Macroeconomia


BRF | Revisão de Preço 2022

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Gabriela Joubert

Publicado 17/jun10 min de leitura

Incertezas ainda rondam a BRF em 2022

Após período conturbado com efeitos da inflação na cadeia produtiva, ingresso da Marfrig no capital social da companhia, mudanças na administração e por fim, um resultado que surpreendeu negativamente o mercado, a condição da BRF se tornou cada vez mais incerta.

Pontuamos que por mais que a companhia esteja passando por um período turbulento, de reajustes em sua operação, a BRF se provou uma empresa inovadora, com uma forte representatividade no mercado. No entanto, as suas estratégias foram afogadas em mais um ano desafiador, gerando desproporção entre suas metas e sua capacidade executiva. Em vista disso, reduzimos o nosso preço alvo para o final de 2022 (YE22) de BRFS3, agora em R$ 20/ação (ante R$ 23,00), mantendo a nossa recomendação Neutra. Abaixo, apresentamos nossa visão para os principais segmentos da BRF e expectativas para o ano.

Brasil: Desafios pela frente

No 1T22, a BRF reportou resultados que surpreenderam negativamente o mercado e as nossas estimativas, em razão da limitação da demanda e reajustes na cadeia da companhia, o que propiciou uma queda da sua margem bruta para 3,3% (-19,7 p.p. t/t e -18,4 p.p. a/a), levando a um EBITDA negativo de R$ 375,8 mm ante o valor de +R$ 728,5 no 1T21.

Levando em conta a relevância das operações no Brasil para o resultado da BRF, com uma representatividade da receita líquida de 51% em 2021, vemos uma situação mais desafiadora para o mercado doméstico, tendo em vista os efeitos dos preços mais elevados do frango e da inflação geral inviabilizando o avanço do consumo no ano. Enquanto para a oferta, a avicultura se torna pouco rentável com o aumento dos custos e sensibilidade da demanda brasileira diante de repasses preços, gerando um movimento de redução do alojamento. No entanto, os recentes estímulos do governo, como liberação dos valores do FGTS e redução de impostos, tendem a amenizar os efeitos da demanda mais reprimida no curto prazo, principalmente pela postura mais defensiva do setor de alimentos.

De modo geral, 2022 deverá ser um ano de intempéries para o segmento, no qual diversas variáveis, ainda incertas, fragilizam a dinâmica da indústria. Ainda, com perspectivas incertas do fim da guerra entre Rússia e Ucrânia, adversidades climáticas nas safras, assim como o desafio da inflação global, será difícil projetar uma reversão das pressões de custos em curso sobre a companhia.

Em vista disso, para o ano projetamos uma desaceleração do crescimento da receita visto em 2021, com um avanço de 4,1%, impulsionado principalmente pelo patamar dos preços. No caso das margens, esperamos que haja uma gradativa melhora do peso dos custos na rentabilidade da companhia, no entanto, ainda as deteriorando quando comparado com o ano anterior. Já para o longo prazo, consideramos uma melhora do volume comercializado obtendo uma perspectiva mais otimista diante da recuperação da demanda brasileira, com arrefecimento dos preços.

Internacional: Horizonte positivo, com um curto prazo mais favorável

Ásia. Com uma receita majoritariamente liderada pelas operações na China, as perspectivas para o segmento da Ásia são mais desafiadoras, dado que o comércio está afetado pelo aumento da oferta frente a demanda, o que reduz a rentabilidade para o setor. No 1T22, conforme já esperado, foi visto uma forte redução das margens, com avanço dos custos e diminuição da receita, o que ocasionou uma margem bruta já negativa em 1,5% (-13,6 p.p. t/t e -22,4 p.p. a/a), assim como um EBITDA também negativo em R$ 78,6 mi.

Para o segmento, é esperado que as operações se estabeleçam no breakeven, com queda da demanda por proteína suína, mas ainda com ganhos estabilizados, oriundos da carne de aves. No longo prazo, as atividades dependerão da estratégia de crescimento da BRF na região, que inicialmente foi traçada com o intuito de avançar na China e demais países do continente por meio de parcerias para comercialização de produtos com alto valor agregado, contudo a sua aplicação ainda é incerta, principalmente com as prováveis mudanças na Visão 2030 da BRF, após adversidades de 2022.

Direct Exports. No caso das exportações, como o principal produto da BRF no segmento são as aves in natura, produto “commoditizado”, a elevação dos custos para aquisição do animal diminuiu a rentabilidade da companhia, o que levou a uma redução do volume comercializado no mercado externo no 1T22, com uma contração de -10,7% a/a e 18,1% t/t. Desse modo, a BRF reportou uma top line de R$ 1.630,2 mm (-15,2% t/t e +27,8% a/a), com uma margem EBITDA de 7,3% (-7,0% t/t e +6,6 a/a).

Para o curto prazo, a região do Oriente Médio se torna mais atrativa para a BRF, levando em conta a escassez de proteína de frango com a ausência da Ucrânia, importante exportador, e gripe aviária no Hemisfério Norte. Em vista disso, nesse cenário de carência de produtos, as variadas plantas habilitadas para produção de carne Halal do Brasil, sendo oito pertencentes a BRF, se tornam uma vantagem, dado que poderá preencher esse mercado deficiente. Além disso, a liberação temporária das cotas de importação pelo governo do México, estimula a exportação brasileira, principalmente pelo Brasil deter diversas plantas habilitadas para exportação para o país.

Dados da Secex mostram que a exportação em dólares de aves em maio registrou um avanço de 11,9% t/t e 36,0% a/a, com forte crescimento de 140,9% das importações dos Emirados Árabes e demais países da região. Abaixo, a tabela mostra os efeitos da escassez de carne de frango no total das exportações brasileiras de abril e maio.

Exportação Brasileira de Aves em Abril e Maio

Fonte: Secex, Inter Research.

Para o longo prazo, vemos que os fundamentos são positivos para o mercado, com uma tendência de crescimento do consumo mundial de carne de frango ao longo dos anos. Em vista disso, com a evolução da produtividade da cadeia, consideramos um horizonte favorável para o segmento.

Halal. Para o segmento Halal, as projeções são mais benéficas, com variáveis favoráveis para o curto/médio prazo. No 1T22, a divisão Halal teve um destaque positivo, com receita líquida em R$ 2.656,5 mi (+9,4% t/t e 27% a/a), assim como uma margem bruta de 21,3% (-5,4 p.p. t/t e -2,0 p.p. a/a), um pouco machucada pela elevação dos custos. De modo geral, o resultado foi impulsionado pelo repasse de preços efetuado na Turquia e avanço dos valores do frango no mercado externo, que proporcionou uma margem EBITDA de 14,5% (+1,6 p.p. t/t e 4,8 p.p. a/a).

Para 2022, vemos que os estímulos econômicos causados pela alta do petróleo no Oriente Médio, é um diferencial para região, que de certo modo vai contra o fluxo negativo que estamos vendo ao redor do mundo. Ademais, a atual situação geopolítica, assim como recente JV com o Public Investment Fund, fundo soberano da Arábia Saudita, somado com a inauguração da fábrica no país nesse mês, se tornam uma alavanca para o fortalecimento da BRF na região. Desse modo, como a estratégia de consolidação das operações já apresenta resultados, bem como possui fundamentos fortes, temos uma visão positiva para o segmento no longo prazo.

Resultado Operacional e Endividamento

No 1T22, a BRF apresentou um forte avanço dos custos, entregando uma margem bruta de 9,2% (-13,6% t/t e -11,5% a/a), em parte explicado pela perda no valor de R$ 406 mm com derivativos de commodities, assim como gastos de R$ 422 mm com ajuste na produção e redução do estoque. No entanto, mesmo excluindo esses montantes da conta, o forte avanço dos custos na cadeia foi superior às nossas expectativas, prejudicando ainda mais a rentabilidade da companhia, que teve uma margem EBTIDA de 1,3% (-7,6 p.p. R/E, -11,6 p.p. t/t e -10,9 p.p. a/a).

De modo geral, vemos que o cenário econômico incerto ainda deve proporcionar uma contração das margens no ano vis-à-vis 2021, com gradual recuperação, principalmente a partir de 2023, após provável restauração do preço das aves e aumento da oferta dos grãos. Desse modo, projetamos uma margem EBITDA de 7,9% em 2022. Para o longo prazo, esperamos que o retorno dos preços e redução dos custos da cadeia possam trazer um respiro para as margens da companhia.

Por outro lado, após follow-on no início do ano, a companhia reportou uma alavancagem de 2,83x, ante a 3,12x no 4T21, entretanto, o seu resultado é superior ao patamar da indústria, o que pode prejudicar o seu crescimento e desenvolvimento de sua estratégia. Nesse sentido, a BRF passa por um processo de regulação da sua Visão 2030, de modo que se alinhe com as condições presenciadas pela companhia nesses últimos períodos.

Mas o que está por vir?

Por mais que ainda incerta a direção do crescimento da BRF, vemos que a mudança do conselho, com ingresso da Marfrig e representatividade positiva dos acionistas na administração, traz uma esperança sobre o gerenciamento e futuro da companhia. Além disso, para o curto prazo, o ajuste na sua produção, com redução do estoque, assim como mudança no mix de produtos em busca de baratear o item para o consumidor, foram passos importantes para o assentamento da BRF, principalmente com as oscilações que ainda estão por vir no ano. Por outro lado, no longo prazo, vemos que a estratégia global da companhia já encaminhada e atuação com uma proteína em ascensão dentre as demais, traz fortes benefícios para BRF no futuro, no qual só virá a depender da sua capacidade administrativa de fomentar esse potencial.

Em contrapartida, os efeitos da desaceleração econômica e inflação global, além do prolongamento da guerra entre a Rússia e Ucrânia, assim como a mobilidade na China, amplificam as incertezas e sensibilidade das atividades, o que vem a interferir na dinâmica da BRF, como de todo o mercado. Assim, considerando as incertezas para o ano e incorporando os resultados do 1T22, adotamos uma postura mais conservadora para a BRF, principalmente levando em conta que o mercado já precificou boa parte dos riscos para o papel. Desse modo, reduzimos o nosso preço alvo para o final de 2022 (YE22) de BRFS3, agora em R$ 20/ação (ante R$ 23,00), mantendo a nossa recomendação Neutra. Pontuamos que para o modelo consideramos um WACC de 10,5% e crescimento na perpetuidade de 4%.

Fonte: Inter Research.

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