Macroeconomia


Global Markets Ed.6.22

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Gabriela Joubert

Publicado 07/jun8 min de leitura

Alívios no curto prazo, mas aperto monetário está aí

Mais uma vez, o ciclo de aperto monetário dos Bancos Centrais no mundo fica no radar do mercado, em meio às divulgações de dados de atividades mistos, levantando questionamentos sobre possível recessão em algumas economias, como Estados Unidos. Assim, na percepção do mercado, dados muito fortes em alguns indicadores chave, como mercado de trabalho, podem não ser tão boa notícia assim. A divulgação do payroll acima das expectativas e posterior queda das bolsas na sexta-feira refletiram este sentimento. Crescem os receios de que o FED e demais BCs terão que acelerar o ritmo para conter os aumentos de preços, ao mesmo tempo em que direcionam esforços para não levar suas economias à recessão. Esta semana, Canadá e Austrália elevaram suas taxas básicas de juros, revertendo um ciclo observado há décadas, mostrando que a situação segue complexa até mesmo para economias estabilizadas, em movimento que traz ainda mais volatilidade às bolsas mundiais.

Enquanto isso, as limitações na cadeia de suprimentos, com a guerra na Ucrânia afetando preços de combustíveis e grãos – estes últimos também impactados pelas condições climáticas desfavoráveis que vêm, desde o ano passado, prejudicando safras ao redor do mundo –, faz com que os preços das commodities continuem em patamares elevados, impingindo pressão em toda a cadeia produtiva o que já se reflete nos índices de atividade e nas taxas de inflação ao redor do mundo. A aversão ao risco também tem se elevado, em mesmo ritmo que o aperto monetário, revertendo o ciclo altista observado nos últimos anos.

Em se tratando do petróleo, na semana passada, a OPEP+ cogitou a possibilidade de desconsiderar a produção russa, abrindo espaço para expansão de oferta advinda de outros países, como Arábia Saudita e Emirados Árabes, fazendo com que o preço do brent sofresse uma leve correção. Contudo, dificuldades correntes prevalecem do lado da oferta, limitando um incremento significativo pelos demais players de mercado, conforme observado no gráfico abaixo, comparando a produção de petróleo atual (laranja) versus os níveis pré-pandemia (cinza).

Ao mesmo tempo em que a oferta de petróleo segue limitada, vemos a demanda em ascensão, já acima dos níveis pré- pandemia, com a normalização da mobilidade, volta do consumo no setor aéreo e a ainda limitada participação de energia alternativa na matriz energética global, o que mantém a tendência de alta de preços da commodity inalterada.

Américas

As discussões sobre inflação e ritmo do aperto monetário do FED e demais bancos centrais seguem no cerne dos mercados. Esta semana, o Banco Central do Canadá elevou sua taxa de juros para 1,5% e indicou possibilidade de novos aumentos ao longo do ano visando conter os impactos dos aumentos de preços no país. Igualmente nos Estados Unidos, o FED segue firme em seu posicionamento sobre sua política monetária, enquanto o mercado segue cético sobre seus efeitos para conter a inflação e executivos de importantes empresas já alertam para períodos difíceis pela frente, reforçando a projeção de uma possível recessão em 2023. Os dados divulgados na sexta-feira sobre o mercado de trabalho americano refletiram este dilema em que se encontra o banco central americano. O relatório de emprego apontou para criação de 390 mil novas vagas em maio. Esse avanço ainda é bastante puxado pelo setor de serviços, em especial no segmento de lazer e hospedagem, que segue abaixo do nível pré-pandemia. A taxa de desemprego, por sua vez, se manteve estável no patamar historicamente baixo de 3,6%, refletindo também um leve aumento da força de trabalho. O quadro atual ainda aponta para um descompasso entre uma oferta limitada e uma demanda forte por trabalhadores, que se reflete em uma elevada razão entre vagas abertas e trabalhadores desocupados e em uma taxa de demissão voluntária historicamente alta. Em linha com essa interpretação, os salários nominais cresceram 5,2% na comparação interanual.

No entanto, existem riscos para o médio prazo. Em primeiro lugar, o ritmo de criação de emprego parece mostrar alguma desaceleração, com a média de três meses recuando para 408 mil, ante leitura de 600 mil até fevereiro. Além disso, o relatório ISM apontou para patamar contracionista para o emprego na indústria, revertendo a tendência recente. Por fim, o livro bege do FED mostrou que oito dos doze distritos reportaram perspectivas piores para a atividade, enquanto três ressaltaram o risco de recessão. Este cenário pode se tornar mais preocupante caso a inflação se mostre persistente e exija que o FED intensifique o grau de contração monetária nas próximas reuniões. A percepção do mercado é de que os dados de atividades precisam seguir crescendo, porém em ritmo bem abaixo do visto agora, a fim de que o aperto monetário do FED seja suficiente para conter o avanço dos preços sem retração da economia.

Nesse sentido, vale lembrar que a redução do balanço do FED começou a ser operacionalizada no primeiro dia de junho. Com isso, a autoridade monetária faz uso de uma ferramenta alternativa à elevação da taxa de juros (o Quantitative Tightening – QT) para tentar conter a inflação mais alta e manter ancoradas as expectativas de médio e longo prazo. Inicialmente, os reinvestimentos de títulos do tesouro serão restritos apenas ao que exceder US$ 30 bilhões, e esse limite aumentará para US$ 60 bilhões em três meses; por sua vez, o limite para hipotecas será de US$ 17,5 bilhões, avançando para US$ 35 bilhões no mesmo prazo.

Dessa forma, vale acompanhar o impacto dessa política nos mercados nos próximos meses. Em particular, a divulgação recente das reservas bancárias apontou para queda interanual de US$ 492,1 bilhões. Embora o mercado de crédito americano ainda siga robusto, a redução da liquidez no sistema financeiro pode pressionar os spreads corporativos nos próximos meses, em especial para empresas de risco mais elevado, o que impactaria de forma negativa a evolução da atividade econômica e do nível de emprego.

Europa

Assim como em outras economias desenvolvidas, vemos também na Europa os efeitos negativos da alta dos insumos nos índices de atividades, estes ainda potencializados pelos impactos da guerra na Ucrânia em curso desde março deste ano. Se no curto prazo as notícias de afrouxamento na China proporcionam movimentos de alta em setores mais ligados ao mercado asiático, como mineradoras e varejo de luxo, para o longo prazo as perspectivas não são das melhores. Dados de inflação na Zona do Euro divulgados na semana passada mostraram novo recorde ao reportarem avanço de 8,1%, bem acima das expectativas de 7,7% do consenso de mercado. Com isso, mercados já precificam possível aumento de 50 bps na taxa de juros pelo Banco Central Europeu até outubro, uma vez que a própria instituição já vem sinalizando início de alta para o próximo mês. Assim, investidores aguardam atentos pela reunião do BCE na próxima quinta- feira, em busca de novos sinais sobre os próximos passos da instituição, após os dados de inflação reportados e números abaixo do esperado para a indústria alemã divulgado esta semana, também contribuindo negativamente para este cenário.

Ásia

A semana começou com movimento inesperado por parte do Banco Central da Australia (RBA) que anunciou elevação de 0,5 p.p. em sua taxa básica de juros, alta mais agressiva em 22 anos, apontando para movimentos similares nas próximas reuniões em outros BCs no mundo e acendendo alerta para a reunião do BCE mais tarde esta semana. Na China, embora a reabertura da economia após o longo período de lockdown traga alívio para os mercados no curto prazo, os dados de atividade reportados no país não são animadores. O PMI Caixin Manufatura de maio subiu para 41,1 pts ante os 36,2 pts observados em abril, mostrando recuperação, mas, acima de tudo, a dificuldade da indústria chinesa em retomar o patamar de crescimento (acima de 50 pontos). As expectativas mostram que devemos seguir vendo dados mais fracos em virtude da política zero-covid adotada pelo governo chinês, em especial no setor de serviços que, aliás, já começa a afetar o mercado de trabalho. Pesquisa recente no país asiático mostrou elevação no número de desempregados desde o início do ano, reflexo das crescentes incertezas que tomaram conta das empresas no país e limitam os planos de contratações futuras. Mesmo com o recentemente anunciado novo plano de estímulos do governo com 33 medidas para impulsionar a economia, ainda há incertezas quanto à eficácia dele, tornando difícil alcançar a meta de crescimento de 5,5% do PIB para este ano. Ademais, lembramos que o setor energético no país passa por dificuldades, o que levou a forte retração das atividades no 2S21 e poderá impactar igualmente o ritmo de produção no 2S22.

Flashing Forward

Na semana, o foco fica por conta da decisão do BCE na quinta-feira sobre sua taxa de juros, na qual o mercado espera que os dados recentes de inflação e conjuntura possam direcionar o início do movimento de alta nas próximas reuniões para além do esperado inicialmente. Além disso, nos Estados Unidos, dados de inflação sairão no fim da semana, e as expectativas é de desaceleração ante ao observado no mês anterior, o que poderia compensar a pressão negativa advinda dos números mais fortes de mercado de trabalho. Adicionalmente, conheceremos o Índice de Sentimento de Michigan que deve indicar nova deterioração, com base na percepção negativa acentuada nas últimas semanas. Por fim, na Ásia, veremos dados de Balança Comercial na China e mercado atentará para os impactos das exportações e importações no país, em virtude dos lockdowns anunciados no mês anterior e ante a reabertura da economia desde o início do mês. Nas bolsas, atenção para a possível recuperação das empresas de growth diante de provável desaceleração do ritmo inflacionário, bem como cenário benéfico para as mineradoras com notícias positivas na China sobre afrouxamento das restrições sobre covid.


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