Inflação limita repasse e custos pressionam margens
A temporada de balanços do 1T22 deve mostrar mais claramente os desafios enfrentados pelas companhias em um cenário de crescentes pressões de inflação e custos. Já vemos, no geral, receitas moderadas, seja por desaceleração em vendas, seja por incapacidade de repasse e implementação de preços, o que, em cenário de custos mais elevados, acaba corroendo parte das margens das companhias. Apesar da visão negativa para o trimestre, alguns setores podem surpreender, com base no desempenho dos dados de atividades observados no período. Em conversas com as empresas, observamos um discurso com um tom menos pessimista na crença de que daqui para frente, os resultados devem seguir evoluindo gradualmente, fazendo com que o primeiro trimestre seja o pior de 2022.
No campo macroeconômico, o primeiro trimestre do ano deve trazer crescimento para a atividade econômica um pouco maior que o esperado, dadas as surpresas positivas especialmente no varejo e na indústria. Apesar disso, a perspectiva para o ano ainda é de crescimento baixo, dado o comprometimento da demanda com a massa salarial real em queda e o crédito restrito. O cenário de inflação continua sendo o maior desafio para a conjuntura doméstica. O IPCA acumulou 11,3% nos 12 meses até março, com o impacto da guerra sobre combustíveis e alimentos mas também com o avanço persistente da inflação de serviços subjacentes. Nesse cenário, o Banco Central elevou a Selic para 11,75%, e sinalizou uma alta adicional na próxima reunião, apontando para um juro real bastante contracionista nos próximos meses. No cenário externo, alguns riscos para o desempenho da economia brasileira ganharam materialidade. Primeiramente, a inflação americana teve novas altas e forçou o FOMC a elevar a taxa de juros para a faixa entre 0,25% e 0,5%, além de sinalizar a redução do seu balanço nos próximos meses, o que pode impactar os preços de ativos em países emergentes. Adicionalmente, dados de alta frequência mostram forte desaceleração da atividade na China, em função da pandemia e dos problemas no setor imobiliário, o que também pode impactar a demanda externa e o resultado da balança comercial brasileira.
Bancos
O 1T22 para o setor pode trazer um protagonismo maior nas margens financeiras (NII) dos bancos, isso porque os maiores spreads devem compensar a desaceleração no volume de crédito. Por outro lado, os olhos estão voltados ao aumento da inadimplência no segmento PF, que já mostrava deterioração e retorno a patamares normalizados desde dezembro. Esperamos uma consolidação da recuperação dos resultados com serviços, principalmente nas linhas de cartões e seguros vindo da retomada das atividades e da redução da sinistralidade em ramos de cobertura pessoal e melhores resultados financeiros com a alta dos juros. Seguimos ainda observando pressão negativa nas receitas com tarifas de conta corrente por conta do crescimento do Pix e da competitividade no setor. Outra pressão negativa vem da alta inflação e dos reajustes salariais ocorridos no ano passado que devem pressionar os custos. Destacamos os resultados do Banco do Brasil, que devem continuar com bom controle nas despesas operacionais, menor inadimplência devido a sua carteira de crédito mais defensiva que os pares e superávits da Previ que devem continuar contribuindo com o resultado. (Matheus Amaral, especialista de Bancos e Serviços Financeiros)
Construção
Diante das prévias operacionais divulgadas pelas as construtoras, esperamos que o segmento tenha novamente um desempenho misto, a depender de cada extrato de renda e região. Apesar da desaceleração observada no volume de lançamentos, em especial nos segmentos cujas margens são mais apertadas e requerem maior cautela diante da escalada dos insumos, o setor de construção manteve uma resiliência geral nas vendas líquidas, em volume superior às nossas expectativas. No P&L, projetamos às construtoras margens operacionais marginalmente mais deterioradas, em decorrências dos maiores custos de construção a serem reconhecidos no exercício. Para o 1T22, as construtoras também devem apresentar maior deterioração nas despesas financeiras que, apesar da tradicional eficiência nas linhas SG&A e ritmo satisfatório de avanço nas obras, poderão trazer queda marginal no resultado líquido. (Gustavo Caetano, especialista em Construção)
Elétricas e Saneamento
As expectativas de resultado das companhias elétricas para o 1T22, de uma forma geral, são positivas. Após um volumoso período de chuvas iniciado ao final do ano passado, o SIN percorreu o primeiro trimestre do ano com um volume útil consolidado superior à média dos últimos 5 anos, sendo um sinal positivo para as companhias do segmento de geração. Essa melhoria de cenário favorece a geração hídrica, além de reduzir os custos adicionais de despache térmico, observados em 2021, o que pode proporcionar às companhias um ganho significativo de margem operacional. Com forte presença de ativos hídricos, esperamos um destaque positivo para as geradoras ENGIE (EGIE3) e AES Brasil (AESB3). No segmento de distribuição, o cenário também é favorável. Impulsionados por crescimento econômico, principalmente através dos setores comercial e industrial, em conjunto com o aumento de temperaturas registrado nos meses de janeiro e fevereiro, pôde ser observado um aumento no consumo total de energia, o que pode refletir em bons resultados para as suas companhias. Já em relação as companhias de transmissão, as perspectivas são neutras. Movimentações mais significativas podem ser esperadas a partir do segundo semestre do ano, após o leilão de transmissão que será realizado pela ANEEL, no mês de junho. (Rafael Winalda, especialista de Utilities)
Frigoríficos
Para o 1T22, continuamos com uma perspectiva otimista para o setor de frigoríficos, principalmente para as companhias que atuam com proteína bovina, tendo em vista (i) a forte demanda dos Estados Unidos, (ii) volta da comercialização com a China e (iii) preços ainda atrativos no mercado externo. No caso do Brasil, vimos dados de exportação atípicos para o período sazonal, com forte avanço, em razão aos estímulos chineses após embargos prolongados no final de 2021, assim como forte procura dos Estados Unidos, o que favorece as atividades da Minerva e demais exportadoras. Além disso, o preço do Indicador do Boi Gordo pela Cepea se manteve em um patamar elevado, com um crescimento médio de 15,1% t/t, o que vem a beneficiar o setor por um lado. No entanto, valorização do real se torna um empecilho para comercialização e rentabilidade das operações, além dos desafios com a dificuldade de repasse de custos, fatores que já serão sentidos no 1T. Para os EUA, o consumo continua aquecido mesmo em período sazonal mais fraco, com preços também positivos, o que deve contribuir para a performance das companhias, trazendo no comparativo anual resultados superiores aos vistos no 1T21. Já para as margens, custos no Brasil continuarão interferindo nos resultados, principalmente para empresas como BRF e Seara, que sofrem diretamente com alta dos grãos e dificuldade de repasse de preços no mercado doméstico. Para os EUA, esperamos uma pressão levemente superior ao visto no 4T, contudo ainda em um patamar maior do que o histórico, o que tende a trazer resultados ainda robustos a/a para companhias como JBS e Marfrig. (Gabriela Joubert, especialista em Frigoríficos)
Locadoras
No 1T22, as locadoras de veículos leves devem continuar apresentando ótimos resultados operacionais, com elevação de receita e margens superando os maiores custos com depreciação. Todavia, esperamos que o aumento da despesa com serviço da dívida contribua com efeitos mais tímidos nos lucros e as companhias apresentem números finais próximos da estabilidade. No segmento de Rent-a-Car, as taxas de ocupação e o preço das diárias devem permanecer altos, reflexo da aquecida demanda e em linha com o 4T21. Já para o GTF (Gestão e Terceirização de Frotas), esperamos ver continuidade do crescimento de volume. Ao mesmo tempo em que os tickets médios se elevam com os novos contratos, que passam a refletir maior investimento necessário para aquisição de frota. Adicionalmente, em Seminovos, a expectativa é que o preço médio dos veículos vendidos continue avançando, em razão do mix e do cenário ainda não normalizado de escassez de carros. Enquanto isso, a renovação de frota, totalmente depreciada por veículos novos e mais caros, deve incrementar os custos com depreciação, arrefecendo assim os efeitos do aumento de receita. Por fim, o ciclo de alta da taxa básica de juros ampliará o custo da dívida, de forma que devemos ver nos bottom lines números parecidos com os do último trimestre. (Diego Bellico, especialista em Transporte e Logística)
Papel e Celulose
Embora tenhamos vistos elevação dos preços de celulose no trimestre em razão dos consecutivos aumentos anunciados pelos fabricantes desde dezembro, as receitas de celulose deverão ser limitadas pelos efeitos negativos da guerra na Ucrânia no transporte marítimo internacional, bem como restrições logísticas diversas que limitaram os embarques no período. Com isso, podemos ver preços realizados impactados por preços ainda defasados. Outro limitador, a valorização do real também deve minimizar os avanços de receitas. Nos custos, químicos e combustíveis devem pesar, pressionando margens. No segmento de papel, contudo, devemos ver ainda receitas em ascensão, especialmente para embalagens, com demanda ainda aquecida por conta do setor de Alimentos e Bebidas, grande consumidor. Já para caixas de papelão ondulado, dados da Empapel mostraram queda de 6% na expedição de caixas no 1T22 ante o 1T21, o que deve ser também observado nos resultados das companhias. Mesmo com primeiro trimestre ainda pressionado, as perspectivas seguem positivas para o restante do ano. (Gabriela Joubert, especialista de Papel & Celulose)
Saúde
As empresas do setor de saúde performaram razoavelmente bem em 2021, com o 1S21 positivo e o 2S21 estável. O fluxo de pessoas em hospitais, laboratórios, clínicas e farmácias vem crescendo desde o segundo semestre de 2020, fruto da retomada dos procedimentos eletivos e demanda reprimida de exames que foram adiados devido à pandemia. Isso fez a receita atingir patamares elevados, entretanto, os custos e despesas também tiveram um aumento relevante em todos os segmentos, impactados pelo aumento do preço dos insumos em toda a cadeia. Esperamos que essa tendência de faturamentos altos acompanhados de gastos também altos se estenda para o 1T22. Apesar do surto de Covid-19 (variante Ômicron) e Influenza (H3N2) no início do ano, a expectativa é de que não haja grandes mudanças estruturais para as empresas, dado que esta foi uma onda muito mais branda (e com uma janela temporal também pequena). Mesmo com o alto número de infecções e atendimentos em prontos-socorros, a conversão em internações foi bastante modesta. (Breno de Paula, especialista de Saúde)
Seguradoras
O 1T22 para as seguradoras deve trazer um bom desempenho comercial, isso porque os últimos dados do setor de jan-fev mostraram forte desempenho nos principais ramos como Automotivo e Vida, além do Rural também continuar com forte demanda. Por outro lado, as despesas com sinistros passam por um momento misto, a volta da mobilidade e a alta inflação trouxe uma sinistralidade acima de patamares normalizados no ramo auto, o período de secas até o início do ano ainda traz efeitos nas safras, que tem refletido em uma elevada sinistralidade no ramo rural. Por outro lado, os ramos de cobertura pessoal mostram redução da sinistralidade e deve trazer patamares normalizados no 1T22, compensado as perdas em outros ramos. No lado não operacional das seguradoras, os resultados financeiros devem continuar apresentando recuperação com a alta da taxa de juros no mercado, o que pode trazer algum alívio frente à pressão nas margens operacionais. Com isto, esperamos que seguradoras como a Porto, possam ainda enfrentar desafios nas margens operacionais devido a alta sinistralidade no ramo auto, seu principal segmento. Destacamos a BB Seguridade, que deve colher frutos de um bom momento comercial do setor, mas com alguma pressão na sinistralidade vindo do rural, mas devido sua atuação relevante em ramos de vida, esse os efeitos podem ser compensados. Também esperamos melhores resultados na Brasilprev vindo de um resultado financeiro que, neste trimestre, deve continuar contribuindo positivamente. A Resseguradora IRB, pode continuar trazendo efeitos da sua reestruturação, observando um crescimento em prêmios no Brasil e redução no exterior. Já a sinistralidade, ainda deve sentir os efeitos da calda de contratos em run-off, que apesar de manter a tendência de queda, devem continuar pressionando o resultado. (Matheus Amaral, especialista de Seguradoras)
Shoppings
Conforme observado nas prévias e dados setoriais sobre venda e mobilidade, esperamos que o segmento de shoppings reporte, no geral, novo crescimento nominal nas vendas, bem como uma retirada mais acentuada de descontos nos aluguéis. Enquanto as receitas de estacionamento ainda devem estar nominalmente abaixo do observado em 2019, a linha de locação deve seguir com crescimento robusto no 1T22. Beneficiada pela recuperação na mobilidade ainda em curso, esperamos que o segmento de shoppings mantenha desempenho superior ao varejo nas vendas. Por outro lado, as administradoras devem registrar queda sazonal na ocupação e aumento na inadimplência, indicador que deve permanecer pressionado em virtude da retirada dos descontos. Dessa maneira, a margem operacional das companhias deve se manter levemente pressionada no primeiro trimestre do ano, em conjunto com uma maior deterioração projetada no desempenho financeiro. (Gustavo Caetano, especialista em Shoppings)
Siderurgia e Mineração
Contrariamente à visão mais otimista que tínhamos para o início do ano, o 1T22 deve trazerdesempenhosimilaraoobservadono4T21noquesito receitas, bem como custos ainda elevados, como efeito da alta dos preços das commodities. As margens, por sua vez, devem vir mais pressionadas, no geral, tanto na mineração quanto na siderurgia. Especificamente para a Mineração, os volumes de produção e vendas devem ser afetados pelas paradas na produção observadas no início do ano, em razão das fortes chuvas na região de Minas Gerais, que também devem impactar negativamente os custos fixos, com menor diluição no período, pressionando resultados. Na siderurgia, devemos ver volumes em linha com o 4T21, também em razão da sazonalidade mais fraca do período. Porém, diferentemente do que vimos no trimestre anterior, devemos ver preços médios no mercado interno arrefecendo, reflexo dos descontos aplicados, principalmente na distribuição. Uma vez mais, os custos dos insumos devem impactar os resultados, especialmente carvão e minério de ferro, e combustíveis, direta e indiretamente. A inflação também segue impulsionando as despesas das empresas. Assim, esperamos um trimestre levemente abaixo do 4T21, principalmente em razão da contração de margens esperada e os desafios ainda em curso em cenário de grandes incertezas (veja aqui nossas projeções). (Gabriela Joubert, especialista de Siderurgia & Mineração)
Tecnologia
Em continuidade ao 4T21 esperamos resultados sólidos para as empresas de tecnologia, comandado pela forte recorrência de receitas (97% e 98% para Sinqia e Totvs, respectivamente) e o forte pricing power das companhias frente ao repasse dos custos atrelados à inflação. Em linha com tendências globais pós-pandemia, acompanhamos o crescimento do mercado brasileiro de tecnologia, especificamente os setores de atuação das Companhias. Projetamos resultados positivos para ambas as empresas, entretanto consideramos que o processo de integração dos M&A’s realizados ao longo do ano de 2021 ainda deve mascarar o completo potencial de redução de custos operacionais e otimização de margens. (Breno de Paula, especialista de Tecnologia)
Varejo e Consumo
Mais uma vez, esperamos uma dinâmica mista para o setor nesse 1T22. A incerteza do cenário macroeconômico e a persistente inflação continuam impactando negativamente a confiança do consumidor, que apresentou em março seu segundo trimestre consecutivo de queda. Com a escalada dos preços afetando significativamente o poder de compra das pessoas, o cenário de corte no consumo tem se tornado evidente. No varejo alimentar, segmento que demonstra resiliência e proteção contra a inflação, destacamos os desempenhos de Assaí e Carrefour, players com atuação no atacarejo. Além disso, Carrefour aproveita um trimestre de atuação solo no conceito de hipermercados, com o fechamento das lojas do Extra. Para o ecommerce, segmento mais sensível à piora econômica, o destaque fica com Americanas. A companhia tem menor exposição à linha branca e móveis, além disso, é o player com menor ticket médio. A data comemorativa da Páscoa também se torna um importante evento, dada a maior oferta da empresa em chocolates e doces. Por fim, o segmento discricionário, também muito exposto aos dados macro, deve apresentar resultados mistos. Acreditamos nas companhias voltadas às classes A e B, pelo menor impacto da elevação de preços na renda pessoal. Com isso, Vivara e Grupo SBF seguem como nossa preferência. Para ambas, destacamos ainda o plano de crescimento orgânico bem estruturado, que se torna um vetor significativo para o ganho de market share. Já as companhias voltadas ao público de baixa/média renda devem apresentar obstáculos, dada a repressão de gastos das famílias. (Breno de Paula, especialista de Varejo e Consumo)