O Bear market está aí. E agora?
Ontem, dando continuidade à aversão ao risco que vem tomando os mercados desde o fim do primeiro trimestre do ano, confirmada após dados do payroll norte-americano mais fortes que o esperado e potencializada na semana passada com o CPI acima do projetado, o S&P500 entrou oficialmente em Bear Market, acumulando queda de mais de 20% desde seu último pico.
Contudo, em tempos de queda generalizada nos preços dos ativos, surgem os questionamentos se seria hora do famoso “buy the dip” (ou: comprar no fundo). Apesar da forte queda nos P/L relativos, em nossa opinião, mais que aproveitar a pechincha, pode ser que ainda não estejamos de fato na hora da xepa. Quando olhamos os preços projetados dos ativos, ou seja, os valuations, vemos ainda projeções bastante elevadas. A última grande revisão de preços aconteceu ao longo da temporada do 1T22. Embora recente, nos últimos dois meses houve mudanças significativas em termos de projeções de taxas de juros (lembramos que recentemente vimos elevação de juros em economias que mantinham uma política acomodatícia há décadas), índices inflacionários e projeção de desaceleração global. Muitas destas mudanças de fundamentos podem ainda não estar precificadas nestes valuations, que deverão ser atualizados nas primeiras semanas de julho, quando se divulgam relatórios de prévias de balanços.
Nesse sentido, o investidor estará atento a estas revisões em buscas de ajustes de projeções feitos por fatores conjunturais ou por mudanças significativas de fundamentos específicos da companhia ou setor em questão.
Na última sexta-feira, o CPI nos Estados Unidos mostrou avanço de 1%, ante expectativa de +0,7%. Mas, o “feito” não foi exclusividade dos norte-americanos. Tanto na Europa quanto no Reino Unido, dados de inflação ao consumidor também operam próximo às máximas. Há algumas semanas, vimos o Banco Central da Inglaterra assumir que agiram tardiamente no que tange sua política monetária contracionista. De mesma maneira, apesar de não explicitar, o Banco Central Europeu foi questionado sobre a demora em agir, principalmente em virtude da situação ainda mais delicada na região em virtude da guerra na Ucrânia. Assim, o FED, e demais bancos centrais, deparam-se com uma situação ainda mais desafiadora para conter uma inflação que não dá sinais de melhora, ao mesmo tempo em que lidam com projeções cada vez mais contundentes de desaceleração global.
Américas
O foco das discussões nos Estados Unidos foi pautado pelo CPI acima do esperado divulgado na sexta-feira que, juntamente com o início do aperto monetário na União Europeia (mais detalhes na seção Europa), contribuíram para elevar o sentimento de aversão ao risco global, levando os índices a quedas significativas no último pregão da semana. O índice de preços ao consumidor teve expansão de 1%, ante uma expectativa de 0,7% do consenso, bem acima dos 0,3% registrados em abril. As commodities voltam a pressionar inflação ao consumido com o grupo de alimentos em domicílio avançando 1,4%, na série com ajuste sazonal e os preços de energia em forte alta de 3,9%, com a gasolina subindo 4,1% (+48,7% em 12 meses) – leia relatório especial divulgado pelo time de macro. Esta semana, os mercados deram continuidade ao movimento baixista observado na última semana e ontem o S&P500 confirmou o bear market. Não apenas isso, mas a queda de mais de 3% em um dia, confirmou a precificação dos mercados de uma elevação de 75 bps na taxa de juros norte-americanas a ser anunciada na reunião do FOMC esta quarta. Qualquer número diferente disso poderá ser considerado uma surpresa e, caso o FED opte por manter o plano inicial dos 50 bps, poderíamos ver espaço para certa recuperação da queda observada até então. Mesmo assim, ressaltamos que as incertezas quanto ao ritmo suficiente para conter a inflação sem que o país enfrente uma recessão ainda continuam vivas no mercado e que a evolução dos indicadores econômicos nas próximas semanas deverão ditar este tom mais hawkish ou não do banco central americano.
Europa
O anúncio do BCE sobre o início de seu ciclo de aperto monetário nas próximas reuniões da instituição foi recebido sem surpresas pelo mercado. Contudo, a ausência de informações mais contundentes sobre os próximos passos da instituição trouxe um sentimento de dúvida, ajudando na elevação da aversão ao risco nos mercados internacionais. Os dados macroeconômicos na região seguem deteriorando, influenciados pelas dificuldades globais em termos de inflação e menor disponibilidade de recursos, além de um cenário de contração no crescimento, ainda potencializados pela guerra na Ucrânia que já ultrapassa os 100 dias. No Reino Unido, após leve retração do PIB em abril divulgada na segunda-feira, a taxa de desemprego subiu pela primeira vez em um ano, mostrando uma provável desaceleração, o que poderia ajudar nas discussões do BoE, que deve anunciar novo aumento dos juros esta semana. Dentre os principais índices na região, o FTSE (footsie) é o único que ainda se mantém estável desde o início do ano, em queda de 0,9%, contra mais de 14% dos demais.
Ásia
Após duros meses de queda e preocupações em razão dos contínuos lockdowns e seus efeitos que podem levar a uma desaceleração econômica maior que o esperado, as bolsas chinesas tiveram sua melhor performance semanal em 16 meses, com o SSEC avançando 3,4%, motivadas por forte fluxo de capital estrangeiro entrando no país. Nos destaques de alta da semana passada, estavam as ações do setor financeiro, seguido pelo setor de real estate, mais representativos nos índices. Mesmo com a provável continuidade das restrições de mobilidade em razão da política zero-covid adotada pelo governo chinês, os atuais níveis dos índices locais podem indicar um momento de entrada tendo em vista estes poderem já estar precificando um PIB em 2022 abaixo da meta divulgada pelo governo, de 5,5%. Os recentes estímulos anunciados pelo governo, com um pacote que vai desde redução de juros, incentivos ao mercado imobiliário e a pequenos empreendedores, apesar de ainda questionados sobre seus reais efeitos na economia, parecem ter entrado como uma opção plausível e alternativa a um mercado em correção. Ao mesmo tempo, o risco de fechamento da economia por conta de novos casos de covid no país seguem no radar. Esta semana, com novos casos avançando em Pequim, as autoridades locais iniciaram testes em massa, principalmente em locais com grandes multidões. Os receios de novos lockdowns colocam em alerta mercados em todo o mundo em razão de seus efeitos em toda a cadeia de suprimentos global.
Flashing Forward
Nesta semana, a expectativa fica por conta da reunião do FOMC e o percentual de aumento dos juros. Se antes 0,50 p.p. vinha como dado pelo mercado, desde ontem a percepção é de que o FED venha com um anúncio de 0,75 p.p., em um posicionamento mais hawkish, após dados de payroll e CPI pesando negativamente. Mas, antes disso, mercado digere dados do PPI nos Estados Unidos, a inflação ao produtor, que mostrou avanço de 0,8%, em razão principalmente da elevação dos custos com energia. Ainda esta semana, teremos dados de Vendas ao Varejo, o Índice Empire State de Manufatura, Produção Industrial e outros dados do setor imobiliário e, como falado na semana passada, números muito fortes poderão ser recebidos como más notícias, colocando pressão extra sobre os ativos e, mais uma vez, sobre o FED. Na Europa, teremos produção industrial e decisão de juros do BoE. Já na Ásia, mercados atentam para mais dados de atividade, em especial Produção Industrial, Vendas ao Varejo e taxa de Desemprego, visando entender melhor os impactos do lockdown e o ritmo de recuperação do país com o processo de reabertura.