E se a taxa de juros cair? O que pode acontecer com o mercado imobiliário?
O mercado de ações, de forma geral, reage às movimentações da curva de juros, com a mudança da taxa de desconto, concomitante à migração da renda variável para a renda fixa. Assim, quando os juros sobem, vemos pressão baixista nos papéis das empresas e o inverso também costuma ser verdadeiro.
No segmento imobiliária, o impacto se torna ainda mais evidente devido à forte dependência das taxas de financiamento, uma vez que a grande maioria dos compradores de imóveis opta pelo financiamento imobiliário. Além do efeito no aumento do financiamento de novas vendas, o custo também aumenta para unidades já vendidas, afetando diretamente o aumento no percentual de distrato e que, consequentemente, leva à elevação de estoques. Com o excesso de estoques, as construtoras tendem a reduzir o preço para aumentar a velocidade de vendas, reduzindo as margens e pressionando ainda mais os resultados do segmento.
O setor imobiliário pode ser dividido em quatro grandes fases, influenciadas pelo patamar de juros de uma economia, conforme abaixo.
Construção Cívil
Apesar de estarem no mesmo setor, os segmentos de alta e baixa renda possuem diversas diferenças, com destaque especial para o funding dos clientes de cada categoria. Na baixa renda, o recurso vem via Caixa Econômica Federal (FGTS e SBPE) por meio do programa Minha Casa Minha Vida, com taxas de incentivo e crédito subsidiado. Já no média/alta renda, os recursos chegam por meio de bancos privados que, normalmente, tem seus custos atrelados à SELIC e ao IPCA. Observa-se que no rali de alta dos juros, as construtoras voltadas para o público alta renda naturalmente apresentam maior deterioração em seus valores de mercado, penalizadas pela demanda arrefecida em razão dos altos custos de financiamento de imóvel no país. Não só isso, nos últimos dois anos, o custo da construção em patamar elevado desde a pandemia, com preços crescentes de cimento, aço e outros, também contribuiu para maior pressão de margens, prejudicando o desempenho operacional destas companhias e, consequentemente, suas ações. A exceção ficou por conta da Tenda (TEND3) que apesar de focar no segmento baixa renda, mais resiliente em momentos de juros mais altos, apresentou problemas operacionais no final do ano de 2021, o que levou à forte correção nos preços de seus papeis.
Diante da nossa visão de início de queda dos juros para agosto (leia aqui o relatório do nosso time de macro), entendemos que o ciclo se torna favorável para o setor, mas em especial às companhias voltadas para o alta renda. Com custos mais controlados e em tendência de queda, poderemos ver uma alta generalizada do setor no curto prazo, por conta das melhores perspectivas com juros menores no país, seguida por uma busca de ativos bem administrados e subvalorizados por conta da dinâmica mais ácida dos últimos meses. Nesse sentido, vemos a Cyrela como top-pick, que além da exposição no segmento alta renda conta com um portfólio diversificado em outros segmentos, por meio de suas joint ventures e subsidiárias. Além disso, esperamos que a construtora apresente um bom volume de lançamentos concomitante a uma estabilidade na velocidade de vendas, totalizando em um crescimento tanto no top-line quanto no bottom-line.
Shoppings
Como já demonstrado em relatórios anteriores, o segmento também apresenta relação inversa aos juros reais, mas aqui influenciado pelo impacto dos juros no bolso do consumidor, seja pela escassez do crédito barato, seja pelo aumento da inadimplência no mercado e no custo de carrego de suas propriedades para investimentos (Shoppings). Apesar disso, o setor reportou recordes em suas principais linhas de receita ao final do ano de 2022, mesmo em períodos de eleições e copa, justificado pela estratégia bem-sucedida de i) mudança de mix (aumento de exposição no segmento de serviços) ii) realização de eventos e iii) repasse de alugueis sem comprometer a inadimplência e ocupação. Além disso, o segmento já demonstrou certa resiliência em períodos mais adversos, como a pandemia, que obrigou o fechamento dos shoppings junto com a quebra da mobilidade urbana.
Sendo assim, ressaltamos a oportunidade de entrada nas companhias IGTI11 e MULT3 em uma possível queda nas taxas de juros, que além de estarem descontadas pelo momento macroeconômico possuem alta qualidade de portfólio concomitante a resiliência operacional.
Fundos imobiliário
Já nos fundos imobiliários, temos algumas diferenças pelo fato da movimentação dos fundos de papéis e tijolos serem diferentes em relação às taxas de juros. Primeiramente, os fundos indexados ao CDI se valorizam em momentos de maiores taxas, pincipalmente os títulos high grade, que em momentos de taxas elevadas apresentam boas oportunidades sem terem os riscos dos fundos high yield. Outro ponto, são os fundos indexados ao IPCA, que se deterioram a medida que as taxas vão se elevando e a inflação arrefecendo.
Nos fundos de tijolo, as relações com a taxa de juros são inversas, impactando de diferentes formas as classes de fundos de tijolo. O foco aqui será para os fundos de tijolos voltados para lajes corporativas que, atualmente, possuem os maiores descontos em relação às demais classes do setor, em comparação ao P/VP e ao custo de reposição. Desde a pandemia, os fundos sofreram uma forte desvalorização com o aumento da vacância e a implementação do trabalho remoto, que já se mostra persistente. Além disso, a desaceleração econômica também impacta na vacância, com empresas reduzindo espaços ou até mesmo entregando empreendimentos inteiros.
Apesar disso, acreditamos que acertar o fundo do poço é impossível e que boas lajes sempre vão ser demandadas (flight-to-quality). Sendo assim, vemos como oportunidade a entrada nesse segmento, que já se encontra bastante subvalorizado, focando em fundos que possuem empreendimentos i) triplo AAA, ii) boa localização geográfica e iii) contratos com empresas maduras e de longo prazo.