Ciclos de política monetária no Brasil
Nos últimos 15 anos, a política monetária no Brasil passou por diferentes ciclos de aperto no processo de controle da inflação. No último ciclo em 2015, a taxa Selic havia chegado ao pico de 14,25% e permaneceu nesse patamar pelo prazo mais longo da série, 15 meses. A inflação caiu de 10,7% em janeiro de 2016 para dentro do intervalo da meta em abril de 2017, também em 15 meses. O ciclo de aperto foi longo e, juntamente como o ajuste fiscal no período, contribuiu para que a inflação ficasse dentro da meta até março de 2021, quando se iniciou a nova alta dos juros após os choques inflacionários da pandemia. No momento, a taxa nominal está em 13,75% desde agosto do ano passado e as curvas de juros indicam que a Selic permanecerá nesse patamar até agosto de 2023, ou seja, por cerca de 12 meses, o que será o segundo mais longo ciclo desde a implementação do regime de metas de inflação.
Mesmo quando analisamos a inflação de serviços, que apresenta maior persistência, também observamos uma resposta, ainda que mais tardia, ao atual ciclo de aperto. A inflação de serviços teve pico de 8,75% em 2022 e já em trajetória de queda acumula 6,7% em 12 meses (estimativa Focus para maio/2023). A potência da política monetária hoje é maior que no passado, considerando a maior atuação do mercado de capitais e significativa redução dos subsídios de crédito, principalmente com o fim da TJLP. Por outro lado, tivemos uma forte expansão fiscal em 2020 e iniciamos 2023 também com estímulos adicionais, que devem reduzir o impacto dos juros e retardar a queda da inflação. Aliás, a quase contínua expansão fiscal no Brasil é responsável pela maior parte dos surtos inflacionários, uma vez que tivemos poucos e curtos momentos de política monetária expansionista.
Analisando a política monetária no Brasil, após a crise de 2008 que implicou em queda nas taxas de juros globais, observamos que a média do juro real implícito na taxa Selic ficou próxima de 3% nos últimos 15 anos. A taxa real ex-ante, descontada a inflação projetada em 12 meses, teve maior oscilação ao longo dos ciclos e hoje está próxima do pico em cerca de 9%. Com a queda da inflação esperada, ainda que gradual, o corte de juros está próximo de se iniciar. A taxa real média histórica em 3% estava em linha com o juro neutro estimado pelo BC, até que a mudança no cenário fiscal, que voltou a ser expansionista, trouxe de volta a incerteza com relação à estabilização da dívida pública. A taxa neutra estimada pelo BC hoje é de 4%, o que indica uma Selic terminal de 7%, caso a meta seja mantida em 3%.
Qual a relação entre a taxa Selic e a taxa de juros real de mercado? As taxas de juros reais precificadas nos títulos do tesouro indexados à inflação também sofrem oscilação, seguindo momentos de maior percepção de risco que, em geral coincidem com períodos de alta na inflação. Nos últimos, anos as taxas oscilaram entre 2% e 8%, com média próxima de 5%. Com a apresentação do arcabouço fiscal e sinais de que o pico do aperto monetário pode estar próximo do fim, observamos um fechamento de cerca de 30 bps nas taxas de mercado para próximo de 5,9%. No cenário de controle da inflação e redução do risco fiscal, poderíamos ver uma queda maior dessas taxas, mas esse cenário depende da aprovação do arcabouço com mais garantias na execução fiscal de equilíbrio.
O que esperar para os próximos passos do Copom? Esperamos que o primeiro corte da Selic ocorra em agosto e termine o ano em 12%. Ao longo de 2024, a taxa pode continuar em queda para próximo de 10%, mesmo considerando ainda algum crescimento de gastos fiscais que deve manter a inflação acima do centro da meta. O cenário de Selic terminal em 7% é improvável no médio prazo e depende de reformas estruturais e controle do crescimento de gastos, que não esperamos nesse governo até 2026. A mudança na composição do BC, que começa agora com a indicação de 2 novos diretores, pode resultar em maior pressão pela redução mais acelerada dos juros no curto prazo. Porém, caso a política monetária perca credibilidade, com decisões de políticas heterodoxas, o resultado pode ser a reaceleração da inflação, tanto por uma desvalorização cambial, como por desancoragem das expectativas. Ou seja, um BC mais dovish não resolve a questão do crescimento da economia. Políticas fiscais e monetárias devem sim andar alinhadas, porém, se o alinhamento caminhar para uma expansão, o resultado pode ser a aceleração da inflação.