Vai ter recessão! Não, espera...
Os mercados internacionais seguem mareados de incertezas, esse é o único consenso. Nas últimas semanas, o que temos visto entre as falas, estudos e posicionamento dos agentes econômicos e de mercado é uma dualidade entre “Sim, teremos recessão nos Estados Unidos!” e “Não, economia está saudável e o aperto monetário não será suficiente para pará-la”. A dualidade está, inclusive, nas projeções de preços de commodities, com o range de preços projetados para o barril de petróleo ficando entre US$ 65 – US$ 380/barril, de acordo com pesquisas recentes. Com tantos percalços pelo caminho, os investidores mantêm-se atentos aos mais tênues sinais que possam trazer alguma nova informação sobre o que enfrentaremos daqui para frente.
Uma postura mais hawkish dos Bancos Centrais, especialmente das economias desenvolvidas, já parece precificada, com expectativas de aumentos mais agressivos nas taxas de juros no curto prazo, na tentativa de compensar a lentidão em agir lá atrás. O que ainda não está precificado são os efeitos desse corte de estímulos na economia no médio e longo prazo: as economias vão desacelerar ao ponto de uma recessão?
O desempenho das bolsas mundiais mostra um pouco do pessimismo que tomou conta dos mercados. Nos Estados Unidos, os principais índices tiveram seu pior desempenho nos primeiros seis meses do ano em quase cinco décadas. No caso do Nasdaq, foi o pior primeiro semestre da história. Mesmo os mercados que ainda operavam em campo positivo no ano, como o Ibovespa, em junho sofreram com as pressões negativas mais exacerbadas, devolvendo os ganhos reportados até então. Na contramão no mês, as bolsas asiáticas recuperaram parte das perdas anuais seguindo movimento de reabertura econômica após um longo período de lockdown.
O que esperar para o segundo semestre deste ano?
A primeira semana não parece muito acalentadora. Os temores de recessão seguem em pauta enquanto dados macroeconômicos na Europa desapontam, mais uma vez. Nos Estados Unidos, espera-se uma retração no PIB do 2T22 e na Ásia, novos casos de covid elevam o risco de volta das medidas restritivas. Ainda, a temporada de balanços deve trazer números e perspectivas atualizadas sobre as companhias, além de revisões para incorporação das projeções macroeconômicas mais pessimistas, corrigindo a discrepância em alguns setores quanto aos preços justos das ações.
Com isso, reforçamos a cautela necessária para navegar em momentos como estes. Nas próximas semanas traremos maiores detalhes sobre os balanços das companhias e o que esperar daqui para frente.
Américas: Afinal, vem ou não vem recessão por aí?
Os mercados parecem cada vez mais divididos entre os que já consideram a recessão como um fato (questão de “quando” e não mais de “se”) e os que acreditam que os movimentos recentes do FED serão suficientes para desacelerar a inflação e manter o crescimento em nível saudável. Contudo, um cenário sem coesão de perspectivas gera ainda mais volatilidade e dúvida, não só nos preços dos ativos, mas também na percepção dos agentes. De acordo com as expectativas, devemos observar nova contração do PIB dos Estados Unidos no 2T22, após o recuo já observado no 1T deste ano.
Na semana passada, vimos a confiança do consumidor recuar 4,5 pts, para 98,7 pts, o menor nível em 16 meses no país, em virtude dos efeitos do aumento de preços, prejudicando a percepção de poder de compra da população; porém, os mesmos consumidores afirmaram que não devem mudar seu padrão de consumo nos próximos meses, uma vez que as condições de mercado de trabalho permanecem saudáveis. A economia pode estar entrando em um momento de inflexão, com consumo e dados de atividade ainda positivos, mas condições financeiras (taxas de juros) e confiança do consumidor indicando uma desaceleração à frente. Esta semana será divulgado o payroll nos Estados Unidos e as expectativas são de criação de 270 mil novos postos de trabalho (Reuters), podendo colocar ainda mais pressão sobre o FED, apesar do possível alívio que a queda recente de algumas commodities pode trazer.
Europa: os problemas atuais parecem não serem suficientes.
Não bastasse todo o cenário inflacionário, perda de poder de consumo, desaceleração econômica e guerra, o velho continente ainda precisa lidar com um antigo fantasma: suficiência energética. Em 2021, a Europa passou por momentos delicados de desabastecimento de energia em virtude de uma demanda impulsionada pelos estímulos pós-pandemia e uma oferta limitada em razão da mudança matricial de migração de combustíveis fósseis para energias renováveis. O cenário de limitação de oferta foi ainda mais agravado com a guerra na Ucrânia e os embargos aplicados à Rússia, inclusive em petróleo e gás natural, têm dificultado o abastecimento na região, afetando, inclusive, os preços das commodities em nível global, uma vez que demais produtores mundiais tentam, sem sucesso, expandir sua capacidade. Mais recentemente, trabalhadores do setor de Óleo&Gás na Noruega entraram em greve, colocando ainda mais incertezas na oferta projetada na região, adicionando pressão extra sobre a inflação, ao mesmo tempo em que a Rússia ameaça cortar drasticamente suas exportações das commodities, o que poderia, no curto prazo, colocar pressão adicional nos preços dos insumos. Isso vale também para o gás natural e, neste caso, a situação fica ainda mais delicada em razão da dependência do continente em relação ao gás russo.
Por fim, os bancos centrais na região sinalizaram a possibilidade de um movimento mais abrupto nos apertos monetários visando conter as pressões inflacionárias correntes. Com isso, dados de atividades na região, como por exemplo PMI, seguem encolhendo, tornando a situação ainda mais complicada para o curto prazo.
Ásia: Junho de recuperação. Mas, até quando?
O desempenho dos índices asiáticos em junho, em especial na China, destoou do observado no restante do mundo, beneficiados pelos processos de flexibilização das restrições no país, bem como indicadores macroeconômicos em recuperação após reabertura da economia. O PMI Caixin de junho mostrou maior aceleração em um ano, subindo para 54,5 pontos, revertendo a tendência de queda e saindo da zona de contração dos meses anteriores.
Contudo, com a elevação dos custos e inflação, o mercado de trabalho tem arrefecido e a taxa de desemprego no país voltou a subir, com movimento de redução de custos das empresas, pressionando diversos setores da economia, inclusive o setor imobiliário, apesar dos estímulos anunciados recentemente. Apesar da expectativa de um 3T melhor, os mercados já precificam um PIB abaixo da meta oficial de 5,5% para este ano. Na ponta positiva, vimos as tensões sino-americanas também arrefecerem nos últimos dias, com autoridades de ambos os governos anunciando possíveis remoções de tarifas para produtos americanos no país, o que poderia contribuir para menor pressão de preços em alguns insumos.
Flashing Forward
Para esta semana, o foco fica por conta dos PMIs globais, que mostraram recuperação na Ásia e desaceleração na Europa. Mercados também atentam à Ata do FED, em busca de sinais sobre a posição da instituição para os movimentos em sua próxima reunião, antes de dados de mercado de trabalho norte-americano, com payroll na sexta, no qual se espera criação de 270 mil novos postos de trabalho, ou seja, uma desaceleração ante o mês anterior. Além disso, o mercado já se prepara para a temporada de balanços que ganha força na próxima semana ao passo que grandes nomes do setor financeiro divulgam seus relatórios de resultados.