Factor Investing
Nos últimos anos, o chamado “factor investing” vem ganhando relevância nos mercados internacionais. Da mesma forma como stock picking, análise técnica e outros, o factor investing é uma forma de definir a alocação de uma carteira.
O que é o Factor Investing e como surgiu?
O factor investing, como o próprio nome diz, parte da ideia da análise por fatores. Os fatores são índices que um determinado investidor tem a possibilidade de seguir. Mesmo você não estando familiarizado com o termo, com certeza já ouviu falar de pelo menos um fator: o Mercado, o fator do primeiro modelo de factor investing.
O primeiro modelo de factor investing surgiu com o CAPM, ou Capital Asset Pricing Model, em que a correlação de um portfolio com o mercado e a intensidade das variações do portfolio determinavam o retorno esperado desse mesmo portfolio. No modelo, a correlação e intensidade dos retornos do portfolio em relação aos retornos do mercado são descritas por um , como pode ser visto na seguinte equação:
Portanto, o retorno esperado do portfolio () nada mais é do que uma junção entre , o retorno que esperamos do mercado () e o retorno do ativo livre de risco (). Ou seja, quanto maior for a expectativa de retorno do mercado, maior será o do portfolio e, da mesma forma, quanto maior for o , para expectativas de retorno de mercado positivas, maior será o retorno do portfolio.
No Brasil, por convenção definimos como o investimento atrelado a Selic e sem risco de crédito - Tesouro Selic (antiga LFT) emitida pelo Tesouro Direto. O retorno esperado do mercado depende das perspectivas dos analistas/gestores e é uma média dos retornos esperados para as ações daquele mercado. O nada mais é do que a relação entre os retornos históricos do mercado e os retornos históricos do portfolio e é calculado com base em uma regressão simples que, em outras palavras, mede como e com qual intensidade duas variáveis (no caso, o portfolio e o mercado) estão relacionadas. Exemplificando, para analistas com uma perspectiva positiva do mercado, quanto maior o do portfolio escolhido, maior deve ser o retorno esperado. Da forma contrária, em momentos de incerteza em relação ao mercado, em que quedas mais acentuadas podem acontecer, portfolios mais defensivos ou, em outras palavras, com menores se mostram preferíveis. Assim, o se concretizou como a medida de risco do portfolio.
No entanto, com o passar do tempo, o modelo de fator em que a expectativa de mercado e o eram os únicos determinantes do retorno esperado do portfolio se mostrou obsoleto. Diversas vezes, portfolios que apresentavam pequenos, mostravam retornos além do esperado enquanto portfolios agressivos, com altos, tinham retornos aquém do indicado pela equação. Assim, se percebeu que o era somente um fator de risco e que gestores que alocavam seus portfolios com baixo, mesmo assim conseguiam sistematicamente retornos altos, na verdade, estavam se expondo a outros riscos.
Dentre os primeiros estudiosos de finanças a verificarem essas “anomalias”, Eugene Fama e Kenneth French propuseram um modelo para gerar o retorno esperado de um portfolio/ação em que, além do retorno do mercado, os retornos de e eram utilizados, dois novos fatores para a equação. indicava o retorno esperado de um índice que está comprado em ações de pequeno porte e vendido em ações de grande porte e indicava o retorno esperado de estar comprado em ações de valor e vendido em ações de crescimento (ações que dão dividendos para o investidor contra ações que reinvestem os dividendos). Na perspectiva dos autores, era essencial considerar esses fatores/índices para ter uma perspectiva verídica do risco que os gestores decidem tomar. Dessa forma, a equação que antes era composta somente pelo fator mercado, passou a mostrar os de e :
De acordo com a equação, o retorno esperado do portfolio agora era função não somente do mercado, mas também de outras medidas de risco sistemático. Da mesma forma como antes, quanto maior fosse o retorno esperado dos índices e , mais vantajoso era estar alocado em portfolios que apresentassem maiores relacionados a esses índices. Por outro lado, a alocação mais agressiva nos fatores/índices também trazia maiores riscos: se as expectativas para os fatores estivessem erradas, betas maiores poderiam vir a trazer perdas mais relevantes.
Para aqueles que acreditaram na proposta de Fama e French, para determinar um retorno do portfolio, passou a ser importante calcular a expectativa de retorno para os outros dois fatores ( e ). A título de exemplo, se um gestor acredita que a alta dos juros deve afetar de forma mais relevante as ações de crescimento enquanto as ações de valor devem se mostrar mais resilientes, é logico que esse decida por alocar seu capital em um portfolio com maior , tendo em vista que a expectativa de retorno do respectivo fator é maior. Se um gestor acredita que o mercado, de forma geral, deve se tornar mais disruptivo e menos monopolístico, a alocação em portfolios com maior deve ser favorecida, tendo em vista que empresas menores ganharão maior espaço em detrimento de empresas já maiores e mais consolidadas.
Com suas perspectivas ajustadas, o gestor verifica qual o retorno esperado de cada um dos possíveis portfolios em que pode alocar, conseguindo por fim definir qual desses é o melhor para realizar a alocação.
Exemplificando, o gestor que acredita que as ações small cap devem se sobressair em 5% sobre aquelas de maior marketcap (retorno esperado de : ), vê que o movimento de juro contracionista deve afetar as ações de value 10% a menos que as ações de growth (retorno esperado para : ) e tem convicção que o mercado deve mostrar retorno apenas 2% superior ao (retorno esperado para o ) irá escrever a sua equação da seguinte forma:
Com a equação, ao testar os possíveis portfolios que tem a disposição, ele irá escolher aquele que mostra maior correlação com o índice que fica comprado em ações de value e vendido em growth () e menor correlação com o índice de mercado, tendo em vista que o risco desse não deve mostrar retorno considerável ( é somente 2%).
Diversos gestores ao redor do mundo começaram a ver o mercado dessa forma e o modelo de Fama e French, descrito acima, logo ganhou relevância internacional, levando o nome dos autores para a equação de retorno esperado do portfolio que incluía SMB e HML e agraciando um deles com um prêmio Nobel em 2013.
Factor Investing Atualmente
Depois de Fama e French, outros fatores ganharam significância. Atualmente, em mercados mais desenvolvidos, a discussão de quais fatores são relevantes e em quais momentos determinados fatores são mais relevantes adquirem cada vez mais espaço.
Após a consolidação do modelo de Fama French, Momentum foi o fator que alcançou a fama. Narasimhan Jegadeesh, em 1993, percebeu que o índice que comprava as ações até então com maiores altas e vendia as ações até então com maiores quedas era um fator de risco sistemático relevante e ajudava a explicar os retornos esperados dos gestores. Apesar de início parecer contraintuitiva, tendo em vista que ações que caem mais estão, em média, mais descontadas, a ideia era capaz de explicar o efeito manada do mercado e o fluxo positivo para ações com bons retornos recentes, tendo em vista que os fundos que estavam em posição de short squeeze, tinham que se desfazer das posições vendidas comprando essas. O fator, como citado anteriormente, foi concebido como Momentum ou (Winners minus Losers).
Hoje em dia, existe uma imensidade de fatores e, todos os anos, novos estudiosos pensam em mais. Entre esses, os fatores macroeconômicos, ou seja, que mostram como determinados portfolios/ações reagem a mudanças no cenário macroeconômico, também cativam relevância na alocação.
No entanto, a fama ou aderência desses novos fatores não é tarefa fácil. Além de ser capaz de explicar estatisticamente os retornos, o mercado requer que as pessoas que pensam nos novos índices sejam capazes de dissertar sobre porque eles funcionam/são boas medidas.
Definindo a relevância de um fator: por quê?
Como dito anteriormente, a discussão sobre fatores é ampla e não há concordância sobre quais devem ser utilizados. Para mais, mesmo entre gestores que praticam factor investing e concordam sobre quais fatores são essenciais para explicar flutuações de mercado, há discordância sobre qual o melhor momento de aporte “no fator” e quão relevante esse é em cada momento do ciclo econômico, monetário, fiscal, etc. Portanto, gestores que têm a crença em comum que determinados fatores são os mais importantes, ainda podem alocar de forma divergente por acreditarem que esses fatores devem mostrar diferentes expectativas de retorno. Isso acontece porque os gestores determinam a relevância dos fatores de forma empirista, ou seja, baseado no que aconteceu, mas também de acordo com suas crenças e lógica (o que chamamos de a priori).
Definindo a relevância de um fator: como?
Na perspectiva passada, a forma mais utilizada de definir a relevância de um fator em um determinado momento é através de um cross section dos retornos. Em outras palavras, o gestor deverá definir os betas de cada um dos ativos e regredir o retorno dos ativos no período pelos betas. Para esclarecer, seguimos com um exemplo.
Um gestor acredita que o mercado brasileiro é explicado por 5 fatores, sendo esses (Retorno de Mercado), (Small Caps vs. Large Caps), (Valor vs. Crescimento), (Momentum) e (Ações ilíquidas vs. líquidas). Para entender melhor como esses fatores se comportam em diferentes momentos de ciclos econômicos, o gestor faz o seguinte exercício para diversos períodos:
1. “Regride” (entende a relação) entre cada uma das ações e os fatores considerando diferentes intervalos de tempo. Na foto a seguir, vemos a relação de cada uma dessas ações com os fatores entre outubro de 2021 e março de 2022:
2. Para cada intervalo, o gestor calcula a relação entre os betas conseguidos e os retornos de cada ação através, novamente, de uma regressão. Os resultados mostram quais fatores são favorecidos no intervalo, ou seja, se, em média, naquele intervalo de tempo, alocações com betas mais agressivos são favorecidas perante alocações com betas menores. A figura a seguir exemplifica exatamente a relação entre os retornos das ações e um dos betas em consideração. No caso e para o período analisado, o gestor percebe que as alocações que tiveram relação mais forte com o índice do beta em consideração apresentaram, em média, melhor performance.
3. Após fazer a análise para diversos betas, utilizando períodos de tempos diferentes, o gestor deve criar perspectivas futuras de como cada um desses fatores em consideração deve performar se baseando em períodos passados que se parecem mais com suas expectativas. Por exemplo, se as perspectivas da equipe econômica apontam para um ciclo de política monetária mais contracionista do que na opinião do mercado como um todo, ao definir em quais fatores “o aporte” é mais importante, o gestor deve olhar para períodos similares na história e ver como cada um desses se comportou.
Factor Investing: o futuro da alocação?
Apesar de pouco conhecido no Brasil, factor investing já tem papel relevante em outros lugares do mundo. Aqui ainda nos prendemos muito a análise baseada somente no fator de mercado, relacionando ações ao risco sistemático do Ibovespa, no entanto, aos poucos outros fatores, capazes de explicar outros riscos não diversificáveis, vem ganhando espaço na análise dos investidores.