Macroeconomia


Internacional | Junho 2025

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André Valério

Publicado 30/jun2 min de leitura

Por que o Fed irá cortar em setembro?

Em 2025, a inflação americana acumula alta de 0,94% até maio. No mesmo período do ano passado, a inflação acumulava alta de 1,43%. Paralelamente, a economia americana adicionou 619 mil empregos esse ano até maio, enquanto em 2024, no mesmo período, havia adicionado 898 mil empregos. Portanto, temos sinais de que tanto a inflação quanto o mercado de trabalho, as duas metas do Fed, estão perdendo força, mantendo tendência que desde 2021. Então por que não cortar?

Nos últimos 30 anos a política monetária nas principais economias do mundo passaram a seguir regras, ao invés de seguir decisões discricionárias. A principal regra, que prevalece até hoje é a Regra de Taylor, que sugere a taxa de juros ótima baseada na diferença entre a inflação corrente e a meta de inflação e da distância entre a taxa de desemprego corrente e a natural, aquela que não acelera a inflação. Com a inflação hoje cerca de 20 pontos base abaixo da inflação observada em setembro, quando o Fed iniciou o ciclo de cortes, a Regra de Taylor sugere que a taxa de juros deveria estar 30 pontos base abaixo da taxa de juros observada em setembro, próximo do que observamos hoje. Portanto, a Regra de Taylor sustenta a visão do Fed de que o melhor caminho é manter a taxa de juros inalterada.

Entretanto, a política monetária opera com defasagem. Uma decisão de juros hoje tende a demorar alguns trimestres até impactar a economia. Isso significa que os bancos centrais devem atuar de maneira prospectiva, ou seja, eles têm que atuar de modo a antecipar a tendência da inflação e emprego, que nesse momento é de queda.

Em tempos normais, seria difícil o Fed justificar a postura de manter a taxa de juros no atual patamar. Porém, não estamos em tempos normais. Desde a posse de Trump no fim de janeiro temos visto um aumento considerável na incerteza econômica, que atingiu o pico no dia 02 de abril, quando Trump anunciou tarifas para diversos parceiros comerciais. Desde então, boa parte dessas tarifas foram reduzidas, particularmente as da China que saíram de 145% para 30%. Ainda assim, há muita incerteza sobre a questão tarifária devido ao constante vai e vem e, mesmo com a atual redução em prática, a tarifa efetiva da economia americana é a maior dos últimos 80 anos.

Na literatura econômica há amplo consenso de que tarifas sobre importações geram distorções produtivas, aumentando o custo de produção e reduzindo a eficiência econômica. Por outro lado, há ampla evidência de que, passado o choque inicial de aumento de preços, as tarifas não geram inflação persistente. Entretanto, a não ocorrência de inflação é verdade apenas sob hipóteses que muitas vezes não são atendidas no mundo real.

Portanto, nesse momento, o Fed não consegue atuar de maneira proativa, pois não há clareza de qual cenário prevalecerá: o de impacto negativo na atividade econômica ou o inflacionário. Até esse momento, não se viu nenhum impacto das tarifas, seja nos preços, seja no emprego, seja na produção. Mas isso não quer dizer que não haverá impacto algum. Em 2018, quando Trump impôs diversas tarifas sobre produtos chineses, o efeito sobre os preços só foi surgir três meses após o anúncio. Até o momento, só tivemos divulgação de dados de inflação de um mês após o anúncio, portanto, é possível que vejamos o impacto aparecendo de maneira mais evidente nas próximas leituras.

A próxima reunião do Fed será nos dias 29 e 30 de julho. Até lá teremos a divulgação da leitura da inflação de junho, apenas. Assim, é pouco provável que vejamos algum impacto significativo das tarifas, não havendo tempo hábil para o Fed coletar dados que deem maior grau de confiança sobre qual será o real impacto das tarifas. Portanto, a reunião de julho deverá ser a quinta reunião consecutiva em que o Fed não altera a taxa de juros.

Por outro lado, começam a acumular sinais de que a economia americana esteja desacelerando. Os dados de varejo em maio sugerem que os gastos reais dos consumidores devem desacelerar no 2º trimestre, tendência que pode se aprofundar no 3º trimestre. Além disso, vemos sinais de enfraquecimento no emprego. As intenções de contratações das pequenas empresas recuaram desde a imposição das tarifas e indicadores antecedentes sugerem aumento do desemprego nos próximos meses. Além disso, o mercado imobiliário americano sente a elevada taxa de hipoteca, e segue sendo um importante entrave para a atividade, dependendo de uma redução nas taxas para reaquecer o setor.

Na última reunião do dia 18 pôde-se ler nas entrelinhas que parece haver uma espécie de compromisso entre os membros do Fed. Pelas projeções dos membros do FOMC, nota-se que há uma clara divisão entre eles. Dos 19 membros, 7 acreditam que o Fed não deveria cortar nenhuma vez esse ano, enquanto 8 acreditam que o Fed deveria cortar duas vezes esse ano. Além desses 15, há 2 membros que acreditam em apenas um corte e outros 2 que acreditam em 3 cortes esse ano. O compromisso, portanto, parece ser esperar até a reunião de setembro para averiguar o impacto das tarifas sobre a economia americana. Até a reunião de setembro teremos a divulgação de mais três leituras de inflação, totalizando quatro leituras após a imposição das tarifas. Será tempo suficiente para analisar o impacto inflacionário.

Assim, estamos em uma situação em que o corte na reunião de setembro é o mais provável. Se mantivermos a atual tendência dos dados, sem impacto inflacionário significativo e a atividade mantendo-se robusta, esperamos que o Fed corte em setembro. Por outro lado, se as tarifas de fato impactarem a economia, principalmente o mercado de trabalho, aumentando a taxa de desemprego, acreditamos que o Fed corte em setembro independente do possível impacto inflacionário.

Tendo em vista os dados antecedentes do mercado de trabalho, o cenário de aumento na taxa de desemprego é o mais provável, fazendo com que o Fed corte nas três últimas reuniões do ano, levando a taxa de juros americana para o intervalo de 3,50%-3,75% até o fim do ano.


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