâmica atual ainda é de desaceleração e a variação de serviços encerrou o ano com alta de 7,58%, abaixo dos 7,95% observado em novembro.
Vestuário acelera em dezembro e tem alta de 1,52%
É o quinto mês consecutivo que a inflação do Vestuário fica acima de 1%. Dos 12 meses do ano, em 10 a inflação do grupo foi acima de 1%. O resultado do mês foi reflexo da alta no item roupas femininas, que teve a maior variação (2,10%) e o maior impacto (0,03 p.p.) entre os itens pesquisados. Por fim, outro destaque negativo foi o aumento na difusão, que voltou ao patamar de 69%, após alcançar 58% em novembro.
O destaque positivo ficou por conta do grupo de Transportes, que apresentou forte desinflação. Após alta de 0,83% em novembro, o grupo avançou 0,21% em dezembro. Resultado foi influenciado pela queda nos preços da gasolina, que recuaram 1,04%, movimento que também foi observado em outros combustíveis, com exceção do etanol.
Apesar da forte desinflação, resultado de 2022 ficou acima das expectativas
Em 2022, o IPCA registrou alta de 5,79%.
Resultado ficou abaixo dos 10,06% registrados em 2021, mas acima da expectativa de 5,03% do início do ano. No resultado anual, os grupos de Alimentação e bebidas e Saúde e cuidados pessoais responderam por 66% da inflação observada. Por outro lado, os grandes vilões de 2021, Habitação e Transporte, não foram problema. O grupo de Habitação ficou próximo da estabilidade, com alta de 0,07% após o fim da crise hídrica e subsequente normalização tarifária. Já o grupo de Transportes teve a maior queda (-1,29%) e o maior impacto negativo (-0,28 p.p) sobre o índice cheio em 2022, fruto da redução dos impostos sobre os combustíveis e acomodação dos preços do petróleo na segunda metade do ano.
A alta de 11,64% do grupo Alimentação e bebidas foi puxada pela alimentação no domicílio, que registrou alta de 13,23%
Por sua vez, esse subgrupo foi puxado pela cebola, que registrou alta de 130,14%, a maior alta entre os 377 subitens que compõem o IPCA. Em Saúde e cuidados pessoais, a maior contribuição veio dos itens de higiene pessoal, que registrou alta de 16,69%. Por outro lado, plano de saúde registrou alta de 6,90%, indicando que o resultado do grupo é mais devido à inflação de bens do que de serviços.
Vestuário foi o grupo com a maior variação em 2022. O desempenho desse grupo foi bastante atípico em 2022, registrando altas acima de 1% em 10 dos 12 meses do ano, consolidando uma variação de 18%. O desempenho do grupo foi afetado pela alta acentuada no preço do algodão entre abril de 2020 e maio de 2022. Além disso, com a reabertura da economia pós-pandemia, houve retomada da demanda, pressionando os preços.
Expectativa para os próximos meses
O repique em dezembro nos lembra que o trabalho de conter a inflação ainda não terminou. Apesar da forte desinflação observada no segundo semestre de 2022, ainda há um longo caminho até a inflação retornar à meta. O resultado de dezembro surpreendeu justamente porque foi concentrado na inflação de bens, que mostrava uma dinâmica mais benigna. Muito provavelmente foi fruto da sazonalidade do fim de ano, mas as fortes chuvas observadas nas últimas semanas podem adicionar força à tendência de alta de preços, particularmente de alimentos em domicílio.
Já são dois anos consecutivos de inflação acima do teto da meta e devemos ter mais um ano nessas condições, com expectativa de queda mais lenta da inflação em 2023, para próximo de 5,2% no ano. Isso torna a discussão sobre a política fiscal ainda mais importante. Caso o governo federal enverede pelo caminho da irresponsabilidade fiscal, podemos voltar a observar elevação de preços. Com inflação persistente por mais tempo, a credibilidade da política monetária diminui, dificultando a ancoragem das expectativas. Portanto, com a política fiscal expansionista, principalmente em momento de baixa capacidade ociosa da economia e mercado de trabalho próximo do pleno emprego, podemos cair em um ciclo negativo de aumento de gastos públicos, inflação pressionada e juros elevados por um período prolongado, prejudicial para o crescimento e, consequentemente, para as contas públicas. Por outro lado, caso o governo busque a alternativa do ajuste fiscal, seja pelo menor crescimento dos gastos ou pela recomposição da arrecadação, a sinalização positiva pode potencializar o trabalho da política monetária, resultando em um processo de desinflação mais consistente e abrindo espaço para queda dos juros mais rapidamente que o precificado pelo mercado hoje.