O que a taxa de juros mais alta nos EUA pode significar para o Brasil?
Depois de um longo período de juros baixos, as taxas de juros nos EUA tiveram forte alta nos últimos meses. Tanto a taxa curta, que é definida pelo Fed, como instrumento de política monetária, quanto as taxas longas dos títulos do tesouro chegaram nas máximas observada nos últimos 15 anos. Os juros dos títulos de 10 anos, que ficaram em média em 2,4% a.a. nos últimos 15 anos, estão hoje próximos 4,8%. A taxa de juro real também está próxima da máxima desde 2008, em 2,4% a.a. contra a média de 0,4% no período.
A recente alta de juros nos EUA é resultado de uma combinação de fatores. Primeiramente, a elevação da inflação desde o choque de oferta iniciado com a pandemia e sua persistência resultaram em diversas revisões de expectativas de alta da taxa básica pelo Fed. Além do atual patamar, hoje em 5,5%, o prazo que essa taxa deve ficar mais alta para trazer a inflação de volta para a meta também será maior. A persistência inflacionária e a maior preocupação com o crescente déficit fiscal nos EUA também gera revisões nas estimativas da “taxa R*”, o juro neutro. E por fim, a maior oferta de títulos pelo tesouro americano para o financiamento do déficit e a redução da demanda de compradores como Japão e o próprio Fed, que segue com o quantitative tightening (QT), também foram levantados como fatores de pressão altista nas taxas.
Há várias implicações para os juros mais elevados na economia global, principalmente por uma prazo mais longo, como se espera agora. A primeira delas, positiva, é a gradual redução da inflação, ainda que a atividade ainda se mantenha aquecida nesse momento. Os dados do mercado de trabalho e do PIB de 2023 seguem sendo revisados para cima, surpreendendo as expectativas de mercado e do próprio Fed, devido à defasagem da política monetária acima do comum. No entanto, nos próximos meses, a desaceleração da economia virá com a menor oferta de crédito e o maior custo, resultado dos altos juros, o que tem impacto direto no consumo e no investimento. A magnitude dessa desaceleração ainda é incerta, se teremos uma recessão ou um ajuste mais moderado, o soft landing.
Para mercados emergentes, como o Brasil, o impacto também será de menos investimento, devido ao aumento do custo de capital e maior aversão a risco. O investidor estrangeiro tinha como base uma taxa livre de risco próxima de 2%, hoje refaz sua análise com o custo mais próximo de 5%. A barra está mais alta para novos investimentos com retorno esperado maior.
No curto prazo, a Selic deve continuar em queda no ritmo moderado de 50 pontos base nas próximas reuniões. Com a Selic ainda no elevado patamar de 12,75% para uma inflação esperada abaixo de 4% para o próximo ano, o espaço para cortes ainda é tem certa folga. Fica descartada uma eventual aceleração do ritmo, como se cogitou no início do ciclo, e uma desaceleração para 25p.b. passa a ser o cenário mais provável a partir do 1º trimestre de 2024. A Selic terminal em 9% ainda é compatível com juros mais elevados lá fora, desde que a inflação continue convergindo para a meta aqui no Brasil. Mas o risco de um novo choque no petróleo ou uma desvalorização cambial mais significativa pode implicar em uma pausa na redução dos juros pelo Copom ao longo de 2024.
Nesse cenário de maior custo de dívida até mesmo para as emissões de títulos públicos, é ainda mais importante a busca do equilíbrio das contas públicas. Na comparação com outros países emergentes, o Brasil continua bem avaliado, como visto pelo risco país e o ingresso de investimentos, mas segue com uma das mais elevadas dívidas em relação ao PIB, o que tende a pressionar as taxas de juros locais. O cenário global de demanda mais fraca exige um esforço fiscal maior, e é preciso fazer o dever de casa. Queda de commodities significa queda de arrecadação e juros altos impacta as decisões de investimentos e consumo à frente. O ajuste fiscal visando aumento de arrecadação pode ser ainda pior para o crescimento e, por isso, a importância de também se controlar gastos e sinalizar estabilização da dívida, ainda que no médio prazo.